Mensalão
Procuradoria-geral da República defende que os condenados no mensalão sejam presos imediatamente; maioria do STF diz que pedido é inconstitucional
Laryssa Borges, de Brasília
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pediu a prisão imediata de todos os réus condenados (Cristiano Mariz)
Embora o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, tenha pedido a prisão imediata de todos os réus condenados no processo do mensalão, o Supremo Tribunal Federal (STF) não pretende acatar os apelos do Ministério Público. Sob o argumento de que ainda há possibilidade de recursos, apesar de poucos com efeitos potencialmente modificadores, os ministros derrubarão a tese de que os mensaleiros precisam ser presos de pronto com referências aos princípios da presunção da inocência e da dignidade humana.
Deve se formar maioria entre os ministros do STF também para sepultar as pretensões do relator do mensalão, Joaquim Barbosa, de pedir a prisão dos condenados assim que for publicado o acórdão do julgamento, provavelmente no início do próximo ano. Os ministros Celso de Mello, Carlos Ayres Britto, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello têm posição clara contra a possibilidade de execução imediata das prisões quando o réu ainda tem direito de recorrer da sentença. A ministra Cármen Lúcia, que já defendeu em debates no Supremo a possibilidade de cumprimento de penas de reclusão mesmo quando ainda haja recursos, hoje também engrossa a lista daqueles que não admitem o pedido do Ministério Público.
A posição atual do STF foi firmada em 2009, quando, após um caso polêmico ter chegado à primeira turma do tribunal, os ministros decidirem que caberia a todo o colegiado, em plenário, verificar se era ou não constitucional mandar condenados imediatamente para a prisão. No veredicto, que beneficiou um produtor de leite condenado por tentativa de homicídio, os ministros foram duros contra prisões de pronto de réus que ainda podem recorrer.
“Nas democracias, mesmo os criminosos são sujeitos de direitos. São pessoas inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade”, sacramentou o STF no acórdão da decisão, que até hoje serve de base à corte. Os magistrados se valeram ainda de uma máxima do ex-ministro Evandro Lins para acabar com a possibilidade das prisões imediatas: “Na realidade, quem está desejando punir demais, no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal e se equipara um pouco ao próprio delinquente”.
Da atual composição do STF, o ministro Joaquim Barbosa, que já proferiu 96 sentenças condenatórias no mensalão, endossa o argumento do procurador-geral e defende a possibilidade de prisões mesmo quando ainda cabem recursos. No julgamento modelo de 2009, chegou a afirmar ser “inigualável” no Brasil o leque de opções da defesa de condenados para evitar que as sentenças sejam cumpridas. Para Barbosa, o Supremo tem condições de tomar uma “decisão política” que permita a execução das penas de prisão mesmo sem o julgamento dos recursos, uma alternativa que, segundo ele, garantiria que processos não recebessem a atual enxurrada de pedidos procrastinatórios.
“Não existe nenhum país no mundo que ofereça tamanha proteção. Se resolvermos politicamente – porque esta é uma decisão política que cabe à Corte Suprema decidir – que o réu só deve cumprir a pena esgotados todos os recursos, nós temos que assumir politicamente o ônus dessa decisão”, disse ele ao defender, no julgamento de 2009, a possibilidade de execução imediata das penas.
Atualmente, a população carcerária do Brasil é formada por cerca de 200.000 presos, cujos casos ainda não foram julgados em definitivo.
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