sexta-feira 01 2013

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A pele através da história


Evolução

O ser humano é o único primata que possui uma quantidade tão pequena de pelos e tantos tons diferentes de pele. Entender como essa característica evoluiu pode ter implicações diretas na saúde da espécie hoje em dia

Guilherme Rosa
pele
A pele humana evoluiu de modo independente em diferentes partes do mundo. Hoje, quando grande parte das humanidade não se encontra mais nas regiões onde seus ancestrais se desenvolveram, isso pode gerar uma série de problemas de saúde (Thinkstock)
A pele humana é uma evidência direta da evolução. A pequena quantidade de pelos e os múltiplos tons de pele foram características cuidadosamente selecionadas durante milhões de anos e representam mais do que traços cosméticos — eles são responsáveis pela sobrevivência da espécie. Hoje em dia, no entanto, essas mesmas adaptações podem conflitar com o estilo de vida moderno. “Toda essa variedade de tons de pele dentro de uma mesma espécie é incrível. Entender como isso se desenvolveu desde nossos antepassados pode ter profundas consequências para a nossa saúde hoje em dia”, diz Nina Jablonski, antropóloga da Universidade Estadual da Pensilvânia e autora do livro Living Color: The Biological and Social Meaning of Skin Color (Cores Vivas: Os Significados Biológicos e Sociais da Cor de Pele, inédito em português). No dia 16, ela participou do Encontro Anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência, em Boston, EUA, onde conversou com o site de VEJA.
Segundo as evidências mais recentes, o corpo dos antepassados humanos era repletos de pelos, como macacos. Eram caçadores-coletores que viviam nas zonas tropicais da África, onde os alimentos e a água eram abundantes, e o clima era ameno. Nestas condições, os pelos ajudavam a reter o calor corporal.
Há cerca de 2 milhões de anos, no entanto, a Terra foi atingida por uma série de mudanças climáticas, e as florestas locais não passaram incólumes. Os hominídeos da época começaram, então, a se locomover cada vez mais para conseguir suprimentos. Ao mesmo tempo, eles passaram a desenvolver um cérebro cada vez maior, o que seria essencial para o surgimento do Homo sapiens. O órgão, no entanto, era extremamente sensível a grandes temperaturas. A maior mobilidade e a sensibilidade ao calor se tornaram uma combinação perigosa. Assim, hominídeos com menor quantidade de pelos se tornaram mais aptos a sobreviver e a passar seus genes adiante — era a seleção natural em ação. “Começamos a perder nossos pelos para liberar melhor o calor do corpo”, diz Jablonski. Hoje, os humanos são os únicos primatas — e dos raros mamíferos — com poucos pelos no corpo.
No entanto, ao perderem os pelos, os hominídeos se tornaram extremamente vulneráveis ao sol da África tropical: sua pele era muito clara — como a dos chimpanzés. Ao absorver as grandes quantidades de raios ultravioleta que incidiam no local, eles podiam sofrer sérias queimaduras, desenvolver diversos tipos de câncer, além de perder vários nutrientes da pele. Um deles — o folato — é essencial para o desenvolvimento correto dos embriões e importante para o sucesso reprodutivo humano. Assim, a pele desses ancestrais foi ficando cada vez mais rica em melanina, um pigmento responsável por escurecer a pele e protegê-la dos raios ultravioleta. “Não há nenhuma relação genética entre a perda de pelo e a mudança da cor da pele. Eles apenas aconteceram em um período histórico próximo: um veio mitigar os efeitos do outro”, diz Nina Jablonski.
Explorando o planeta — Esses ancestrais humanos continuaram seu percurso natural de evolução, com cérebros cada vez maiores e postura cada vez mais ereta. Há 200.000 anos, sua anatomia tornou-se semelhante à do homem moderno, dando origem ao Homo sapiens. Mesmo após surgir como espécie, os seres humanos continuaram na África por mais de metade de sua história na Terra, carregando a pigmentação de pele perfeita para a incidência solar na região. No entanto, há 80.000 anos, os primeiros humanos começaram a deixar o continente rumo à Europa e à Ásia. Em sucessivas ondas de migração, passaram a encontrar novos ambientes, com latitudes e altitudes maiores — e menor incidência de raios ultravioleta.
O problema é que essa mesma radiação, que pode ser perigosa quando absorvida em excesso, também é essencial para a síntese de vitamina D no sangue humano. A falta dessa vitamina diminui a absorção de cálcio e deprime o sistema imunológico. Sua ausência crônica pode levar a problemas no parto, deformidades e até morte. Mais uma vez, a seleção natural começava a favorecer uma mudança na cor da pele: pessoas com menos pigmentação conseguiam produzir mais vitamina a partir do parco sol local, tornando-se mais aptas a sobreviver.
Segundo Nina Jablonski, a pele mais clara se desenvolveu três vezes de maneira isolada entre os ancestrais humanos. “Uma dessas vezes foi entre os Neandertais europeus, que, segundo estudos genéticos, tinham peles claras e cabelos ruivos. As outras duas foram entre os Homo sapiens europeus e os asiáticos”, diz. Há mais de uma década, a antropóloga publicou o primeiro estudo que mostrava as relações entre a incidência de raios ultravioleta no mundo e a distribuição das populações com diferentes tons de pele.
Devendra M SINGH/AFP
Nina Jablonski
A história na pele: a antropóloga Nina Jablonski mostrou que a cor da pele é uma adaptação evolutiva. Hoje, ela pesquisa como essa mesma pele afeta a absorção de radiação ultravioleta e a produção de vitamina D nas diversas populações
Cultura na pele — Durante dezenas de milênios, as diversas populações, com seus diversos tons de pele, continuaram a se desenvolver de maneira isolada ao redor do mundo. Quando esses povos voltaram a se encontrar, foi natural que a cor de pele alheia chamasse atenção. Segundo Jablonski, isso acontece porque os humanos são animais visuais. Mas, ela destaca, isso não quer dizer que eles estão geneticamente programados para o preconceito. Não existe nenhuma evidência de que os primeiros encontros entre populações de tons de pele diferente tenham sido afetados por essa predisposição. As relações entre Egito e Grécia antiga, por exemplo, podiam até ser violentas, mas a cor da pele não era vista como sinal de valor humano.
Foi somente com as grandes navegações que essa questão se tornou importante. Com o contato cada vez maior entre os povos, a cor da pele começou a ganhar enorme valor cultural. Biologicamente, a pigmentação é apenas o resultado da necessidade corporal de se adaptar ao ambiente. No entanto, nesse tempo ela passou a ser  entendida como sinal de hierarquia - inferioridade ou superioridade - entre as populações. Assim, mesmo sem ter nenhuma base científica, o argumento justificava a dominação econômica de populações inteiras, como a escravização das tribos africanas trazidas ao Brasil. 
Herança genética — Hoje, a viagens pelo mundo se dão de forma muito mais rápida e em quantidades muito maiores do que na época das grandes navegações. As populações urbanas se tornaram ainda mais variadas, com habitantes de todos os cantos do planeta. Essa convivência entre os diferentes povos ajudou a diminuir os preconceitos. No entanto, os tons de pele da população deixaram de estar associados à região do planeta onde habitavam, e isso começou a afetar a saúde. “Alteramos o equilíbrio que houve durante a evolução humana. Grande parte da população mundial vive longe de onde seus ancestrais viveram, com consequências previsíveis para sua saúde”, diz Nina Jablonski.
Os problemas podem ser sentidos tanto pelas populações de pele clara habitando regiões equatoriais, quanto por populações de pele mais escura em regiões de alta latitude. Além disso, quase 60% da humanidade vive em cidades, onde a exposição à luz do sol é mínima. “Durante 200.000 anos, nós passamos grande parte de nossos dias nos ambientes externos. A partir do último século, no entanto, começamos a gastar a maior parte do nosso tempo dentro das construções”, diz Nina, que conduz uma série de estudos para medir a quantidade de sol absorvida por diferentes populações ao redor do mundo e as consequências disso para sua saúde.
Os resultados iniciais de sua pesquisa são preocupantes. “Constatamos que a falta de radiação ultravioleta está levando a sérias deficiências na quantidade de vitamina D”, diz. Segundo a antropóloga, os cuidados necessários para se proteger do excesso de radiação ultravioleta já estão bem divulgados — usar protetor solar, evitar as horas de sol mais intenso —, mas o mesmo não é verdade para os efeitos deletérios da falta de vitamina D.
A pesquisadora diz que a ausência dessa vitamina pode ser parcialmente responsável por grande parte dos problemas de saúde que atingem minorias populacionais nos Estados Unidos e em outras partes do mundo, como problemas cardiovasculares, diabetes e câncer. “Ao diminuir as funções do sistema imunológico, isso pode tornar essas populações mais suscetíveis a gripes e resfriados, além de infecções mais sérias”, diz. Também existem evidências de que a deficiência crônica de vitamina D está levando a um aumento nos casos de depressão sazonais.
A solução para esses problemas é simples. Pessoas com pele mais escura vivendo em zonas temperadas, por exemplo, podem simplesmente decidir tomar mais sol, ou podem escolher repor a quantidade diária que lhe falta com suplementos de vitamina D. Para isso, no entanto, elas precisam conhecer as necessidades específicas de sua pele. É impossível voltar atrás da sociedade globalizada. Não existe como — e nem seria desejável — as diversas populações do mundo voltarem para seus locais de origem. Segundo Nina Jablonski, o melhor modo de superar o descompasso entre tom de pele e radiação solar é a partir do conhecimento sobre sua herança genética. Ao saber de onde veio sua pele, como ela adquiriu sua cor atual, é possível protegê-la dos efeitos da vida moderna.

"Uma rede de cérebros seria capaz de realizar tarefas que um computador normal não faria"


Entrevista

Em entrevista ao site de VEJA, o neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis fala sobre as possibilidades criadas pela pesquisa na qual sua equipe conseguiu conectar remotamente os neurônios de dois ratos

Guilherme Rosa
Miguel Nicolelis, Neurocientista
Miguel Nicolelis diz que a interface cérebro-cérebro criada em seu laboratório gera uma série de possibilidades que deverão ser exploradas nos próximos anos (Manoel Marques)
Nesta quinta-feira, o neurocientista Miguel Nicolelis lançou sua mais nova pesquisa na revistaScientific Reports. Desta vez, o brasileiro demonstrou a possibilidade de transmitir informações entre os cérebros de dois ratos. Após ter instalado eletrodos na cabeça dos animais, a equipe liderada pelo pesquisador conseguiu transmitir os sinais elétricos gerados pelos neurônios de um dos cérebros para o outro, fazendo os ratos agirem em colaboração — mesmo quando separados por um continente.

Essa pesquisa foi realizada ao mesmo tempo, e publicada duas semanas depois de outra que estudava a capacidade de ratos sentirem a luz infravermelha. Por meio de sensores infravermelhos instalados na cabeça do animal e eletrodos ligados ao seu córtex tátil, os pesquisadores conseguiram criar um novo sentido. Segundo Miguel Nicolelis, as duas pesquisas tinham como objetivo medir os limites da plasticidade cerebral, a capacidade de o cérebro se adaptar a novos estímulos e interpretar sinais que nunca havia recebido antes. Ambas obtiveram sucesso em sua empreitada. Em entrevista ao site de VEJA, Nicolelis falou um pouco mais sobre o estudo e suas consequências, como a criação de uma rede mundial de cérebros — a brainet.

Até agora, o senhor vinha realizando uma série de pesquisas sobre as interfaces cérebro-máquina. Onde esta pesquisa sobre a interface cérebro-cérebro se insere em seus estudos? Ela é uma progressão natural das pesquisas anteriores. Em nossos laboratórios, nós buscamos descobrir os limites do cérebro, queremos descobrir até onde podemos levar o órgão a incorporar novos sensores. Já fizemos ele se comunicar com máquinas, com avatares em computador e até com sensores de luz infravermelha. Desta vez, nós tentamos descobrir se o cérebro é capaz de assimilar os sentidos de outro corpo. Essa pesquisa surgiu no mesmo período do estudo que permitiu aos ratos sentirem a luz infravermelha — elas caminharam juntas. O objetivo de ambas era estudar quais os limites da plasticidade cerebral cortical. Nossa ideia era publicar as duas pesquisas juntas, mas os editores de revista Nature recomendaram que dividíssemos as descobertas em dois trabalhos. Um foi publicado na revista Nature Communications e o outro na revista Scientific Reports.

A ideia de realizar uma interface cérebro-cérebro é nova? Eu propus publicamente essa nova interface em meu livro, Muito Além do Nosso Eu (Cia. das Letras), publicado em 2011. Mas eu já tinha proposto isso em nossos laboratórios em 2006, e fomos examinando essa possibilidade com o decorrer do tempo. Como resultado do estudo, descobrimos que o cérebro do segundo rato, o decodificador, começou a representar não só os próprios bigodes, mas também os bigodes do outro animal. Nós criamos a representação de um outro corpo em seu cérebro, o que foi totalmente inesperado. Isso demonstrou o tamanho da plasticidade cerebral, capaz de assimilar os sentidos de outro animal e se comunicar usando apenas a atividade elétrica produzida em seu interior.

Esses sinais elétricos são sempre transmitidos entre os animais da mesma forma? Não, uma série de fatores na atividade neuronal pode afetar a clareza da transmissão da informação. A atenção — ou distração — com que o animal realiza a atividade afeta a qualidade da transmissão. A precisão com que realiza os movimentos também. Existe uma variabilidade biológica na transmissão desses sinais. 
No estudo, o senhor diz que os animas foram capazes de perceber isso, e melhoraram a clareza da transmissão. Como isso foi possível? O primeiro animal não recebia sua recompensa completa a menos que o segundo realizasse sua tarefa de forma correta. O codificador não gostava quando o outro rato apertava a alavanca errada  — ele queria a recompensa. Por isso, nas tentativas seguintes ele mudava seu comportamento: prestava mais atenção na tarefa, usava movimentos mais precisos e, assim, seus sinais cerebrais ficavam mais claros. O comportamento de um animal influenciava o outro, eles estavam se comunicando. Seus cérebros se sincronizavam para realizar a tarefa.

Mas o rato tinha como saber que estava se comunicando com outro animal? Nesse caso, o codificador não sabia que existia outro rato. Ele só sabia que queria ganhar sua recompensa, e aprendeu que se fizesse a tarefa bem feita, a recompensa vinha. Eles estavam se comunicando indiretamente, mas influenciando diretamente o comportamento um do outro. Nesse momento, estamos realizando experimentos com dois macacos, que estão aprendendo a controlar avatares em um mundo virtual. Eles vêm um ao outro na tela, e sabem que existe outro animal no ambiente. Nossa intenção é que eles aprendam a usar uma interface cérebro-cérebro para trocar informações e realizar tarefas nesse mundo virtual.

E como isso pode levar ao desenvolvimento de um computador orgânico? A minha ideia é colocar mais ratos, ou macacos, interagindo por meio dessa rede que criamos. Se tivermos sucesso ao fazer isso, podemos criar um sistema computacional com uma arquitetura orgânica, formado por múltiplos cérebros — eu chamo essa ideia de brainet. Teoricamente, uma rede de cérebros seria capaz de realizar tarefas que um computador normal não faria muito bem. Eu quero ver, por exemplo, se um cérebro pode estocar informações de uma maneira distribuída de maneira que um rato só não tenha toda a informação, mas a rede inteira estoca a informação. Essa rede de cérebros seria capaz de realizar computações sem depender de uma base pré-determinada de instruções – os algoritmos. Foi isso que eu falei no Encontro Anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência, em Boston, e causou tanta repercussão.

[Durante o encontro, Nicolelis disse que não é possível transformar a atividade do cérebro em uma série de algoritmos, e nenhum engenheiro é capaz de reproduzi-lo em um computador. Essa previsão contradiz as teorias de uma série de cientistas, como o futurista Ray Kurzweil, que previam que, no futuro, os computadores estariam tão avançados que sua inteligência artificial superaria a humana e seria possível fazer o upload de pensamentos, memórias e consciências nessas máquinas. O momento exato em que isso aconteceria ficou conhecido como Singularidade. Em sua fala, Nicolelis disse que esse momento nunca irá chegar, pois a consciência é fruto da interação imprevisível e não-linear entre bilhões de células.]

Sua declaração atacando a Singularidade causou comoção na comunidade científica. O senhor esperava por isso? Não sei se a comoção foi tão grande. Os neurocientistas gostaram muito do que falei, porque sabem que isso é verdade. O pessoal da ciências da computação e da inteligência artificial é que pareceu ficar preocupado, pois alguém começou a falar contra essa ideia. A Singularidade começou a ser vendida como se fosse apenas questão de tempo, uma verdade inexorável. Mas nós, neurocientistas, sabemos que isso não vai acontecer nunca.

Por enquanto, as informações que vocês trocaram entre os cérebros foram muito simples. Como será possível chegar ao nível necessário para criar a brainetEm nossa pesquisa medimos cerca de 50 neurônios. Nós temos que aumentar muito a complexidade do sinal transmitido entre os cérebros. Mas é difícil fazer isso com os ratos. Teríamos que usar mais eletrodos. Em nossa pesquisa com macacos já estamos usando dezenas e até centenas de eletrodos.

Seria possível usar essa rede para transmitir pensamentos e memórias? Ainda não sabemos, não temos nenhuma evidência para falar isso. Mesmo assim, eu ouso dizer que, muito no futuro, eventualmente seremos capazes de fazer isso.

Qual foi o papel do Instituto Internacional de Neurociências de Natal nessa pesquisa?Ele teve um papel muito importante. No estudo que transmitiu os sinais pela internet entre Estados Unidos e Brasil, os registros da atividade cerebral dos ratos codificadores foi realizada em Natal. A nossa pesquisadora, Carolina Kunicki, foi responsável por criar e treinar esses ratos codificadores. Além disso, toda a tecnologia de implantes cerebrais, de estimulação do córtex, foi transferida para lá. A pesquisa terá repercussão mundial. O que mais podemos pedir? Que outros instituto brasileiro terá seu trabalho coberto por toda a imprensa mundial? Isso é extremamente raro. Esse é apenas o começo de uma série de trabalhos que vão começar a ser publicados — ninguém faz ciência do dia para a noite. Um deles, feito inteiramente no Instituto, é sobre a doença de Parkinson, demonstrando a viabilidade de uma técnica de estimulação medular em macacos.

O senhor começa seu estudo citando uma frase do engenheiro Ralph Hartley sobre a transmissão de informações entre organismos biológicos: “em qualquer comunicação, aquele que envia a informação seleciona mentalmente um símbolo particular e, por meio de algum tipo de movimento corporal, como os mecanismos vocais, faz com que o destinatário seja dirigido para esse símbolo particular”. O que essa citação tem a ver com sua pesquisa? Na realidade, nós criamos uma forma de comunicação completamente inédita, em qualquer espécie. Ninguém sabe como esse tipo de interface pode acontecer, que símbolos podem ser usados. Nós estamos criando um novo tipo de interface, que ninguém sabe onde poderá nos levar. Daqui a décadas, ou até uma centena de anos, com a criação de técnicas não invasivas para ler os sinais do cérebro, nós poderemos ver até seres humanos se comunicando por meio disso. Qual a simbologia que será usada? Não sabemos. Eles serão criados na medida em que formos desenvolvendo a tecnologia. Eu achei a citação completamente apropriada.

Pesquisa de Miguel Nicolelis dá a largada para criar 'internet cerebral'


Neurociência

Neurocientista conseguiu fazer com que ratos transmitissem informações entre seus cérebros a milhares de quilômetros entre si, criando a primeira interface cérebro-cérebro. É o passo inicial para criar, no futuro, uma rede capaz de ligar as pessoas por meio do pensamento

Guilherme Rosa
Internet cerebral: pesquisa feita pela equipe de Miguel Nicolelis dá o pontapé inicial para criar 'brainet'
Internet cerebral: pesquisa feita pela equipe de Miguel Nicolelis dá o pontapé inicial para criar 'brainet' (Thinkstock)
Em 2011, no livro Muito Além do Nosso Eu: A Nova Neurociência Que Une Cérebros e Máquinas e Como Ela Pode Mudar Nossas Vidas (Ed. Cia. das Letras), o neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis propõe o conceito de brainet, uma avançada rede pela qual seria possível se comunicar através de ondas cerebrais com outras pessoas, uma espécie de 'internet cerebral'. Nesta quinta, ele anuncia o primeiro passo para que isso um dia se torne realidade. Em sua pesquisa mais recente, sua equipe conseguiu ligar eletronicamente os cérebros de dois ratos. Após terem microeletrodos instalados em suas cabeças, os animais passaram a se comunicar por meio da transmissão dos sinais elétricos produzidos por seus neurônios, e colaboraram para a resolução de tarefas mesmo quando não estavam na presença um do outro. Desse modo, os cientistas conseguiram criar, pela primeira vez, uma interface cérebro-cérebro. O estudo, realizado na Universidade Duke, nos Estados Unidos, e no Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond e Lily Safra (IINN-ELS), foi publicado na revistaScientific Reports.
CONHEÇA A PESQUISA

Título original: A Brain-to-Brain Interface for Real-Time Sharing of Sensorimotor Information

Onde foi divulgada: Revista Scientific Reports

Quem fez: Miguel Pais-Vieira, Mikhail Lebedev, Carolina Kunicki, Jing Wang e Miguel A. L. Nicolelis

Instituição: Universidade Duke, EUA

Dados de amostragem: Ratos que receberam eletrodos em seus cérebros. Eles foram instalados, em experimentos diferentes, nas áreas responsáveis pelas informações motoras e pelas informações táteis

Resultado: Os ratos conseguiram transmitir informações motoras e táteis entre si. Desse modo, foram capazes de agir em cooperação para realizar tarefas comportamentais, mesmo quando separados por grandes distâncias
Até agora, as pesquisas desenvolvidas por Miguel Nicolelis se voltavam principalmente ao estudo de novas interfaces cérebro-máquina-cérebro. Elas consistiam, basicamente, em captar a atividade elétrica no cérebro de um animal e traduzi-la para comandos eletrônicos, que podiam ser lidos por artefatos robóticos. O pesquisador havia conseguido, por exemplo, fazer um macaco controlar uma mão virtual apenas com o seu pensamento. Segundo Nicolelis, o desenvolvimento de uma interface cérebro-cérebro representa a progressão lógica dessas pesquisas. "Em nossos laboratórios, nós buscamos descobrir os limites do cérebro. Já o fizemos se comunicar com máquinas, com avatares em computador e até com sensores de luz infravermelha. Desta vez, nós tentamos descobrir se o cérebro é capaz de assimilar os sentidos de outro corpo", disse Nicolelis em entrevista ao site de VEJA.
Para testar a hipótese, os pesquisadores realizaram uma série de três experimentos em ratos. No primeiro, os animais foram treinados para realizar uma tarefa simples: eles eram colocados em um compartimento de frente para duas alavancas, e deveriam escolher qual delas pressionar de acordo com uma luz que acendia sobre ela. Se escolhessem a correta, ganhavam um gole de água como recompensa.
Depois que os animais aprenderam a realizar a tarefa, os pesquisadores inseriram microeletrodos em seus cérebros, na região do cérebro que processa as informações motoras (córtex motor), e os separam em dois grupos: codificadores e decodificadores. Os primeiros teriam a atividade elétrica de seu cérebro registrada durante a execução da tarefa e transmitida adiante. Os segundos seriam treinados para receber e compreender essa informação, implantada diretamente em seu córtex motor.

Saiba mais

INTERFACE CÉREBRO-MÁQUINA-CÉREBRO
São sensores capazes de captar a atividade elétrica dos neurônios, decodificá-la, remetê-la a artefatos robóticos e depois de volta para o cérebro por meio de sinais visuais, táteis ou elétricos. Na prática, as ICMCs transformam os pensamentos em comandos digitais que as máquinas podem entender.
Os decodificadores foram colocados em um compartimento parecido com o usado anteriormente, com duas alavancas, mas sem uma luz capaz de guiá-los para a escolha correta — eles só contavam com as informações transmitidas a seu cérebro para resolver a tarefa. Durante o treinamento, quando a estimulação elétrica era criada pelos pesquisadores e não pelo outro rato, os decodificadores conseguiram traduzir os sinais de forma correta em 78% das vezes. Já durante o experimento, recebendo as informações diretamente do cérebro do outro animal, eles pressionaram a alavanca certa em 70% das vezes. A performance da nova interface cérebro-cérebro foi um pouco pior do que a estimulação cerebral direta pois uma série de fatores afetava a clareza com que os sinais cerebrais eram transmitidos a partir do primeiro rato, como sua concentraçao na tarefa e coordenação de movimentos. Mesmo assim, os cientistas haviam provado a viabilidade da nova tecnologia.
Segundo os pesquisadores, a comunicação entre os cérebros não se deu apenas em um sentido, mas foi uma via de mão dupla. Como o rato codificador só recebia uma recompensa completa se o outro realizasse a tarefa de forma correta, houve o estabelecimento de uma colaboração comportamental entre os animais. "O codificador não gostava quando o outro rato apertava a alavanca errada — ele queria a recompensa. Por isso, na tentativa seguinte ele mudava seu comportamento: prestava mais atenção na tarefa, usava movimentos mais precisos e, assim, seus sinais cerebrais ficavam mais claros. O comportamento de um animal influenciava o outro, eles estavam se comunicando", diz Nicolelis.
Tato à distância – No segundo experimento, os pesquisadores testaram a possibilidade de transmitir entre os cérebros dos animais não só informações motoras, mas táteis. Eles treinaram os ratos para usar seus bigodes para distinguir entre uma abertura estreita ou larga em sua jaula. Se fosse estreita, os ratos tinham que colocar o nariz em um sensor ao lado esquerdo da abertura. Se fosse larga, eles deveriam colocar o nariz no sensor ao lado direito. Quando acertavam, eles eram recompensados com goles de água.
Depois de treinados, os animais foram novamente divididos entre codificadores e decodificadores. Os decodificadores foram colocados em uma jaula sem a abertura, e deviam interpretar os sinais recebidos em seu cérebro para saber que sensor pressionar. Dessa vez, no entanto, os pesquisadores instalaram os microeletrodos no córtex tátil de cada animal. O sinal transmitido para o decodificador não dizia mais respeito à movimentação, mas à percepção do bigode do outro rato. Após a realização dos experimentos, os pesquisadores descobriram que o índice de sucesso na transmissão da informação foi de 65%, maior do que seria esperado pelo simples acaso.
Ao analisar os neurônios dos ratos decodificadores, os pesquisadores descobriram que eles ainda eram capazes de responder às próprias sensações táteis, mas, ao mesmo tempo, tinham adquirido a capacidade de perceber as sensações alheias. "O cérebro do rato começou a representar não só os próprios bigodes, mas também os bigodes do outro animal. Nós criamos a representação de um outro corpo em seu cérebro, o que foi totalmente inesperado", diz Nicolelis.
Para testar os limites da transmissão cérebro-cérebro, os pesquisadores replicaram a experiência com ratos separados por milhares de quilômetros. Os codificadores foram colocados em compartimentos no Instituto Internacional de Neurociências de Natal e os decodificadores na Universidade Duke, em Durham, nos Estados Unidos. Para transmitir os sinais elétricos entre os animais, foi usada uma simples conexão de internet. Mesmo sob essas condições extremas, a comunicação foi considerada bem-sucedida. "Apesar de os animais estarem em continentes diferentes, com a transmissão ruidosa resultante e atrasos de sinal, eles ainda puderam se comunicar", diz Miguel Pais Vieira, pesquisador da Universidade Duke e primeiro autor do estudo. "Isso sugere que, no futuro, poderemos criar uma rede de cérebros de animais distribuídos em vários locais diferentes."
Rede mundial de cérebros — Por enquanto, os pesquisadores foram capazes de transmitir somente informações muito simples entre os cérebros, envolvendo apenas algumas dezenas de neurônios. No entanto, Miguel Nicolelis diz que, com o aumento da capacidade tecnológica, as trocas tendem a ser cada vez mais complexas, podendo levar ao desenvolvimento de computadores orgânicos. "Se pusermos mais animais interagindo dentro dessa rede, podemos criar um sistema computacional formado por múltiplos cérebros, com uma arquitetura orgânica."
Hoje, no entanto, a tecnologia está em seus primeiros passos e deve levar décadas, ou até séculos, para que as previsões se confirmem. Por enquanto, o campo da interface cérebro-cérebro está em pleno desenvolvimento —  Nicolelis, por exemplo, já testa a técnica em macacos —, e as possibilidades abertas são inúmeras. "Essa comunicação direta entre os cérebros é completamente inédita, em qualquer espécie. Ninguém sabe como esse tipo de interface pode acontecer, que símbolos podem ser usados. Nós estamos criando um novo tipo de comunicação, que ninguém sabe onde poderá nos levar", diz.

ratos

Saiba mais

BRAINETNa versão mais futurística idealizada por Miguel Nicolelis, nossa atividade elétrica cerebral viajaria pelo ar como ondas de rádio. "Imagine viver num mundo em que as pessoas usam computadores, dirigem carros e se comunicam simplesmente por meio do pensamento." A criação da brainet atualmente, no entanto, é impossível. As Interfaces-Cébrebro-Máquinas atuais não conseguem captar os sinais de mais de 2.000 neurônios ao mesmo tempo e perdem a eficácia após algum tempo, devido ao desgaste do tecido cerebral. Nos moldes pensados por Nicolelis, a brainet dispensaria o uso de chips.

Vanessa Da Mata - Boa Sorte / Good Luck

O mandato de Dilma durou apenas dois anos. Os outros dois, agora, serão anulados tentando conseguir mais quatro. Ou: Ninguém sabe ser tão inescrupuloso quanto Lula



Mal saímos de uma campanha eleitoral, já estamos em outra. É o ritmo frenético que Lula impõe ao processo político. Não tem jeito. Ele não consegue descer do palanque. É o seu elemento. Isso mantém permanentemente mobilizadas as bases de seu partido e também força adversários e aliados a fazer escolhas precoces. Como estes não têm exatamente uma agenda própria e se colocam como meros caudatários dos comandos petistas — sim, vale também para  PSDB —, o Apedeuta pinta e borda.
Com dois ou três movimentos, Lula já colocou em xeque o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). Estou entre aqueles que acham que seria saudável que se candidatasse à Presidência — embora eu também queira saber o que ele pretende e como vai dizer ao eleitorado que permaneceu por tanto tempo na barca petista até decidir romper. De toda sorte, vejo com simpatia — e isso não é segredo para ninguém — um eventual racha do condomínio liderado pelo PT. Mas, também já escrevi aqui, não aposto muito nisso.
Ocorre que Lula, de uma ignorância oceânica, é, não obstante, dotado de uma esperteza política sem concorrentes no país. Nesse particular, e só nesse, ele é dotado de mais recursos do que FHC, por exemplo. Não por acaso, já atraiu o seu adversário de divã — sim, o problema é freudiano — para o bate-boca eleitoral. Levou o PSDB a tentar antecipar a escolha, os tucanos agiram como patos, e o partido, anotem aí, ainda acabará assistindo a uma revoada de descontentes se continuar nessa marcha. Sabem por quê? Com perspectiva de poder, os políticos podem até aceitar certos atropelos e humilhações. Sem ela, por que aceitariam? E o viés, tudo contabilizado, não é exatamente de alta para o tucanato na esfera federal.
Lula chamou o PSDB para a briga, e alguém lá do ninho teve uma ideia: “Ah, vamos decidir agora, pronto! E quem não gostar que se dane!”. OU POR OUTRA: OS TUCANOS COMBINARAM TUDO COM O ADVERSÁRIO, MAS ESQUECERAM DE COMBINAR COM OS ALIADOS. Lula não aprendeu a fazer essas coisas na política partidária. Ele vem do sindicalismo, onde só há cobras criadas. Pior para quem cai na sua conversa.
O Apedeuta também leva outra vantagem sobre qualquer político: não tem nenhum escrúpulo. Não é o único. Mas ninguém é tão inescrupuloso, no que concerne aos hábitos políticos,  quanto ele. Ontem, por exemplo, como se fosse presidente da República, visitou as obras do Maracanã, acompanhado do governador do Rio, Sergio Cabral (PMDB), e do vice, o sr. Pezão. Falou aos operários. E qual foi o tema? Os 10 anos do PT no poder. Ou por outra: foi a um canteiro de obra pública para fazer proselitismo partidário — não sem elogiar fartamente o anfitrião, Cabral. PT e PMDB fluminenses estão em pé de guerra por causa de 2014. Mas o Apedeuta estava lá fazendo a conciliação. Assim como é muito difícil para Campos levar adiante o seu intento, a candidatura de Lindbergh não será muito fácil. Em seu discurso no estádio em obras, o ex-presidente excitou o ufanismo da massa e fez um desagravo de agravo que não houve: segundo ele, diziam (quem “diziam”?) que o Brasil não seria capaz de realizar a Copa do Mundo, mas estaríamos provando que é mentira etc. etc. etc. Bem, nunca ninguém disse isso. Lula vive atribuindo coisas a um sujeito indeterminado para que possa, então, afirmar o contrário. Está permanentemente em guerra.
De lá voou para Fortaleza para um dos eventos que marcam os dez anos da chegada do PT ao poder. Poucos estão se dando conta do quão autoritário é o espírito que anima essa comemoração. Os petistas tentam transformar o ano de 2003 numa espécie de data do calendário oficial, como se tivesse havido um rompimento da velha ordem em benefício da nova. Que velha ordem se rompeu? O Brasil já era um democracia plena, regido por uma Constituição elaborada por representantes do povo, eleitos livremente — Constituição que os petistas se negaram  homologar, destaque-se.
O PT comemora os 10 anos (tendo a certeza de mais dois que a lei já lhe assegura) como quem anuncia que virão mais quatro a partir de 2015, depois outros quatro a partir de 2019; em seguida, outro tanto…  E assim eternidade afora. “É normal, Reinaldo! Os partidos lutam para ganhar eleições!” Eu sei. Mas não é corriqueiro que transformem isso em marco inaugural. Fico cá a imaginar se os tucanos decidissem fazer seminário em São Paulo para exaltar as conquistas dos últimos 18 anos de poder PSDB — 20 em 2014…  O mundo viria abaixo na imprensa paulista: “Ora, onde já se viu?”. Aliás, nos setores “petizados” das redações, como sabem, a gente ouve falar na necessidade de “renovação”…
Essa “comemoração” liderada por Lula é um absoluto despropósito e foi só a maneira encontrada para deflagrar a campanha antes da hora — o que a Lei Eleitoral proíbe, é bom lembrar. Mas quem se importa? O inimputável pode fazer o que lhe der na telha, incluindo proselitismo partidário num canteiro de obra pública. Não reconhece instância que possa lhe botar freios.
“Ah, tudo vai às mil maravilhas com o Brasil, e fica esse Reinaldo Azevedo enchendo o saco…” Não! As coisas não vão às mil maravilhas, como sabe qualquer pessoa medianamente informada. Mas nem temos na oposição quem sem disponha a pôr o guizo no pescoço do gato nem há na situação quem consiga pôr algum freio em Lula e sua turma. Ele pressentiu que começava a haver um acúmulo considerável de críticas às irresoluções e incompetências do governo. Animal político notável, deflagrou a campanha eleitoral.
O mandato de Dilma durou apenas dois anos. Os outros dois serão anulados pelas articulações políticas para conseguir outros quatro a partir de 2015.
Por Reinaldo Azevedo
http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/o-mandato-de-dilma-durou-apenas-dois-anos-os-outros-dois-agora-serao-anulados-tentando-conseguir-mais-quatro-ou-ninguem-saber-se-tao-inescrupuloso-quanto-lula/

Undergoing (original song) - Isli Melanie



Gosto muito!!