Após entregar pedidos de investigação, procurador-geral da República envia carta a integrantes do Ministério Público e diz 'não esperar a unanimidade'
Por: Laryssa Borges, de Brasília - Atualizado em
Responsável pelos pedidos de abertura de investigação contra 54 pessoas suspeitas de terem participado do escândalo do petrolão, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse em carta encaminhada a integrantes do Ministério Público que a Operação Lava Jato chega a um "momento crucial" com o encaminhamento dos inquéritos ao Supremo Tribunal Federal (STF). No texto, classificado por Janot como "uma palavra de confiança", ele afirmou estar pronto para que seus pedidos de investigação sejam submetidos a "testes de coerência" e descreveu o caso como "um dos seus maiores desafios institucionais" do Ministério Público.
"Não espero a unanimidade nem a terei. Desejo e confio, sim, nesse momento singular do país e, particularmente, do Ministério Público brasileiro, que cada um dos meus colegas tenha a certeza de que realizei meu trabalho em direção aos fatos investigados, independentemente dos envolvidos, dos seus matizes partidários ou dos cargos públicos que ocupam ou ocuparam", afirmou Janot.
Nos bastidores, parlamentares que não integram a temida lista de Janot já se preparam para defender o procurador-geral dos inevitáveis ataques de deputados e senadores que serão alvo de investigação. Senadores afirmam ser preciso defender Janot depois que forem revelados os nomes das autoridades a serem investigadas e recordaram ao próprio chefe do MP que seus antecessores Antonio Fernando de Souza, que apresentou a denúncia do mensalão, e Roberto Gurgel, que chefiava o MP na condenação dos mensaleiros, também foram alvo de uma série de críticas e de tentativas de desqualificação no Congresso. Publicamente, porém, Rodrigo Janot tem adotado um discurso institucional e disse na carta aos colegas, por exemplo, que não acredita que "esses dias de turbulência política fomentarão investidas que busquem diminuir o Ministério Público brasileiro, desnaturar o seu trabalho ou desqualificar os seus membros".
Embora o Ministério Público tenha colhido contra cada parlamentar diferentes níveis de provas, em alguns casos evidências cabais de recebimento de propina, o procurador-geral decidiu enviar ao STF apenas pedidos de inquéritos - e não denúncias diretamente - para poder abastecer posteriormente com mais indícios as futuras acusações contra cada congressista. Denúncias diretas contra parlamentares envolvidos no petrolão necessitam de provas mais fortes para serem apresentadas à Corte. A avaliação da força-tarefa do MP, porém, é que não se pode correr qualquer risco com a apresentação imediata de denúncias ainda não suficientemente embasadas.
"Diante das inúmeras e naturais variáveis decorrentes de uma investigação de tamanha complexidade, fiz uma opção clara e firme pela técnica jurídica", explicou Janot na carta do MP. "Afastei, desde logo, qualquer outro caminho, ainda que parecesse fácil ou sedutor", completou.
A expectativa é que o ministro Teori Zavascki, relator dos processos do petrolão no Supremo, derrube o sigilo dos processos contra os parlamentares nesta sexta-feira. Também na sexta o magistrado deve formalizar os sete pedidos de arquivamento feitos pelo procurador-geral e ainda determinar a realização de diligências para a produção de provas complementares que possam embasar eventuais denúncias contra os congressistas.
Por que lembrar? Porque prefiro que os leitores deste blog tenham memória. Tenho compromisso com o que escrevi ontem. Para mim, é impossível afirmar hoje o contrário do que afirmei antes, sem oferecer, quando menos, uma explicação ao internauta. Agora, vamos ao texto a que se refere o título. *Pronto! Rodrigo Janot, como sabem, recomendou ao Supremo Tribuna Federal que não abra inquérito para investigar o senador Aécio Neves (MG), presidente do PSDB. E fez o mesmo com a presidente Dilma Rousseff (PT). Inventou-se uma narrativa em que, na história do petrolão, Aécio e Dilma são iguais: nada têm a ver com o peixe. Mas, por favor, não confundam Rodrigo Janot com um engavetador-geral. Eu preferiria, para ser justo, o epíteto de Absolvedor-Específico. Ou, quem sabe, de pizzaiolo-geral da República.
É bem verdade que, a qualquer momento, Janot pode encontrar motivos para, ao menos, pedir que se investigue a conduta da presidente da República. Mas vamos ser francos, não é, leitor? Nem eu nem você acreditamos que isso vá acontecer. Afinal, como você já leu neste blog, Janot é aquele que deu graças a Deus por “ter passado a régua e não ter encontrado nada contra Dilma e Lula”.
De resto, a delação premiada de Ricardo Pessoa, ex-amigo de Lula e dono da construtora baiana UTC, não saiu. Parece que ele não aceitou aderir à narrativa criada para fazer a sua delação. Não gostou do roteirista. Assim, não lhe foi dada, até agora ao menos, a vantagem. E tudo indica que não saberemos detalhes de suas doações paralelas ao PT, especialmente à campanha de Dilma, conforme revelou a revista VEJA.
Nestes tempos em que houve um barateamento da figura do herói, também devo lembrar aqui o nome do Grande Ausente de Curitiba: Luiz Inácio Lula da Silva. Nem mesmo um convite para depoimento, nada! Mais uma vez, um escândalo de dimensões pantagruélicas é revelado — e, não duvidemos, parcialmente revelado — sem que o chefe inconteste do partido seja ao menos convidado para prestar esclarecimentos.
Devemos nos contentar com a fantasia de que os empreiteiros, todos corruptos ativos, meteram o pé na porta da Petrobras, ameaçando os diretores nomeados pelo PT: “Exigimos que vocês recebam a propina que nosso cartel quer lhes pagar”. Os corruptos passivos, então, distribuíram depois parte da dinheirama suja para alguns políticos e pronto. Não havia eixo, hierarquia, relações de subordinação, nada!
Espantosamente, nem José Sérgio Gabrielli, que presidiu a Petrobras no período em que a empresa foi à lona, mereceu papel de destaque. No roteiro que se escreve em Curitiba, ele não disputaria o Oscar nem de ator coadjuvante. Quando muito, seria um daqueles figurantes que ficam ao fundo, fora de foco.
Sim, eu senti antes o cheiro sofisticado que vinha do forno de doutor Janot. E também expressei meu descontentamento com o roteiro que se escrevia em Curitiba. Num canto, livrou-se a cara de Dilma; no outro, a de Lula.
O doleiro Alberto Youssef afirma em depoimento à Polícia Federal que o ex e a atual presidente da República não só conheciam como também usavam o esquema de corrupção na Petrobras
Por: Robson Bonin - Atualizado em
A Carta ao Leitor desta edição termina com uma observação altamente relevante a respeito do dever jornalístico de publicar a reportagem a seguir às vésperas da votação em segundo turno das eleições presidenciais: "Basta imaginar a temeridade que seria não publicá-la para avaliar a gravidade e a necessidade do cumprimento desse dever". VEJA não publica reportagens com a intenção de diminuir ou aumentar as chances de vitória desse ou daquele candidato. VEJA publica fatos com o objetivo de aumentar o grau de informação de seus leitores sobre eventos relevantes, que, como se sabe, não escolhem o momento para acontecer. Os episódios narrados nesta reportagem foram relatados por seu autor, o doleiro Alberto Youssef, e anexados a seu processo de delação premiada. Cedo ou tarde os depoimentos de Youssef virão a público em seu trajeto na Justiça rumo ao Supremo Tribunal Federal (STF), foro adequado para o julgamento de parlamentares e autoridades citados por ele e contra os quais garantiu às autoridades ter provas. Só então se poderá ter certeza jurídica de que as pessoas acusadas são ou não culpadas.
Na última terça-feira, o doleiro Alberto Youssef entrou na sala de interrogatórios da Polícia Federal em Curitiba para prestar mais um depoimento em seu processo de delação premiada. Como faz desde o dia 29 de setembro, sentou-se ao lado de seu advogado, colocou os braços sobre a mesa, olhou para a câmera posicionada à sua frente e se pôs à disposição das autoridades para contar tudo o que fez, viu e ouviu enquanto comandou um esquema de lavagem de dinheiro suspeito de movimentar 10 bilhões de reais. A temporada na cadeia produziu mudanças profundas em Youssef. Encarcerado desde março, o doleiro está bem mais magro, tem o rosto pálido, a cabeça raspada e não cultiva mais a barba. O estado de espírito também é outro. Antes afeito às sombras e ao silêncio, Youssef mostra desassombro para denunciar, apontar e distribuir responsabilidades na camarilha que assaltou durante quase uma década os cofres da Petrobras. Com a autoridade de quem atuava como o banco clandestino do esquema, ele adicionou novos personagens à trama criminosa, que agora atinge o topo da República.
Comparsa de Youssef na pilhagem da maior empresa brasileira, o ex-diretor Paulo Roberto Costa já declarara aos policiais e procuradores que nos governos do PT a estatal foi usada para financiar as campanhas do partido e comprar a fidelidade de legendas aliadas. Parte da lista de corrompidos já veio a público. Faltava clarear o lado dos corruptores. Na terça-feira, Youssef apresentou o ponto até agora mais "estarrecedor" - para usar uma expressão cara à presidente Dilma Rousseff - de sua delação premiada. Perguntado sobre o nível de comprometimento de autoridades no esquema de corrupção na Petrobras, o doleiro foi taxativo:
- O Planalto sabia de tudo!
- Mas quem no Planalto? - perguntou o delegado.
- Lula e Dilma - respondeu o doleiro.
Para conseguir os benefícios de um acordo de delação premiada, o criminoso atrai para si o ônus da prova. É de seu interesse, portanto, que não falsifique os fatos. Essa é a regra que Youssef aceitou. O doleiro não apresentou - e nem lhe foram pedidas - provas do que disse. Por enquanto, nesta fase do processo, o que mais interessa aos delegados é ter certeza de que o depoente atuou diretamente ou pelo menos presenciou ilegalidades. Ou seja, querem estar certos de que não lidam com um fabulador ou alguém interessado apenas em ganhar tempo fornecendo pistas falsas e fazendo acusações ao léu. Youssef está se saindo bem e, a exemplo do que se passou com Paulo Roberto Costa, o ex-diretor da Petrobras, tudo indica que seu processo de delação premiada será homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Na semana passada, ele aumentou de cerca de trinta para cinquenta o número de políticos e autoridades que se valiam da corrupção na Petrobras para financiar suas campanhas eleitorais. Aos investigadores, Youssef detalhou seu papel de caixa do esquema, sua rotina de visitas aos gabinetes poderosos no Executivo e no Legislativo para tratar, em bom português, das operações de lavagem de dinheiro sujo obtido em transações tenebrosas na estatal. Cabia a ele expatriar e trazer de volta o dinheiro quando os envolvidos precisassem.
Uma vez feito o acordo, Youssef terá de entregar o que prometeu na fase atual da investigação. Ele já contou que pagava em nome do PT mesadas de 100 000 a 150 000 reais a parlamentares aliados ao partido no Congresso. Citou nominalmente a ex-ministra da Casa Civil Gleisi Hoffmann, a quem ele teria repassado 1 milhão de reais em 2010. Youssef disse que o dinheiro foi entregue em um shopping de Curitiba. A senadora negou ter sido beneficiada.
Entre as muitas outras histórias consideradas convincentes pelos investigadores e que ajudam a determinar a alta posição do doleiro no esquema - e, consequentemente, sua relevância para a investigação -, estão lembranças de discussões telefônicas entre Lula e o ex-deputado José Janene, à época líder do PP, sobre a nomeação de operadores do partido para cargos estratégicos do governo. Youssef relatou um episódio ocorrido, segundo ele, no fim do governo Lula. De acordo com o doleiro, ele foi convocado pelo então presidente da Petrobras, Sergio Gabrielli, para acalmar uma empresa de publicidade que ameaçava explodir o esquema de corrupção na estatal. A empresa queixava-se de que, depois de pagar de forma antecipada a propina aos políticos, tivera seu contrato rescindido. Homem da confiança de Lula, Gabrielli, segundo o doleiro, determinou a Youssef que captasse 1 milhão de reais entre as empreiteiras que participavam do petrolão a fim de comprar o silêncio da empresa de publicidade. E assim foi feito.
Gabrielli poderia ter realizado toda essa manobra sem que Lula soubesse? O fato de ter ocorrido no governo Dilma é uma prova de que ela estava conivente com as lambanças da turma da estatal? Obviamente, não se pode condenar Lula e Dilma com base apenas nessa narrativa. Não é disso que se trata. Youssef simplesmente convenceu os investigadores de que tem condições de obter provas do que afirmou a respeito de a operação não poder ter existido sem o conhecimento de Lula e Dilma - seja pelos valores envolvidos, seja pelo contato constante de Paulo Roberto Costa com ambos, seja pelas operações de câmbio que fazia em favor de aliados do PT e de tesoureiros do partido, seja, principalmente, pelo fato de que altos cargos da Petrobras envolvidos no esquema mudavam de dono a partir de ordens do Planalto.
Os policiais estão impressionados com a fartura de detalhes narrados por Youssef com base, por enquanto, em sua memória. "O Vaccari está enterrado", comentou um dos interrogadores, referindo-se ao que o doleiro já narrou sobre sua parceria com o tesoureiro nacional do PT, João Vaccari Neto. O doleiro se comprometeu a mostrar documentos que comprovam pelo menos dois pagamentos a Vaccari. O dinheiro, desviado dos cofres da Petrobras, teria sido repassado a partir de transações simuladas entre clientes do banco clandestino de Youssef e uma empresa de fachada criada por Vaccari. O doleiro preso disse que as provas desses e de outros pagamentos estão guardadas em um arquivo com mais de 10 000 notas fiscais que serão apresentadas por ele como evidências. Nesse tesouro do crime organizado, segundo Youssef, está a prova de uma das revelações mais extraordinárias prometidas por ele, sobre a qual já falou aos investigadores: o número das contas secretas do PT que ele operava em nome do partido em paraísos fiscais. Youssef se comprometeu a ajudar a PF a localizar as datas e os valores das operações que teria feito por instrução da cúpula do PT.
Depois da homologação da delação premiada, que parece assegurada pelo que ele disse até a semana passada, Youssef terá de apresentar à Justiça mais do que versões de episódios públicos envolvendo a presidente. Pela posição-chave de Youssef no esquema, os investigadores estão confiantes em que ele produzirá as provas necessárias para a investigação prosseguir. Na semana que vem, Alberto Youssef terá a oportunidade de relatar um episódio ocorrido em março deste ano, poucos dias antes de ser preso. Youssef dirá que um integrante da coordenação da campanha presidencial do PT que ele conhecia pelo nome de "Felipe" lhe telefonou para marcar um encontro pessoal e adiantou o assunto: repatriar 20 milhões de reais que seriam usados na campanha presidencial de Dilma Rousseff. Depois de verificar a origem do telefonema, Youssef marcou o encontro que nunca se concretizou por ele ter se tornado hóspede da Polícia Federal em Curitiba. Procurados, os defensores do doleiro não quiseram comentar as revelações de Youssef, justificando que o processo corre em segredo de Justiça. Pelo que já contou e pelo que promete ainda entregar aos investigadores, Youssef está materializando sua ameaça velada feita dias atrás de que iria "chocar o país".
DINHEIRO PARA O PT
Lula Marques/Folhapress/VEJA
Alberto Youssef também voltou a detalhar os negócios que mantinha com o tesoureiro nacional do PT, João Vaccari Neto, homem forte da campanha de Dilma e conselheiro da Itaipu Binacional. Além de tratar dos interesses partidários com o dirigente petista, o doleiro confi rmou aos investigadores ter feito pelo menos duas grandes transferências de recursos a Vaccari. O dinheiro, de acordo com o relato, foi repassado a partir de uma simulação de negócios entre grandes companhias e uma empresa-fantasma registrada em nome de laranjas mas criada pelo próprio Vaccari para ocultar as operações. Ele nega
ENTREGA NO SHOPPING
Sérgio Lima/Folhapress/VEJA
Alberto Youssef confirmou aos investigadores o que disse o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa sobre o dinheiro desviado da estatal para a campanha da exministra da Casa Civil Gleisi Hoffmann (PT-PR) ao Senado, em 2010. Segundo ele, o repasse dos recursos para a senadora petista, no valor de 1 milhão de reais, foi executado em quatro parcelas. As entregas de dinheiro foram feitas em um shopping center no centro de Curitiba. Intermediários enviados por ambos entregaram e receberam os pacotes. Em nota, a senadora disse que não recebeu nenhuma doação de campanha nem conhece Paulo Roberto Costa ou Alberto Youssef
ELE TAMBÉM SABIA
Sérgio Lima/Folhapress/VEJA
Durante o segundo mandato de Lula, o doleiro contou que foi chamado pelo presidente da Petrobras, José sergio Gabrielli, para tratar de um assunto que preocupava o Planalto. Uma das empresas com contratos de publicidade na estatal ameaçava revelar o esquema de cobrança de pedágio. Motivo: depois de pagar propina antecipadamente, a empresa teve seu contrato rescindido. Ameaçado pelo proprietário, Gabrielli pediu ao doleiro que captasse 1 milhão de reais com as empreiteiras do esquema e devolvesse a quantia à empresa de publicidade. Gabrielli não quis se pronunciar
CONTAS SECRETAS NO EXTERIOR
VEJA
Desde que Duda Mendonça, o marqueteiro da campanha de Lula em 2002, admitiu na CPI dos Correios ter recebido pagamentos de campanha no exterior (10 milhões de dólares), pairam sobre o partido suspeitas concretas da existência de dinheiro escondido em paraísos fi scais. Para os interrogadores de Alberto Youssef, no entanto, essas dúvidas estão começando a se transformar em certeza. O doleiro não apenas confi rmou a existência das contas do PT no exterior como se diz capaz de ajudar a identifi cá-las, fornecendo detalhes de operações realizadas, o número e a localização de algumas delas.
UM PERSONAGEM AINDA OCULTO
VEJA
O doleiro narrou a um interlocutor que seu esquema criminoso por pouco não atuou na campanha presidencial deste ano. Nos primeiros dias de março, Youssef recebeu a ligação de um homem, identifi cado por ele apenas como "Felipe", integrante da cúpula de campanha do PT. Ele queria os serviços de Youssef para repatriar 20 milhões de reais que seriam usados no caixa eleitoral. Youssef disse que chegou a marcar uma segunda conversa para tratar da operação, mas o negócio não foi adiante porque ele foi preso dias depois. Esse trecho ainda não foi formalizado às autoridades.
Crédito: Broglio/AP/VEJA
ATÉ A MÁFIA FALOU - Tommaso Buscetta, o primeiro mafi oso a fazer delação premiada. Na Sicília, seu sobrenome virou xingamento
Quem delata pode mentir?
Alexandre Hisayasu
A delação premiada tem uma regra de ouro: quem a pleiteia não pode mentir. Se, em qualquer momento, fi car provado que o delator não contou a verdade, os benefícios que recebeu como parte do acordo, como a liberdade provisória, são imediatamente suspensos e ele fica sujeito a ter sua pena de prisão aumentada em até quatro anos.
Para ter validade, a delação premiada precisa ser combinada com o Ministério Público e homologada pela Justiça. O doleiro Alberto Youssef assinou o acordo com o MP no fi m de setembro. Desde então, vem dando depoimentos diários aos procuradores que investigam o caso Petrobras. Se suas informações forem consideradas relevantes e consistentes, a Justiça - nesse caso, o Supremo Tribunal Federal, já que o doleiro mencionou políticos - homologará o acordo e Youssef será posto em liberdade, como já ocorreu com outro delator envolvido no mesmo caso, Paulo Roberto Costa. O ex-diretor da Petrobras deu detalhes ao Ministério Público e à Polícia Federal sobre o funcionamento do esquema milionário de pagamento de propinas que funcionava na estatal e benefi ciava políticos de partidos da base aliada do governo. Ele já deixou a cadeia e aguarda o julgamento em liberdade. O doleiro continua preso.
Até o ano passado, a lei brasileira previa que o delator só poderia usufruir os benefícios do acordo de delação ao fi m do processo com o qual havia colaborado - e se o juiz assim decidisse. Ou seja, apenas depois que aqueles que ele tivesse incriminado fossem julgados é que a Justiça resolveria se o delator mereceria ganhar a liberdade. Desde agosto de 2013, no entanto, esses benefícios passaram a valer imediatamente depois da homologação do acordo. "Foi uma forma de estimular a prática. Você deixa de punir o peixe pequeno para pegar o grande", diz o promotor Arthur Lemos Júnior, que participou da elaboração da nova lei.
Mais famoso - e prolífero - delator da história recente, o mafi oso Tommaso Buscetta levou à cadeia cerca de 300 comparsas. Preso no Brasil em 1983, fechou acordo com a Justiça italiana e foi peça-chave na Operação Mãos Limpas, responsável pelo desmonte da máfi a siciliana. Depois disso, conseguiu proteção para ele e a família e viveu livre nos Estados Unidos até sua morte, em 2000.
Segundo a 'Folha de S. Paulo', o procurador-geral da República recomendou ao Supremo Tribunal Federal que não abra apuração sobre as citações à presidente no petrolão
O procurador-geral da República Rodrigo Janot recomendou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que não abra investigações sobre um possível envolvimento da presidente Dilma Rousseff no petrolão, informa a edição desta quinta-feira do jornal Folha de S. Paulo. A presidente foi citada no depoimento do delator Alberto Youssef à Polícia Federal. Segundo a Folha, o nome de Dilma estaria entre os pedidos de arquivamento feitos por Janot. Na decisão, o procurador-geral teria levado em conta o artigo da Constituição que define que um presidente, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos que não sejam relacionados ao exercício de suas funções.
O procurador-geral também pediu o arquivamento da investigação contra o senador Aécio Neves(PSDB-MG). Na avaliação de Janot, o tucano foi citado de forma genérica e sem a apresentação de indícios mínimos. Segundo a Folha, o procurador-geral sugeriu ainda o arquivamento do caso contra o ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). As solicitações de Janot serão analisadas pelo ministro Teori Zavascki, relator do processo da Lava Jato no Supremo.
Conforme revelou VEJA em outubro, Dilma e seu antecessor Lula foram citados pelo doleiro Alberto Youssef em seu processo de delação premiada. Perguntado pelos investigadores da Lava Jato sobre o nível de comprometimento de autoridades no esquema de corrupção, o doleiro foi taxativo: "O Planalto sabia de tudo!". "Mas quem no Planalto?", perguntou o delegado. "Lula e Dilma", respondeu Youssef.
Lista - Na noite de terça, Janot encaminhou ao Supremo 28 pedidos de investigação contra 54 pessoas, incluindo parlamentares suspeitos de terem recebido propina no escândalo do petrolão e autoridades sem direito a foro privilegiado. Houve sete pedidos de arquivamento. Os nomes dos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), estão entre as autoridades alvos de pedidos de abertura inquérito pelo chefe do Ministério Público.
Apesar dos pedidos, a identidade da maior parte dos deputados e senadores apontados como beneficiários do petrolão ainda é mantida em sigilo. O relator do caso no STF, ministro Teori Zavascki, pretende nos próximos dias dar ampla publicidade aos nomes das autoridades investigadas, determinando que fiquem em segredo apenas situações que possam atrapalhar o andamento das apurações - como quebras de sigilo, grampos telefônicos e buscas e apreensões.