São Paulo – O Brasil votou contra o envio de observadores pela Organização dos Estados Americanos (OEA) para analisar a situação na Venezuela. Durante reunião extraordinária da entidade regional, o Itamaraty manifestou sua visão de que uma decisão assim neste momento seria inoportuna e contribuiria para acirrar os ânimos entre governo e oposição, em conflitos que já deixaram ao menos vinte mortos desde 12 de fevereiro. O Conselho Permanente da OEA já realizou dois dias de reuniões em Washington.
A administração de Nicolás Maduro obteve uma vitória expressiva ontem, com a aprovação de uma declaração que rejeita intervenções externas para a solução do impasse. Essa tem sido justamente a linha de argumentação mantida pelo presidente e por seu chanceler, Elías Jaua, desde que começaram protestos e atos violentos, entendidos pelos chavistas como uma tentativa de golpe de Estado.
O texto, que contou com 29 votos a favor, valoriza a busca do diálogo e pede respeito à institucionalidade democrática. A resolução contou com a oposição de Estados Unidos, Canadá e Panamá. No texto, o Conselho Permanente expressou seu "reconhecimento, o apoio pleno e o incentivo às iniciativas e aos esforços do governo democraticamente eleito da Venezuela e de todos os setores políticos, econômicos e sociais para que continuem avançando no processo de diálogo nacional, para a reconciliação política e social".
Esse diálogo deve ser realizado "com pleno respeito às garantias constitucionais de todos e por todos os atores democráticos", acrescentou o texto, mostrando a "mais enérgica rejeição a toda forma de violência e intolerância”, com um pedido de paz, tranquilidade e respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais - incluindo os direitos à liberdade de expressão e reunião pacífica, circulação, saúde e educação - a todos os setores".
Imediatamente após a aprovação, o governo venezuelano comemorou o que considera um triunfo a favor da paz. Em entrevista a um canal de televisão local, Elías Jaua afirmou que está sendo desmontado o aparelho de propaganda montado contra a administração chavista. "Mais do que da Venezuela, acho que é uma vitória da dignidade da América Latina e do Caribe", disse o chanceler. Ele expôs a visão de que agora o mundo sabe que o país sul-americano "não enfrenta manifestantes pacíficos", mas uma "corrente violenta que tenta derrubar o governo legítimo e constitucional de Nicolás Maduro".
Na reunião, o secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza, disse que não cabe à organização intervir nos assuntos internos de seus países membros, mas para ajudar na superação de suas crises. Para ele, os discursos de cada um dos lados têm sido radicais e há poucos chamados ao entendimento e à conciliação. “Muitas das circunstâncias são reconhecidas pelo governo e oposição. Todos proclamam a necessidade de superar, mas insistem em culpar o adversário e creem que, de forma unilateral, podem ganhar a batalha”, afirmou o chileno.
Na semana passada, ao se encontrar com Elías Jaua, o chanceler brasileiro, Luiz Alberto Figueiredo, disse acreditar que, pelo diálogo e respeitando o ordenamento institucional, a Venezuela poderá resguardar a ordem democrática.
Já o embaixador do Panamá na OEA, Arturo Vallarino, opinou que a solicitação de solidariedade para a Venezuela e para a "continuação" do diálogo "pode ser interpretada como parcial em relação ao governo" venezuelano. "O Panamá considera que a OEA deve ter uma atitude mais dinâmica e acompanhar a situação, e não somente declarar seu interesse em se manter informada sobre o diálogo já instaurado", afirmou o país centro-americano em uma nota de pé de página anexada à declaração, um recurso que também usaram Estados Unidos e Canadá para expressar discordância.
A decisão do Panamá de pedir a convocação de uma reunião da OEA para tratar do tema provocou indignação no governo venezuelano, que considerou o gesto uma ingerência externa e expulsou de Caracas os diplomatas da nação centro-americana. Ao comentar o caso, Jaua afirmou não se surpreender com a postura de Estados Unidos e Canadá, e atribuiu a postura panamenha a uma atuação do “império”, que encontra naquele país “seu centro e sua articulação”. O chanceler reiterou sua visão de que partiu dos norte-americanos a decisão de desestabilizar Maduro.
As manifestações tiveram início depois que um jovem universitário foi detido em um protesto. De lá para cá, opositores falaram abertamente em promover a queda do presidente, reunindo-se num movimento chamado “A Saída”. Partidos adversários do chavismo tentam se valer do momento ruim da economia, que acumula inflação alta, perda de poder de compra devido à desvalorização do bolívar frente ao dólar e desabastecimento de produtos básicos. Para o governo, trata-se de uma estratégia combinada para provocar insatisfação na população e criar uma faísca para levar o país a uma explosão social.
É provável que uma resolução favorável a Maduro seja aprovada entre terça e quarta-feira, durante reunião da União das Nações Sul-americanas (Unasul). O bloco regional vai aproveitar a presença de chanceleres e chefes de Estado em Santiago para a posse da presidenta do Chile, Michelle Bachelet, para debater o caso. O chanceler venezuelano afirmou ontem esperar uma "uma declaração contundente" a partir do encontro, ao qual vai comparecer "com todas as expectativas, e muito mais depois dessa heroica vitória".