Em troca de benefícios legais, Léo Pinheiro promete revelar, em delação premiada, o que viu, ouviu e fez nos anos em que compartilhou da intimidade do ex-presidente
Léo e Lula são bons amigos. Mais do que por amizade, eles se uniram por interesses comuns. Léo era operador da empreiteira OAS em Brasília. Lula era presidente do Brasil e operado pela OAS. Na linguagem dos arranjos de poder baseados na troca de favores, operar significa, em bom português, comprar. Agora operador e operado enfrentam circunstâncias amargas. O operador esteve há até pouco tempo preso em uma penitenciária em Curitiba. Em prisão domiciliar, continua enterrado até o pescoço em suspeitas de crimes que podem levá-lo a cumprir pena de dezenas de anos de reclusão. O operado está assustado, mas em liberdade. Em breve, Léo, o operador, vai relatar ao Ministério Público Federal os detalhes de sua simbiótica convivência com Lula, o operado. Agora o ganho de um significará a ruína do outro. Léo quer se valer da lei sancionada pela presidente Dilma Rousseff, a delação premiada, para reduzir drasticamente sua pena em troca de informações sobre a participação de Lula no petrolão, o gigantesco esquema de corrupção armado na Petrobras para financiar o PT e outros partidos da base aliada do governo.
Por meio do mecanismo das delações premiadas de donos e altos executivos de empreiteiras, os procuradores já obtiveram indícios que podem levar à condenação de dois ex-ministros da era lulista, Antonio Palocci e José Dirceu. Delatores premiados relataram operações que põem em dúvida até mesmo a santidade dos recursos doados às campanhas presidenciais de Dilma Rousseff em 2010 e 2014 e à de Lula em 2006. As informações prestadas permitiram a procuradores e delegados desenhar com precisão inédita na história judicial brasileira o funcionamento do esquema de sangria de dinheiro da Petrobras com o objetivo de financiar a manutenção do grupo político petista no poder.
É nessa teia finamente tecida pelos procuradores da Operação Lava-Jato que Léo e Lula se encontram. Amigo e confidente de Lula, o ex-presidente da construtora OAS Léo Pinheiro autorizou seus advogados a negociar com o Ministério Público Federal um acordo de colaboração. As conversas estão em curso e o cardápio sobre a mesa. Com medo de voltar à cadeia, depois de passar seis meses preso em Curitiba, Pinheiro prometeu fornecer provas de que Lula patrocinou o esquema de corrupção na Petrobras, exatamente como afirmara o doleiro Alberto Youssef em depoimento no ano passado. O executivo da OAS se dispôs a explicar como o ex-presidente se beneficiou fartamente da farra do dinheiro público roubado da Petrobras.
Procuradores também acusaram formalmente o presidente da Andrade Gutierrez, Otávio Marques de Azevedo
O Ministério Público Federal apresentou nesta sexta-feira à Justiça a mais importante denúncia da Lava Jato desde o início da operação, em março de 2014, e formalizou a acusação contra o presidente da construtora Norberto Odebrecht, Marcelo Odebrecht, contra o presidente da Andrade Gutierrez, Otávio Marques de Azevedo, e contra outros vinte executivos e ex-funcionários das duas empresas, lobistas e contra investigados como o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque. Entre os crimes apontados estão corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Com a apresentação da denúncia, o próximo passo é o juiz Sergio Moro, responsável pelos processos relacionados ao petrolão em Curitiba (PR), analisar os indícios apresentados pelo Ministério Público e decidir se transforma ou não os investigados em réus. Sem contar as apresentadas nesta sexta, a Lava Jato já conta com 24 denúncias formais contra empreiteiros, doleiros, ex-deputados, lobistas e ex-diretores da Petrobras. Até o final de maio, 117 pessoas haviam sido denunciadas pela força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Outras autoridades, como deputados e senadores, que têm direito a foro privilegiado, são investigadas em Brasília (DF).
Nesta sexta-feira foram denunciadas as seguintes pessoas: Alberto Youssef, Alexandrino Alencar, Antônio Campello Dias, Armando Furlan, Bernardo Freiburghaus, Celso Araripe, Cesar Ramos Rocha, Eduardo Freitas Filho, Elton Negrão, Fernando Baiano, Flávio Machado Filho, Lucélio Goes, Marcio Faria, Mario Goes, Otávio Maques de Azevedo, Paulo Roberto Costa, Paulo Dalmazzo, Paulo Sérgio Boghossian, Pedro Barusco, Renato Duque e Rogério Araújo.
"Essas acusações são o símbolo de que ninguém está acima da lei", disse o procurador da República Deltan Dallagnol.
O Ministério Público conseguiu documentar a prática de 56 atos de corrupção e 136 lavagens de dinheiro para beneficiar a Odebrecht. Foram movimentados 389 milhões de reais em corrupção e 1,063 bilhão de reais com a lavagem. Segundo Deltan Dallagnol, o pedido de ressarcimento aos cofres públicos é de 6,7 bilhões de reais. Só o contrato de fornecimento de nafta pela subsidiária Brasken à Petrobras causou danos de 6 bilhões de reais.
Embora a construtora Odebrecht sempre tenha estado no radar dos investigadores da Lava Jato, indícios mais contundentes contra a construtora ganharam corpo depois do depoimento de delatores como o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e o ex-gerente da estatal Pedro Barusco, que indicaram a empresa como uma das pagadoras de propina a agentes públicos. O cerco contra a maior empreiteira do país se fechou ainda mais depois de os investigadores da Lava Jato terem detectado mensagens cifradas de Marcelo Odebrecht e encontrado seis novas contas correntes ligadas ao grupo abertas em nome das offshores Smith & Nash Engeinnering Company, Arcadex Corporation, Havinsur S/A, Golac Project, Rodira Holdings, Sherkson Internacional e utilizadas para pagar propina a ex-funcionários da Petrobras.
Além dessas contas, referências à Constructora Del Sur e Klienfeld já haviam sido mapeadas nas investigações como mecanismo para distribuir propina no exterior. Aliado a isso, uma análise das mensagens telefônicas de Marcelo Odebrecht aponta que o executivo escreveu textos com referência a "dissidentes PF" junto com o trecho "trabalhar para parar/anular" a investigação. A possibilidade de as palavras indicarem que Odebrecht poderia estar atuando para derrubar a Operação Lava Jato foi considerada "perturbadora" pelo juiz federal Sergio Moro, que conduz os processos relacionados ao escândalo do petrolão na primeira instância. Nesta sexta, com base em novas provas colhidas ao longo da Lava Jato, Moro decretou nova prisão preventiva de Marcelo Odebrecht e de outros quatro executivos ligados à construtora.
"Nos aproximamos da verdade por meio de fatos e provas. As provas que chegaram da Suíça nos mostram o contrario do que dizia a Odebrecht. Não existe espaço na nossa investigação para teorias da conspiração. Temos o sonho de que todos sejam tratados de forma igual perante a lei", disse o procurador.
Os procuradores também descreveram pagamentos de propina na construção do centro administrativo da Petrobras em Vitória (ES). "A Petrobras falhou e pode ter controbuido para que esquema criminoso se perpetuasse por tanto tempo", disse o delegado da Polícia Federal Eduardo Mauat.
Segundo o MPF, a Andrade Gutierrez movimentou 243 milhões de reais em desvios entre 2007 e 2010 - a força-tarefa quer o ressarcimento do dobro desse valor (486 milhões de reais). Os procuradores apontaram a prática de 106 atos de corrupção ativa, 61 de corrupção passiva, 62 lavagens de dinheiro.
O Ministério Público apresentou três esquemas criminosos da Andrade Gutierrez com apoio de Alberto Youssef, Fernando Baiano e Armando Furlan, além de falsas consultorias. Os operadores Mário e Lúcelio Góes também atuaram em esquemas da empresa, por meio da RioMarine. Os recursos eram enviados para contas no exterior como a Maranelle e Phad. "Uma vez no exterior, nas contas dos operadores, o dinheiro era repassado para as contas de Pedro Barusco. Ele também recebeia valores de 300.000 a 400.000 reais em mochilas por meio de Mário Góes.
Os procuradores disseram que sempre tentaram uma aproximação para que as empreiteiras colaborassem com as investigações e realizassem apurações internas para trazer dados e esclarecer fatos. "Isso não aconteceu, só parcilamente com a Câmargo Corrêa. Em relação à Odebrecht, detectamos uma atitude de negação. Não foi feito apuração interna de investigação porque atingiriam altos escalões da empresa. Quanto à estratégia dela, não adianta martelar uma mentira 1.000 vezes, que o Ministério Público, a PF e a Receita vão mostrar que é uma mentira", disse o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima.
Órgão suspeita que subsidiárias da construtora usaram contas no país para pagar propina a ex-executivos da Petrobras
O Ministério Público da Suíça ampliou o leque de investigações sobre a Petrobras para incluir os indícios de pagamento de propina envolvendo a Odebrecht. A informação foi confirmada pelo órgão nesta quarta-feira. "Subsidiárias da Odebrecht são suspeitas de usar contas suíças para fazer pagamentos de propina a ex-executivos da Petrobras, que também mantinham contas bancárias na Suíça", afirmou o gabinete do procurador-geral, em um comunicado.
Desde o ano passado, nove investigações foram abertas no país europeu para mapear todas as transações utilizadas por agentes que atuaram no escândalo do petrolão - ex-dirigentes da Petrobras, operadores do propinoduto e empresários que detinham contratos com a estatal. Os processos de apuração foram instaurados em 2014 depois que o Ofício de Comunicação em Matéria de Lavagem de Dinheiro - o equivalente ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) brasileiro - identificou cerca de sessenta informações sobre transações suspeitas relacionadas à petroleira do Brasil.
As suspeitas são que ex-dirigentes da Petrobras, empreiteiros, operadores do esquema criminoso, intermediários financeiros e empresas brasileiras e estrangeiras atuavam em um esquema de lavagem de dinheiro por meio de 300 contas bancárias em mais de trinta bancos do país europeu. Em março deste ano, o MP suíço informou que bloqueou 400 milhões de dólares (cerca de 1,3 bilhão de reais) em recursos desviados da Petrobras. Desse montante, 120 milhões de dólares já foram devolvidos ao Brasil.
Subsidiárias da construtora Odebrecht também estão sendo investigadas pelo órgão. Suspeita é de que o presidente da empresa esteja no comando das propinas que foram pagas a ex-diretores da Petrobras
Marcelo Odebrecht, presidente da construtora Norberto Odebrecht, está entre os investigados no inquérito do Ministério Público da Suíça, que foi aberto na última quarta-feira contra a empreiteira, para investigar a suspeita de que subsidiárias da construtora usaram contas secretas no país para pagar propina a ex-executivos da Petrobras. A Procuradoria em Berna demorou um ano para abrir o procedimento pela complexidade do crime supostamente organizado com uso de empresas em paraísos fiscais de difícil identificação.
O MP suíço espera contar com a colaboração brasileira para investigar contas que possam ter sido controladas pelo empresário, detido há quase um mês em Curitiba. Em Brasília, os procuradores evitam comentar sobre a cooperação, apontando para o caráter sigiloso exigido por Berna. O pedido é para que haja uma "coleta de evidências documentais" e que suspeitos que estejam no Brasil sejam "interrogados". Um deles é Marcelo Odebrecht.
A suspeita é de que o presidente da empresa está por trás de cada uma das comissões supostamente pagas a ex-diretores da estatal. Os indícios de pagamento de propina verificados pelas autoridades suíças estão relacionados com os relatórios da Polícia Federal baseados em mensagens de celulares apreendidos de Marcelo Odebrecht.
Há várias referências à Suíça. Numa delas, as siglas "PRC/Suíça" foram interpretadas pelos agentes federais como uma referência a Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras que confirmou, em delação premiada, ter recebido dinheiro da Odebrecht. O delator detalhou que o executivo Rogério Santos de Araújo, diretor da Odebrecht Plantas Industriais e Participações, foi quem sugeriu a ele que "abrisse conta no exterior" para receber propinas da empresa no montante de 23 milhões de dólares entre 2008 e 2009.
Em nota, a empreiteira informou que "compreende a abertura do processo na Suíça para obtenção de maiores esclarecimentos, tendo em vista a grande repercussão do tema no Brasil, decorrente do vazamento de informações com interpretações distorcidas e descontextualizadas". A empresa afirma que "tem todo interesse em esclarecer o assunto, e reitera sua intenção de cooperar com as autoridades brasileiras e estrangeiras".
Construtora recebeu também 58 milhões de dólares em aditivos sem justificativa. Negócios da empresa foram monitorados pela diplomacia americana
O superfaturamento de obras em até 48% e a adoção de aditivos em contratos levaram o governo do Equador a expulsar a construtora Odebrecht do país em 2009. As suspeitas de irregularidades foram levantadas por uma comissão do governo e pela Controladoria-Geral do Estado - que tem posição similar ao do Tribunal de Contas da União (TCU) no Brasil - e levaram ao cancelamento dos contratos.
Uma série de telegramas do então embaixador do Brasil em Quito, Antonino Marques Porto, mostra que o governo acompanhava com atenção os problemas da empresa brasileira no Equador, mas ainda sem interferir. Em um deles, Porto revela que uma comissão de investigação liderada pelo então ministro do Litoral, hoje chanceler, Ricardo Patiño concluiu que a segunda fase do projeto de irrigação Carrizal-Chone, no distrito de Manabí, teria sido superfaturada em 48% nas obras civis e em 38% nas tubulações de PVC, e poderia custar 80 milhões de dólares, 22 milhões de dólares a menos do que o custo apresentado pela Odebrecht em licitação.
O governo americano acompanhava o caso e a embaixada em Quito indicou, em telegramas ao Departamento de Estado dos EUA, que a real razão para suspensão dos contratos era suspeita de corrupção, mesmo antes da divulgação dos fatos pelo governo local. O presidente equatoriano, Rafael Correa, mandou cancelar o contrato. Depois de alguma negociação, a empresa decidiu fazer a obra pelos 80 milhões dólares, o que foi aceito pelo governo equatoriano. O contrato não foi adiante quando a Odebrecht foi expulsa do Equador por problemas em outro contrato, o da usina hidrelétrica de San Francisco.
Em outro telegrama, o embaixador informa sobre uma investigação da controladoria que apontava que o contrato da usina teria recebido dez aditivos, sendo que cinco foram considerados injustificáveis. Em um deles, a Odebrecht recebeu 13,8 milhões de dólares em reparação por um problema geológico que paralisou uma perfuradora, mas a empresa teria um seguro que cobriria esse tipo de incidente. Outros dois aditivos feitos ao contrato previam obras de sustentação em um túnel da usina e que não foram feitas na totalidade. A controladoria concluiu que a empreiteira recebeu 58 milhões de dólares sem justificativa.
A empreiteira nega as acusações feitas pela diplomacia dos EUA.
Procuradoria suspeita que empreiteiras brasileiras tenham sido beneficiadas no governo de José Sócrates, o ex-premiê português que foi preso no ano passado, em contratos que somam 3,2 bilhões de reais, segundo jornal português
Portugal tornou-se mais uma fonte de preocupações para as empreiteiras Odebrecht e Andrade Gutierrez, cuja cúpula está presa no Paraná desde a 14ª fase da Operação Lava Jato, da Polícia Federal. Segundo edição desta sexta-feira do jornal Correio da Manhã, o Ministério Público português investiga contratos firmados por duas subsidiárias das empresas brasileiras entre 2005 a 2011, durante o governo do ex-primeiro-ministro José Sócrates, que está preso desde o ano passado sob suspeita de corrupção e fraude fiscal. Os contratos somam 900 milhões de euros - ou 3,2 bilhões de reais.
De acordo com o diário português, o foco do Ministério Público são obras nas barragens do Sabor e do Alqueva, rodovias na Grande Lisboa, Baixo Tejo e Douro Litoral e escolas. A suspeita é de que a Odebrecht e a Andrade Gutierrez tenham sido beneficiadas no governo de Sócrates. Conforme o Correio da Manhã, Odebrecht e Andrade Gutierrez atuam no país desde a aquisição, respectivamente, da Bento Pedroso Construções e da Zagope, e obtiveram diversos contratos com o governo para construção de barragens e rodovias e modernização de escolas.
Colaboração - A Bento Pedroso e a Zagope entraram na mira do MP português durante as investigações do caso Monte Branco, maior escândalo de lavagem de dinheiro do país, que apura a movimentação de fortunas por intermédio de offshores, contas na Suíça e em Portugal. Foi no âmbito deste caso que surgiram pistas que levaram à prisão do ex-premiê português, no âmbito da Operação Marquês, e possíveis pontos de contato com a Lava Jato. Nesta terça-feira, a Procuradoria-Geral da República de Portugal confirmou que colabora com a força-tarefa da Lava Jato. O pedido de ajuda internacional partiu das autoridades brasileiras.
EUA - Os negócios da empreiteira brasileira Odebrecht no exterior já haviam chamado a atenção da diplomacia americana, que apontou para suspeitas de corrupção em obras espalhadas pelo mundo na segunda gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2007-2010). Telegramas confidenciais do Departamento de Estado americano revelados pelo grupo WikiLeaks relatam ações da empresa brasileira e suas relações com governantes estrangeiros. Lula é citado em iniciativas para defender os interesses da Odebrecht no exterior.