Manipulando a manipulação
É claro que interpretar tais declarações como uma senha para a queda brusca nas taxas futuras de juros parece apenas natural. Fica assim exposta a riqueza cultural do verbo “manipular”, nossaPalavra da Semana. Como ocorre com bastante frequência, quem se queixa de ter sido manipulado quer dizer apenas que se arrependeu de falar o que falou. É nesse ponto que a “manipulação” passa a ficar a serviço da… manipulação, pois é.
Mas que história é essa de manipulação? Tudo começou com o termo latino manipulus, “punhado”, que era empregado para designar uma quantidade incerta de coisas variadas, mas tinha sentido militar rigoroso como “companhia de 100 (e mais tarde 200) soldados”. Adotado no fim do século XV em francês como manipule, tinha a acepção farmacêutica de “punhado de ervas, grãos etc. usado na composição de remédios”. O espírito desse sentido permanece bem vivo nas farmácias de manipulação.
O verbo francês manipuler (“manejar substâncias em laboratório”), de 1765, pode ter brotado diretamente de manipule, embora o Trésor de la Langue Française o derive do verbo do latim medieval manipulare, de acepção inteiramente distinta (“conduzir pela mão”). Seja como for, a palavra ainda não tinha então o sentido empregado por Dilma, que o Houaiss formula assim: “influenciar (indivíduo, coletividade), conseguindo que se comporte de uma dada maneira, para servir a interesses outros que não os seus próprios; provocar alteração em; tornar falso; adulterar, falsear”.
Esse lado, digamos, maligno não estava presente no verbo manipular quando, vindo do francês, ele foi registrado pela primeira vez em português, em 1836, pelo dicionarista Francisco Solano Constâncio. Mas não deve ter demorado a surgir. Poucos anos depois, em 1842, já circulava em francês a acepção de “arranjar por meios sutis ou condenáveis”.
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