quinta-feira 19 2013

Assange aproveita palanque e questiona soberania do Brasil

WikiLeaks

'Será que a soberania brasileira vale algo?', disse fundador do WikiLeaks, antes de cogitar espionagem do governo federal e pedir asilo no país a colaboradora

Edoardo Ghirotto
Assange está isolado na embaixada de Quito em Londres desde 19 de junho
Assange está isolado na embaixada de Quito em Londres desde 19 de junho (Leon Neal / AFP)
A situação não podia ser mais propícia para Julian Assange mergulhar de cabeça no poço de contradições que fundou junto com o site de vazamentos WikiLeaks. Asilado na embaixada equatoriana em Londres, o hacker australiano participou nesta quarta-feira de uma videoconferência em um evento público em São Paulo. Bajulado inclusive pelo secretário municipal de Cultura e ex-ministro do governo Lula, Juca Ferreira, Assange se sentiu em casa para fazer o que mais gosta: atropelar a política externa de outros países. E com a pose de bom moço que lhe é peculiar, cogitou uma possível espionagem do governo brasileiro nos moldes americanos, além de insistir para que a presidente Dilma Rousseff conceda asilo político a uma de suas colaboradoras, que ajudou o ex-técnico de inteligência Edward Snowden a escapar de um aeroporto em Moscou.
O propósito inicial de Assange era anunciar o lançamento no Brasil do seu livro Cypherpunks: Liberdade e o Futuro da Internet, cujo nome deriva de "cifrar" (escrever em código) e do movimento cultural anárquico da década de 70. Mas a intenção descambou para o lado político quando o hacker praticamente abriu sua fala dizendo que o governo brasileiro deveria asilar Sarah Harrison, a assessora do WikiLeaks que esteve envolvida na negociação que selou a permanência de Snowden na Rússia. No embalo, Assange acusou os Estados Unidos de “roubarem” segredos do Brasil através da Agência de Segurança Nacional (NSA, em inglês). “Toda a estrutura de comunicação brasileira foi roubada pelos EUA. Será que a soberania brasileira vale alguma coisa?”
A resposta ficou evidente no decorrer do discurso. Palpiteiro sobre assuntos do governo brasileiro, Assange parabenizou Dilma por não demonstrar fraqueza diante do convite de Barack Obama para uma viagem oficial aos Estados Unidos. A presidente adiou a ida a Washington após tomar consciência de que os americanos teriam espionado o Brasil, ela própria e a Petrobras. “Dilma tinha de cancelar a viagem. Ela viu que o povo brasileiro e pessoas importantes do governo não tolerariam uma inação. Ela seria vista como fraca se não fizesse algo, e sua obrigação é proteger o povo brasileiro.”
Espionagem brasileira – E os palpites do australiano a respeito da política nacional não pararam por ai. Assange chegou até mesmo a sugerir que, por trás do plano da presidente Dilma de obrigar grandes empresas de internet a hospedar dados em solo nacional, possa estar o desejo do governo brasileiro de copiar os métodos de espionagem americanos. Segundo o hacker, tudo não passaria de uma tática para que o Brasil passe a espionar seus próprios cidadãos. “Não vejo isso como um ganho, pois o governo brasileiro também pode te espionar e até mandar a polícia na sua casa”, afirmou. E como não há limites para as teorias conspiratórias de Assange, ele foi além - e alertou que a espionagem americana seria uma importante arma para empresas estrangeiras usufruírem de novas oportunidades na Copa do Mundo. “As multinacionais entram para investir na América Latina enquanto os Estados Unidos têm acesso às comunicações”, limitou-se a dizer, sem apresentar nenhuma prova concreta sobre a denúncia. 
Assange se despediu do público com um sorriso no canto da boca e um novo pedido de asilo para a colaboradora Sarah Harrison. Antes, porém, o hacker falou sobre as perspectivas para o futuro e como encara a embaixada equatoriana. “Em que mundo vou entrar quando sair daqui? Há coisas muito mais importantes que minha liberdade. A embaixada é inviolável, eu não posso ser preso nem pela polícia britânica nem pela polícia equatoriana. Este é o lugar mais seguro do mundo para mim”, disse. O asilo, contudo, só não salva a popularidade de Assange. Prova disso foram os irrisórios 0,62% de votos que o partido político WikiLeaks recebeu durante a sua tentativa de se eleger senador na Austrália.

Nenhum comentário: