quarta-feira 10 2014

Câmara cassa André Vargas, sócio do doleiro Youssef

Lava Jato

Rifado pelo PT para não atrapalhar as eleições, deputado perdeu o mandato nesta quarta. Segundo a PF, ele trabalhou para enriquecer com o doleiro

Marcela Mattos, de Brasília
Vice-presidente da Câmara dos Deputados, André Vargas
A Câmara dos Deputados cassou nesta quarta-feira o primeiro mandato de um parlamentar flagrado no maior propinoduto já descoberto no país. Por 359 votos a favor e seis abstenções, o paranaense André Vargas, filiado ao Partido dos Trabalhadores até abril, perdeu o mandato por quebra de decoro parlamentar. O único voto pela absolvição foi de José Airton (PT-CE).
Homem forte no PT, André Vargas ocupava a cobiçada primeira-vice-presidência da Câmara quando seu nome apareceu na primeira etapa da Operação Lava Jato da Polícia Federal, que à época desenhava-se apenas uma grande investigação de combate à lavagem de dinheiro. Os desdobramentos da operação revelaram que o agora ex-deputado mantinha uma estreita relação com o doleiro Alberto Youssef, pivô de um esquema de lavagem de recursos públicos desviados cujas proporções ainda não foram totalmente dimensionadas – e que devem arrastar uma lista de políticos que se beneficiaram do esquema que assaltou os cofres da Petrobras. Nesse aspecto, a decisão da Câmara é alentadora.

Segundo a Polícia Federal, Vargas era sócio em negócios ilícitos de Youssef, como o laboratório de fachada Labogen, usado para lavar 113,38 milhões de dólares em contratos de câmbio fictícios. Conforme as investigações, os dois trabalhavam para enriquecer juntos, fraudando contratos com o governo federal. Mensagens de celular interceptadas pela Polícia Federal evidenciaram que Vargas, que se referia ao doleiro como "irmão", exercia seu poder para cobrar compromissos de Youssef. O jornal Folha de S. Paulo também revelou que Vargas chegou a viajar em férias usando um jatinho fretado pelo doleiro.
Rifado pelo PT para que não contaminasse algumas candidaturas da sigla, Vargas manteve parte de sua influência na Câmara e contou com a ajuda de parlamentares do partido para protelar o desfecho do processo por oito meses. Por pouco não conseguiu encerrar a legislatura ileso, o que evitaria o enquadramento na Lei da Ficha Limpa e a inelegibilidade pelos próximos oito anos. Nesta quarta-feira, o deputado José Mentor (PT-SP) chegou a sentar na cadeira da presidência da Câmara encerrar pela manhã a sessão destinada a votar o parecer pela perda do mandato. A intenção era adiar a votação para a próxima semana, a última antes do recesso, o que provavelmente salvaria Vargas. A manobra só não deu certo porque a oposição pressionou e o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), retornou à sessão mais tarde.

Amigo do paranaense, o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), cujo nome também ronda a Operação Lava Jato, saiu em defesa do colega: “Não é correto falar que um deputado que vote ‘não’ seja a favor da corrupção. Nós estamos votando aqui a cassação de um colega que acho que teve muita pouca base de avaliação”, afirmou. No entanto, ao orientar o voto da bancada, o líder do PT, Vicentinho (SP), defendeu a cassação do ex-petista.
Conhecido pelo estilo fanfarrão e truculento, Vargas não compareceu à sessão para se defender. Em uma última cartada para adiar a análise do processo, ele apresentou um atestado médico alegando que havia passado por uma cirurgia na boca. No entanto, o recurso foi negado sob o argumento de que o deputado deveria ter solicitado análise da junta médica da Câmara. O deputado Eurico Júnior (PV-RJ) assumiu a função de advogado dativo e fez a defesa do paranaense em plenário. Sem conseguir negar a relação de Vargas com o doleiro, o defensor pediu o abrandamento da pena: uma suspensão. Vargas chegou até a apelar para o sentimentalismo dos colegas. Em um apelo a aliados, ele rogou que o processo não fosse agendado para esta quarta-feira, aniversário da cidade paranaense de Londrina, seu berço político. Não foi atendido.
Ex-secretário de Comunicação do PT, Vargas foi um dos principais defensores dos políticos presos no julgamento do mensalão. Ao longo do processo, o agora ex-deputado acusou o Supremo Tribunal Federal de estar cedendo às pressões para agilizar o julgamento e deu uma série de declarações para desqualificar a corte. Da tribuna, Vargas protagonizou a deplorável cena ao hostilizar o então presidente do Supremo Joaquim Barbosa, relator do mensalão, repetindo o gesto dos mensaleiros – punho em riste – durante sessão solene.

CPI mista da Petrobras termina sem indiciamentos

Congresso

Relatório final dos congressistas poupa cúpula da petrolífera e ignora evidências de propinoduto a parlamentares e ex-executivos da empresa

Laryssa Borges, de Brasília
Ex-presidente da Câmara, o deputado Marco Maia (PT-RS) relatou a CPMI da Petrobras
Ex-presidente da Câmara, o deputado Marco Maia (PT-RS) relatou a CPMI da Petrobras (Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr/VEJA)
Apesar das evidências de um megaesquema de corrupção que sangrou os cofres da maior empresa brasileira, o relatório final da CPI mista da Petrobras apresentado nesta quarta-feira pelo deputado Marco Maia (PT-RS) poupou a cúpula da estatal de responsabilidades, desqualificou análises técnicas desenvolvidas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e terminou por não indiciar nenhuma autoridade.
O fim melancólico da CPI mista era previsível, já que os trabalhos do colegiado foram controlados por governistas e nem deputados nem senadores tiveram acesso aos conteúdos das delações premiadas do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef. As revelações de ambos incluem a informação de que parlamentares, governadores e até um ministro de Estado receberam propina do esquema do petrolão.
Em 903 páginas de relatório, ao não indiciar nenhuma autoridade, Maia apenas recomenda o aprofundamento das investigações contra executivos e pessoas como o lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano e apontado como o operador do PMDB no petrolão, contra a ex-contadora do doleiro Alberto Youssef, Meire Poza, e contra ex-dirigentes da Petrobras, como Nestor Cerveró, ex-Diretor da área internacional, Paulo Roberto Costa, ex-Diretor de Abastecimento, Pedro Barusco, ex-Gerente-executivo de Serviços e Engenharia, e Renato Duque, ex-Diretor de Serviços e Engenharia.
A atual cúpula da Petrobras, presidida por Maria das Graças Foster, e o ex-presidente da estatal Sergio Gabrielli, foram poupados de qualquer pedido de aprofundamento de investigações.

Incrível (Angelina Jordan de 7 anos canta Fly Me To The Moon em Senkveld





Dirceu faturou R$ 886.500 da Camargo Corrêa por consultoria

Lava Jato

No mesmo período em que contratou o mensaleiro, empreiteira fechou R$ 4,7 bilhões em contratos por serviços na refinaria de Abreu e Lima, da Petrobras

Daniel Haidar, do Rio de Janeiro
Contrato de consultoria assinado entre Dirceu e Camargo Correa
Contrato de consultoria assinado entre Dirceu e Camargo Correa (Reprodução/VEJA)
Uma empresa do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT), condenado no julgamento do mensalão por corrupção, fechou contrato de 900.000 reais com a construtora Camargo Corrêa. Entre maio de 2010 e fevereiro de 2011, o petista recebeu 886.500 reais líquidos da empreiteira, investigada na Operação Lava Jato por suspeita de participar de um cartel dedicado a fraudar licitações da Petrobras e de pagar propina a executivos da estatal e políticos.
Desde a quebra do sigilo fiscal da empreiteira os investigadores sabiam que os pagamentos foram feitos. O contrato foi encontrado por policiais federais na sede da construtora em São Paulo durante o cumprimento de mandados de busca e apreensão no dia 14 de novembro, data em que foi deflagrada a sétima fase da Lava Jato. De acordo com o documento, Dirceu deveria fazer "análise de aspectos sociológicos e políticos" e "prestar assessoria na integração dos países da América do Sul". Também precisaria "divulgar o nome da contratante na comunidade internacional".
Embora tenha sido assinado no dia 22 de abril de 2010, o contrato estipulava que os serviços começariam a ser prestados em fevereiro de 2010. O primeiro desembolso da construtora para a JD Assessoria e Consultoria, a firma de Dirceu, foi feito no fim de maio de 2010, no valor de 221.625 reais. Cada liberação posterior somou 73.875 reais. Os investigadores têm uma hipótese para o contrato ter alinhavado pagamentos desde fevereiro de 2010. Naquele mês, tiveram início dois contratos de prestação de serviços da Camargo Corrêa para a Petrobras, pelo valor total de 4,7 bilhões de reais. O objetivo era a implantação das unidades de coqueamento retardado da refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco.
As obras da Camargo Corrêa em Abreu e Lima foram o primeiro duto de corrupção descoberto na Operação Lava Jato. De acordo com o Ministério Público, os serviços foram superfaturados em 613 milhões de reais e pelo menos 32 milhões de reais destes gastos excessivos foram desviados para uma das empresas de fachada do doleiro Alberto Youssef, a MO consultoria. Youssef e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa tiveram a condenação requisitada pelo Ministério Público Federal por operações de lavagem de dinheiro desviado da refinaria.
Além do doleiro, os investigadores constataram que empreiteiras fecharam contratos de consultoria com diferentes operadores para disfarçar o pagamento de propina. O lobista Júlio Camargo, ligado ao grupo Toyo Setal, também assumiu em depoimento que recorria a esse expediente para receber dinheiro de participantes do cartel e repassá-lo a executivos da estatal. O lobista faturou 73 milhões de reais entre 2010 e 2012 só com a Camargo Corrêa e utilizou parte desse dinheiro para pagar suborno, como revelou o site de VEJA.
A polícia ainda investiga outros operadores, mas já considera que Renato Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobras e indicado ao cargo por Dirceu, era o principal intermediador do PT no esquema. Ele ficou preso por quase três semanas por suspeita de ter recebido mais de 40 milhões de dólares em propina, de acordo com depoimentos do lobista Júlio Camargo e do empresário Augusto Mendonça Neto, que aderiram à delação premiada e passaram a colaborar com as investigações em troca de punições mais brandas da Justiça.
No período em que o contrato com a Camargo Corrêa foi assinado, Dirceu estava fora do governo, já era réu no processo do mensalão, mas ainda exercia influência na Petrobras. Atualmente cumpre pena de 7 anos e 11 meses de prisão domiciliar em Brasília.

Cardozo blinda Graça Foster e diz que diretoria da Petrobras não muda

Investigação

Ministro da Justiça faz discurso em defesa da presidente da petrolífera e das apurações internas da estatal após procurador-geral prometer punição 'firme'

Laryssa Borges, de Brasília
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, esfrega o rosto ao lado do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, durante Seminário Internacional de Combate à Corrupção
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, esfrega o rosto ao lado do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, durante Seminário Internacional de Combate à Corrupção (Sérgio Lima/Folhapress)
Depois de o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ter feito um pedido público de demissão da cúpula da Petrobras, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, saiu nesta terça-feira em defesa da atual diretoria da estatal e disse que nem a presidente da companhia, Graça Foster, nem os atuais diretores da empresa deixarão seus cargos. De acordo com Cardozo, não há suspeitas nem indícios de qualquer envolvimento de Foster com o escândalo do petrolão. A mesma blindagem, porém, não será dada a integrantes de subsidiárias da estatal, como o presidente licenciado da Transpetro, Sergio Machado, suspeito de ter recebido propina em troca de favores empresariais.
Ao sair em defesa da companhia, Cardozo ainda prometeu para dentro de “poucos dias” a regulamentação de trechos da Lei Anticorrupção que tratam de acordos de leniência e da aplicação de multas a empresas.
“Afirmamos e reafirmamos que não existem quaisquer indícios ou suspeitas que recaem sobre a pessoa da atual presidente Graça Foster ou sobre os atuais diretores. Não existe nenhum indicador de irregularidade eventual que tenha sido praticada pelos atuais dirigentes. Não há razões objetivas para que sejam substituídos”, afirmou o ministro. Após o duro discurso do procurador-geral na Conferência Internacional de Combate à Corrupção, o ministro se encontrou com a presidente Dilma Rousseff, recebeu da Petrobras documentos para embasar a defesa da companhia e perguntou a Janot se havia suspeitas diretas contra a cúpula da petroleira.
 “O próprio procurador-geral diz que não está imputando qualquer culpa prévia a essas pessoas. A própria procuradoria-geral tem nos dito que não existe nenhuma suspeita em relação tanto à presidente Graça quanto aos senhores diretores”, completou. “Tanto a presidente Graça como os atuais diretores têm colaborado intensamente com as investigações. Tudo aquilo que pode ser feito por parte dessa diretora tem sido feito para que as investigações cheguem a bom termo”, disse o ministro.
A despeito de ter dado uma espécie de atestado de idoneidade à cúpula da petroleira, o chefe da pasta da Justiça informou que novas avaliações serão feitas se aparecem indícios de envolvimento de qualquer atual diretor da Petrobras em irregularidades. “Em relação ao futuro, pode haver [suspeita] contra qualquer pessoa do planeta, se os fatos aparecerem”, declarou.
Em defesa da presidente Graça Foster e dos demais diretores da estatal, Cardozo discursou sobre a importância de se preservar a honra de pessoas que não são suspeitas de ilícitos. “Não há nenhum suspeito. É injusto que se fale que exista algum fato imputado a eles. Não existe. E a honra das pessoas é algo sobre a qual jamais devemos tergiversar. Posso afirmar, por tudo aquilo que está em apuração, que não há suspeição sobre a presidente ou sobre os diretores da Petrobras que hoje conduzem a empresa”, disse.

Cardozo também listou medidas adotadas pela estatal para conter focos de corrupção e descartou a possibilidade de Graça Foster poder ser responsabilizada por uma suposta ausência de vigilância. “Não podemos aplicar a culpa in vigilando. Imaginar que seria possível a uma presidente ter conhecimento de tudo é ignorar o mundo empresarial. Em uma empresa com a dimensão da Petrobras imaginar que devesse a presidente Graça [saber de todas as irregularidades] é  injustiça cabal. Não se pode ser injusto com pessoa, especialmente com pessoas sérias que combatem a corrupção”, afirmou.
Entre as medidas em andamento na Petrobras, além de uma auditoria contínua feita pela consultoria PricewaterhouseCoopers, estão a criação da diretoria de compliance e de uma gerência de gestão corporativa de riscos empresariais e a contratação de dois escritórios, um brasileiro e um americano, especializados em investigação para analisar negócios decisórios da empresa. Uma empresa internacional de head hunter deverá fechar até sexta-feira o nome do primeiro diretor de compliance da companhia. Ele está sendo escolhido por seleção no mercado privado e terá mandato definido.