sexta-feira 31 2014

Vinhos do Vale do Loire, expressivos, mas subestimados

Por Eric Asimov- The New York Times News Service/Syndicate

Imagine uma extensão relativamente pequena cultivada basicamente por uma miríade de vinicultores, muitos dos quais produzem vinho há gerações, em solos bastante diversificados. Seus tintos geralmente são feitos a partir de uma uva só e, por isso, comparar vinhos de tamanha variedade de terroirs se torna fascinante.




Vinhos do Vale do Loire, expressivos, mas subestimados
Imagine uma extensão relativamente pequena cultivada basicamente por uma miríade de vinicultores, muitos dos quais produzem vinho há gerações, em solos bastante diversificados. Seus tintos geralmente são feitos a partir de uma uva só e, por isso, comparar vinhos de tamanha variedade de terroirs se torna fascinante.
Essa área tem muito em comum com a Borgonha, onde os vinhos e seus produtores capturam o imaginário de apreciadores da bebida do mundo inteiro ‒ e justamente por isso são bem mais caros; no caso dessa outra região, os vinhos não são muito procurados. Os preços são razoáveis e, dada a qualidade excepcional de muitos deles, às vezes representam verdadeiras pechinchas.
Esse é o dilema, ou a oportunidade, apresentada pelo Vale do Loire, principalmente Touraine, de onde são as denominações Chinon e Bourgueil. Esses vinhos são sempre muito elogiados pelos críticos, que os consideram maravilhosamente expressivos, mas subestimados, exatamente como os rieslings era há quinze ou vinte anos. Mais cedo ou mais tarde o público vai descobri-los, mas, enquanto isso não acontece, oferecem uma chance, a preços razoáveis, de se desfrutar de uma bebida agradável e intelectualmente estimulante, o que às vezes acontece na mesma garrafa.
E porque podem ser tão bons, o painel do New York Times gosta de dar uma conferida nos tintos de vez em quando. Nossa última 'inspeção' já faz quatro anos, por isso recentemente voltamos lá para degustar vinte garrafas da Chinon e Bourgueil, todas de safras mais recentes. Ao meu lado, Florence Fabricant, Michael Madrigale, sommelier chefe do Bar Boulud e Boulud Sud, e Pascaline Lepeltier, diretora de vinho do Rouge Tomate e que, por coincidência, é do Vale do Loire.
Esses dois últimos dizem vira e mexe encontrar certa relutância pública na aceitação dos vinhos. 'É preciso estipular um preço baixo para que o público lhes dê uma chance', explica Michael. E Pascaline acrescenta: 'Você tem que vender esses vinhos garrafa por garrafa.'
Por que a hesitação? Primeiro porque, apesar das semelhanças estruturais com a Borgonha, as características mais óbvias no copo são incrivelmente diferentes. Esses são vinhos feitos da uva cabernet franc que, em contraste com o charme inerente da pinot noir borgonhesa, parece mais austera e reservada ‒ e enquanto a segunda seduz com seus aromas e sabores doces e frutados, a primeira tem uma qualidade herbal peculiar que faz muitos norte-americanos, acostumados a um setor doméstico que teme o mais remoto sinal de 'verde' em seus vinhos, interpretá-la como não madura e proibitiva.
Embora o Vale do Loire seja uma região vinícola antiga, é nova em muitos aspectos. Aconteceram melhorias tremendas na última geração, tanto nos vinhedos como nas adegas. Sem dúvida era muito mais comum, há vinte anos, se deparar com garrafas um pouquinho verdes demais ou produzidas com muitas suspeitas.
Na época, poucos importadores dos EUA prestavam atenção ao Touraine, e menos ainda os que estavam dispostos a procurar ali o melhor vinho. Agora, eles vão até lá já apostando em uma seleção de qualidade superior que os fãs conhecem bem. São vinhos com um sabor muito mais acentuado da fruta madura e mineralidade, além do toque de ervas, bem diferente do gosto explícito de pimentão verde de antigamente.
O Vale do Loire também se tornou referência na vanguarda da bebida, adotando técnicas minimalistas para produzir vinhos naturais que, às vezes, são um sucesso brilhante; outras, falham miseravelmente, mas quase sempre fascinam. Seu impacto não pode ser subestimado, pois influenciam muitos produtores populares a trabalhar com mais ousadia e mais cuidado, passando a depender menos da viticultura química e da produção tecnológica.
Nossa degustação incluiu rótulos principalmente da safra de 2011, considerada não tão bem-sucedida, e da de 2010, um pouquinho melhor. Também experimentamos alguns de 2009 e da pequena colheita de 2012. Eles representam uma mistura de terroirs, incluindo solos aluviais que tendem a produzir exemplares mais leves e fáceis de beber; colinas de calcário, giz e argila, de onde saem os vinhos mais complexos, estruturados e que envelhecem melhor e os predominantemente argilosos, que produzem vinhos que refletem os dois estilos. A grande surpresa, pelo menos para mim, foi o fato de termos treze garrafas de Chinon e sete de Bourgueil, e cinco de cada entrarem para a nossa seleção dos dez melhores.
O melhor foi o La Croix Boissée 2011, vinho de ponta da linha da Bernard Baudry, um produtor favorito. É um vinho excelente, não importa o ano. E por ser um 2011, parece mais imediatamente acessível que o normal, embora gracioso e estruturado o suficiente para melhorar nos próximos anos, mesmo não sendo um dos envelhecidos da Baudry.
Por outro lado, nosso número 2, o La Varenne Tradition 2011 de Chinon, se mostrou muito mais simples, feito para ser bebido cedo, já exibindo uma gama de sabores terrosos. A US$18, também foi a maior pechincha. A seguir veio o delicioso Bourgueil Chatrois 2010 da Bertrand Galbrun.
O número 4 foi outro vinho com potencial de envelhecimento, o Bourgueil Les Perrières 2009 da Catherine & Pierre Breton, maravilhosamente aromático e com sabores frutados complexos. Outros destaques incluem o Bourgueil La Coudraye 2010 da Yannick Amirault, terroso e cheio de bossa; o perfumado e tanificado Chinon Bonnaventure 2010 da Château de Coulaine e o convidativo Chinon Clos de la Dioterie 2010 da Charles Joguet. Por coincidência, Joguet era um dos melhores domínios de Touraine disponíveis nos EUA depois que a Kermit Lynch começou a importar seus vinhos, no final dos anos 70. Depois que Joguet se aposentou, em 1997, os vinhos se tornaram muito irregulares, mas agora parece que estão em ascensão.
Chinon e Bourgueil não são, de forma nenhuma, os únicos tintos do Loire, assim como a cabernet franc não é a única uva. A Saumur-Champigny, em Anjou, é capaz de produzir excelentes cabernet francs, e também é possível encontrar maravilhas feitas de cabernet sauvignon, pineau d'Aunis, gamay, grolleau e côt, que é como a malbec é conhecida ali. No entanto, é melhor não se basear só em minha opinião, não. Explore os rótulos sozinho enquanto os preços ainda estão bons.
Relatório da degustação
O que as estrelas significam: a avaliação, até quatro estrelas, reflete a reação do painel aos vinhos, que foram saboreados com os rótulos cobertos. A seleção feita geralmente é encontrada nas boas lojas do ramo, em restaurantes e pela internet. Os preços são os praticados na região de Nova York. Coordenador da degustação: Bernard Kirsch.
Três estrelas
Bernard Baudry Chinon La Croix Boissée 2011 US$42
Leve e fresco, mas ao mesmo tempo denso, com sabores persistentes de fruta madura, ervas e minerais; pode se beneficiar do envelhecimento.
Melhores opções custo/benefício
Três estrelas
La Varenne Chinon Tradition 2011 US$18
Fácil de beber, com sabores de fruta terrosa, ervas e minerais.
Três estrelas
Bertrand Galbrun Bourgueil Chatrois 2010 US$20
Tende a ser mais contido; textura rica, mas não pesada, com sabores salgados de fruta escura.
Duas estrelas e meia
Catherine & Pierre Breton Bourgueil Les Perrières 2009 US$44
Maravilhosamente aromático, com sabores de fruta madura e especiarias.
Duas estrelas e meia
Yannick Amirault Bourgueil La Coudraye 2010 US$22
Denso e terroso, com um aroma cheio de bossa e sabor picante.
Duas estrelas e meia
Château de Coulaine Chinon Bonnaventure 2010 US$20
Perfume de fruta vermelha e flores, mas excesso de tanino.
Duas estrelas e meia
Charles Joguet Chinon Clos de la Dioterie 2010 US$43
Direto e aberto, com aromas de fruta madura, alcaçuz e carvalho.
Duas estrelas e meia
Marc Brédif Chinon 2011 US$22
Sólido e sem floreios, com sabor de fruta terrosa.
Duas estrelas
Domaine Guion Bourgueil Cuvée Domaine 2011 US$15
Encorpado e denso, com sabor picante de frutas e ervas.
Duas estrelas
Domaine de la Chanteleuserie Bourgueil Cuvée Alouettes 2012 US$15
Leve e fácil, com sabor suave e defumado de frutas.
The New York Times News Service/Syndicate – Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.

Nenhum comentário: