domingo 09 2013

A origem da diferença entre os sexos

Por Natália Leite, http://estilo.br.msn.com/tempodemulher
NATÁLIA LEITE: "Cada mulher deve encontrar o seu modelo, sua verdade, sua forma de ser feliz. Não a que a família ou os amigos apontam como a correta, mas a sua maneira autêntica de viver bem".
As diferenças começam ainda na gestação. Do momento em que se descobre o sexo do bebê.
As diferenças começam ainda na gestação. Do momento em que se descobre o sexo do bebê.

Por NATÁLIA LEITE
O assunto na mesa do restaurante era remuneração de executivos. Um dos integrantes da turma acaba de ser promovido e a mulher que vai substituí-lo aceitou o cargo por um salário bem mais baixo. O chefe ofereceu, ela topou e pronto. No nosso grupo, ninguém soube explicar o porquê da diferença de comportamento, mas todos concordaram que, no lugar dela, um homem teria pedido a mesma renumeração do antecessor.
Roberto, o promovido, lembrou que existem pesquisas para comprovar que homens recebem mais aumentos simplesmente porque pedem. Já as mulheres têm vergonha. Das pesquisas, a conversa pulou para natureza feminina versus masculina. E foi aí que discordei dos meus queridos amigos Léo, Roberto e Guilherme.
Eles acreditam que as diferenças de gênero são puramente inatas. Mulheres nascem de um jeito, homens de outro. Eu, por outro lado, acredito que além das importantes variáveis genéticas, há um componente social. Acredito que os modelos repetidos por famílias e sociedades há séculos explica porque a sucessora não exigiu o salário do Roberto.
Acho que as diferenças começam ainda na gestação. Do momento em que se descobre o sexo do bebê, o posicionamento da família se define. Se for um menino começam as brincadeiras com referência à força, tamanho e virilidade. Se for menina, as referências são à beleza, delicadeza e recato.
Com a chegada da criança, os modelos se intensificam. Meninos são criados para encarar o mundo de frente, competir e vencer. Se um colega toma um brinquedo a reação esperado de um garoto é que se posicione, enfrente. Pegue de volta. E isso é bom, afinal, agressividade é um instinto básico, fundamental para sobrevivência em qualquer espécie. Estamos falando aqui de agressividade no sentido de garra, coragem e obviamente não de violência.     
Na hora de aprender a lidar com o corpo, para os meninos tudo é simples, natural. Garoto pode ficar a vontade com o pênis desde pequenininho. Pode tirar para fazer xixi, puxar, brincar, mostrar. As descobertas são encorajadas pelos adultos. Mais tarde, quando vem a sexualidade, eles também recebem incentivos. Essa forma saudável de lidar com o erotismo faz toda diferença para o amadurecimento do indíviduo.
Com as meninas nascidas na mesma sociedade os moldes são bem diferentes. Elas aprendem que mocinhas não brigam. Se outra criança lhe arranca a boneca dos braços, deve-se reprimir o instinto natural de retomar o que é seu. Uma garotinha não deve reagir com agressividade. Se o faz, é feio. Mas se vai chorando pedir socorro é consolada, acariciada e recompensada. Assim, sem que ninguém precise dizer claramente, a menina vai aprendendo a não agir por si, mas a ser dependente.
O mesmo sufocar de instintos se repete na relação com o corpo. Quando a menina começa a descoberta do que tem de mais bonito e natural, a descoberta de si mesma, é imediatamente castrada. Aos dois, três anos de idade, ela já se acostumou a ouvir, “não levanta a saia. Fecha a perna. É feio! É errado. Não pode”. Até um arroto que saia sem querer, do menino, pode ser considerado engraçado. Da menina é constrangedor.
A mulher aprende a reprimir a própria natureza e assim cresce dividida. De um lado, o instintivo. Do outro, o comportamento imposto pela família, escola, amigos. Essa divisão gera um desconforto, um vazio que nem ela sabe de onde vem. A origem do problema está na castração da liberdade, da naturalidade. E o mais importante é perceber que a própria mulher, na figura de mãe, dá início ao ciclo que mais tarde a castiga.
A maior vítima é a própria mulher. Mas a sociedade inteira paga o preço de ter mães, irmãs, funcionárias, namoradas e chefes divididas. Acredito profundamente que a saída está em romper o ciclo de estereótipos. Cada mulher deve encontrar o seu modelo, sua verdade, sua forma de ser feliz. Não a que a família ou os amigos apontam como a correta, mas a sua maneira autêntica de viver bem. Fomos treinadas para atender o outro, por isso é difícil aprender a ouvir o próprio coração, a reconhecer as próprias vontades. Mas tudo é treino. Fica o convite, aceite a responsabilidade de cuidar bem do primeiro projeto que a vida lhe confiou: você mesma.
* Natália Leite é jornalista, mestre em Ciência da Informação pela Universidade de Brasília, curiosa e otimista incurável. Escreve quinzenalmente sobre os erros, acertos e dúvidas que nos fazem mulheres.

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