Estou sentada na frente da estilista do século XX, Coco Chanel, observando-a fazer a prova de um blazer. Suas mãos são firmes, mas, de repente, uma escorregadela e ela pica o ombro da modelo.
Estou sentada na frente da estilista do século XX, Coco Chanel, observando-a fazer a prova de um blazer. Suas mãos são firmes, mas, de repente, uma escorregadela e ela pica o ombro da modelo. Uma pequena gota de sangue aparece, mas nada é dito e Chanel continua no outro ombro. Ela corta e corta e corta, concentrada no perfeccionismo que sempre exige de si e dos outros.
Esse foi o início da minha noite com Coco.
Mais tarde, lá em cima, em seu imenso apartamento, nós nos sentamos num belíssimo sofá de pelica e o uísque é servido. A seguir, ela sugere um copo de vinho tinto antes do jantar e começamos a conversar. De perto, Chanel até demonstra uma certa animação e seus olhos são aguçados como os de um castor ocupado. E ela nunca para de trabalhar.
Chanel começa, como sempre, a reclamar do fato de os outros estilistas serem, em suas palavras, 'uma piada': Balenciaga não sabe cortar uma calça, Yves Saint Laurent não sabe cortar um paletó e por aí vai. Aí ela se vira para mim e diz que a minha jaqueta é horrível e que eu deveria mudar de alfaiate (era da Anderson & Sheppard). Agarra meu braço e o levanta para começar a apalpar a minha axila. Fiquei com medo de ganhar um hematoma.
'Você não entende', diz ela, me apertando. 'Um blazer bem feito tem que ficar justo no braço.' Só pensei na coitada da modelo, sangrando lá embaixo.
Chanel se esquece de mim para se dedicar a um dos objetos de sua (grande) irritação: a saia curta (ainda bem que eu estava de calça). 'Saia curta é muito errado', ela insiste. 'Vamos falar a verdade – o joelho é a parte mais feia do corpo.'
Eu pergunto então qual seria o comprimento ideal. Chanel se arruma no sofá e começa a bater na própria saia. Noto que suas pernas são até bem boas para uma senhora de 80 anos. 'Este é o comprimento certo – olha, ela sobe e desce de novo para cobrir o joelho.'
Uma nova rodada de uísque nos é oferecida, mais um copo de vinho tinto. 'Mulher desesperada usa saia curta', ela polemiza. 'Não é elegante e não cai bem. E vale para todas as idades. Tem muita mulher que quer parecer mais nova e usa sainha curta achando que rejuvenesce.'
CREDIT: WWD
A essa altura já me sinto meio zonza e só vou piorando conforme o jantar se estende indefinidamente e o vinho continua a circular. Começo a me preocupar com a minha dor de cabeça da manhã seguinte. Chanel deve ter lido minha mente porque me oferece um pequeno comprimido azul e garante que ele evita qualquer ressaca, por mais que eu beba.
A seguir ela se levanta e pergunta se eu gostaria de acompanhá-la ao Ritz. Como posso dizer não? Pegamos o elevador até seu quarto, observo enquanto ela se ajeita na cama e, só no último minuto, tira o chapéu Deauville (afinal, foi onde tudo começou). Dou-lhe um beijo na cabeça e saio.
Sempre me sinto meio reverente perto de gente famosa (menos estilistas egomaníacos) e respiro aliviada de finalmente ir para casa. (E, no dia seguinte, eu me sinto perfeitamente bem, sem nem sombra de ressaca, mas nunca descobri a mágica do comprimidinho azul.)
Levo aquela noite com Chanel na memória, apesar de fazer muito tempo, e nunca me esqueci de sua implicância com as saias curtas. Ao sair do 'schloss' da família, nos Alpes austríacos, para aproveitar o glamour de Paris, me hospedei num dos melhores hotéis do mundo, o fabuloso Le Bristol, parte da coleção Masterpiece (nome mais que apropriado, pois ele é realmente uma obra-prima) ‒ e só o que vejo à minha volta são mulheres de saia curta, expondo os joelhos medonhos. Chanel ficaria horrorizada como eu estou, mas temo que essa seja uma batalha perdida.
Poucos dias atrás, enquanto desfrutava de um almoço delicioso no Le Jardin Français, notei uma mulher alta e chamativa que, a princípio, não reconheci, mas que pediu a minha mesa. O maître respondeu, educadamente: 'Impossível, madame. É a mesa da condessa Esterhazy'.
Meine Gute! Eu a conhecia! Era a Rainha de Paris ‒ e, segundo muitos, a Rainha da Elegância, a também condessa Jacqueline de Ribes. O salão inteiro parou para olhar para ela a caminho de sua mesa (não é à toa que ela nasceu no Dia da Queda da Bastilha – há 83 anos). Eu também a observei e – que horror! – vi que estava usando (adivinhou) uma saia muito curta, além de um chapéu de pele, bota e óculos escuros. Ela me cumprimentou com a cabeça (nós, condessas, sempre reconhecemos a presença uma das outras) enquanto rumava majestosamente para a mesa.
Até ela, como todas nós, quer parecer mais jovem e usa saia curta. As desesperadas que viajam para Nova York, Londres, Milão e Paris para ver os desfiles a cada temporada tentam fazer o mesmo e ficam lá, sentadas na primeira fila, exibindo os joelhos ossudos.
Você pode achar tudo bem se até um ícone da moda como a Condessa de Ribes usa saia curta, mas eu acho que não – os joelhos são mesmo muito feios.
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