quinta-feira 18 2013

Protestos no Rio descambam para vandalismo profissional

Rio de Janeiro

Página no Facebook elogia destruição de bancos e comércio e orienta vândalos sobre como atacar policiais. Governador convoca reunião de emergência

João Marcello Erthal
Página no Facebook do grupo de ativismo virtual Anonymous Rio numera alvos: vandalismo planejado
Página no Facebook do grupo de ativismo virtual Anonymous Rio numera alvos: vandalismo planejado (Reprodução)
Depois da quebradeira na Assembleia Legislativa, da pancadaria na Avenida Presidente Vargas e das repetidas manifestações com tumultos no Palácio Guanabara e no Leblon, os protestos no Rio de Janeiro assumem características de atos bem mais planejados do que as reuniões improvisadas a partir de convites no Facebook. Definitivamente, não cabe mais o rótulo de “protesto pacífico com atos isolados de vandalismo”. Longe da polícia, longe da casa do governador Sérgio Cabral, o Brasil acompanhou pela TV na noite desta quarta-feira e início da madrugada de quinta uma maratona de destruição pelas ruas do Leblon e de Ipanema, com ataques injustificáveis, como a pequenas lojas. 
Para discutir a escalada do vandalismo, o governador Sérgio Cabral convocou uma reunião de emergência para as 8 horas desta quinta no Palácio Guanabara. Além do secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, devem participar do encontro o comandante da Polícia Militar, Coronel Erir da Costa Filho, a chefe da Polícia Civil, Martha Rocha, e os secretários da Casa Civil, Regis Fichtner, e de Governo, Wilson Carlos Carvalho. Às 10h30 vai ser apresentado, em uma coletiva com representantes do Ministério da Justiça, do Comando Militar do Leste e da Jornada Mundial da Juventude, o esquema de segurança para o papa Francisco, que chega à cidade na próxima segunda-feira. 
Os conflitos da noite passada terminaram com 15 pessoas detidas, cinco policiais feridos – um deles uma PM, ferida por um coquetel molotov – e um prejuízo ainda a ser calculado. Não é algo desordenado, nem sem comando. A página do grupo Anonymous Rio no Facebook publicou, enquanto os ataques ainda eram transmitidos ao vivo pela televisão, a seguinte “análise” do desfecho da noite:
“Alvos escolhidos a dedo.
Agência do Itaú: patrocinadora oficial da Copa do Mundo.
Agência do Bradesco: financiador de Belo Monte.
Loja da TOULON: roupas mega faturadas, com suas costureiras exploradas, que teve suas roupas já distribuídas para a população de rua.
Placas publicitárias: incentivadores do consumismo desenfreado e inconsequente, mecanismo de manutenção do sistema excludente global.
Talvez muita coisa tenha que ser observada um pouco mais abaixo da superfície. O dito 'vandalismo' é bem mais profundo em significado do que se diz por ai.”


Ou seja, há um grupo que considera que, ao destruir uma loja, deu um recado sobre o consumismo, sobre o “sistema econômico” e sobre exclusão social. O histórico de violência nos protestos começa, sem dúvida, tendo como combustível as ações exageradas da polícia. Mas a truculência policial não abarca mais todas as explicações para o que se vê nos protestos do Rio de Janeiro.
A manifestação em frente à rua do governador Sérgio Cabral, no Leblon, reuniu cerca de 2.000 pessoas no fim da tarde. Tudo parecia um ajuntamento estudantil, com faixas e palavras de ordem, até que alguns grupos menores, de rostos cobertos, começou a perambular, em busca de oportunidades para desestabilizar a situação. Depois de alguns ataques à polícia, houve lançamento de bombas de gás lacrimogêneo pelo Batalhão de Choque. A iluminação foi cortada, e instalou-se o caos. Até o início da madrugada, baderneiros em grupos com paus e pedras varriam Leblon e Ipanema em busca de tudo que fosse possível quebrar ou furtar.
Atos como o da noite desta quarta-feira têm na origem uma organização que pretende chamar atenção exatamente por seu lado mais reprovável, e de maior repercussão: destruição, bombas caseiras, enfrentamento e imagens que – talvez não por acaso – afastam o cidadão de bem dos protestos. As cenas colam cada vez mais no movimento a imagem do banditismo. 
Manifestar-se é um direito. O problema é que, como mostram os protestos realizados até agora, não é mais possível garantir que haverá uma reunião pacífica até o final. Pior: é ingênuo acreditar que algum ajuntamento, ainda que pacífico como o das centrais sindicais, possa se manter com essa ‘pureza’. No caso de agora, o que se viu na madrugada não tem qualquer relação com o motivo inicial da convocação: ‘derrubar’ o governador do estado, algo que, por si só, denota intenções nada democráticas. Afinal, trata-se de um governante eleito, com votação expressiva, ainda que haja insatisfação crescente com o que se dá no Executivo estadual.

Pedras contra a polícia – A mesma página que elogia o vandalismo publicava, mais cedo, recomendações como a de usar “pedras portuguesas à vontade” contra a polícia. O alerta do grupo era sobre a infiltração de policiais militares para se passar por baderneiros no grupo de “ativistas”. A lógica muito peculiar do grupo institui o seguinte: uma vez que um falso baderneiro atue, tornam-se todos baderneiros de verdade e passa a ser legítimo atirar pedras, causar prejuízo, ferir policiais e colocar em risco a vida de quem mais estiver tentando se manifestar pacificamente.
Tudo indica que vai levar algum tempo para o Rio ter novamente algum protesto pacífico. A chance de a baderna não se repetir durante a Jornada Mundial da Juventude, que trará o papa Francisco ao Brasil, é mínima.

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