Genética
Análises genéticas mostram que todas as espécies de cachorros ao redor do mundo surgiram a partir da domesticação de lobos europeus
Segundo os cientistas, os cachorros surgiram a partir de lobos domesticados, que ajudavam as antigas tribos de caçadores-coletores em suas caçadas. Com o passar das gerações, eles foram se tornando cada vez mais dóceis(Thinkstock)
Os lobos são animais selvagens e perigosos. Caçadores exímios, eles ocupam o topo da pirâmide alimentar das regiões onde habitam e são extremamente arredios no contato com os seres humanos. Ainda assim, eles são os ancestrais de todas as espécies de cachorros que existem ao redor do mundo, animais muito mais dóceis e brincalhões, tão adaptados à convivência com os seres humanos que dividem com esses suas cidades, casas e famílias. Uma nova pesquisa publicada nesta quinta-feira na revista Science mostra que essa transição entre lobo selvagem e cão domesticado aconteceu na Europa há, no mínimo, 18 800 anos.
CONHEÇA A PESQUISA
Título original: Complete Mitochondrial Genomes of Ancient Canids Suggest a European Origin of Domestic Dogs
Onde foi divulgada: periódico Science
Quem fez: Olaf Thalmann, entre outros pesquisadores
Instituição: Universidade de Turku, na Finlândia
Dados de amostragem: Análises genéticas de dezoito fósseis pré-históricos e de 148 cães, lobos e coiotes modernos
Resultado: Os pesquisadores descobriram que os cães modernos descendiam de lobos que viveram na Europa há milhares de anos
Título original: Complete Mitochondrial Genomes of Ancient Canids Suggest a European Origin of Domestic Dogs
Onde foi divulgada: periódico Science
Quem fez: Olaf Thalmann, entre outros pesquisadores
Instituição: Universidade de Turku, na Finlândia
Dados de amostragem: Análises genéticas de dezoito fósseis pré-históricos e de 148 cães, lobos e coiotes modernos
Resultado: Os pesquisadores descobriram que os cães modernos descendiam de lobos que viveram na Europa há milhares de anos
Os cães são os animais domesticados mais bem adaptados à convivência direta com os seres humanos — a ponto de se tornarem conhecidos como os melhores amigos do homem. Os cientistas sugerem que essa afinidade comportamental acontece por causa da ancestral amizade entre as duas espécies.
Durante os milhares de anos de convivência, os seres humanos foram selecionando os cães mais dóceis e brincalhões, criando uma espécie extremamente afeita à vida doméstica (em comparação, os gatos foram domesticados há cerca de 10 000 anos). Até hoje, no entanto, os cientistas ainda discutem o local e a data exatos nos quais os lobos deixaram de ser inimigos e competidores do homem e viraram parte da família.
Estudos anteriores feitos a partir da análise genética de diversas espécies de cães modernos ao redor do mundo sugeriam que os animais descendiam de lobos que viviam no Oriente Médio e no Oeste Asiático. Os fósseis mais antigos de cachorros, no entanto, foram encontrados no oeste da Europa e na Sibéria, datando de entre 15 000 e 36 000 atrás. Enquanto isso, os registros mais antigos de cães no Oriente Médio ou na China não passam de 13 000 atrás.
Ossada de cão encontrada na Bélgica datando de cerca de 26 000 anos atrás
Lobos e cães — Para solucionar essa aparente contradição, os pesquisadores responsáveis pelo atual estudo criaram uma espécie de mistura das duas metodologias. Eles compararam o DNA de espécies modernas de cães e lobos com o encontrado nos fósseis antigos, criando uma árvore genealógica das raças de canídeos espalhados pelo mundo.
Assim, os pesquisadores compararam o genoma extraído de 18 fósseis pré-históricos, vindos da Europa, Ásia e América, com o encontrado nas células de 49 lobos, oitenta cães e quatro coiotes modernos. Para realizar essa análise, eles estudaram o DNA mitocondrial, que não é encontrado no núcleo das células, mas nas mitocôndrias, e é transmitido diretamente das mães para os filhos. Por não ser misturado ao DNA paterno, sua análise é o melhor modo de traçar longas cadeias de hereditariedade.
Os cientistas descobriram que as sequências genéticas de todas as espécies de cães modernos se assemelhavam à dos fósseis pré-históricos europeus e à dos lobos que vivem atualmente na região. Já os lobos de outras partes do mundo apresentavam um parentesco muito mais distante dos cães, sugerindo uma origem europeia para o melhor amigo do homem. “Isso coloca os registros genéticos de acordo com os registros arqueológicos, uma vez que a Europa é o local onde os fósseis mais antigos de cães são encontrados”, diz Robert Wayne, pesquisador da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, que participou do estudo.
Os pesquisadores afirmam que os lobos se aproximaram dos caçadores humanos em busca das carcaças que eles deixavam para trás
Amizade de caçadores — Os fósseis de lobos e cães antigos com que os animais atuais têm maior parentesco datam de 18 800 a 32 100 anos atrás — eles são justamente os mais antigos do mundo. Segundo os pesquisadores, nessa época, a paisagem europeia era ocupada por grupos humanos de caçadores-coletores, que se aventuravam pelo continente em busca de comida.
O estudo contradiz teorias antigas, que sugeriam que os cães haviam sido domesticados a partir do advento da agricultura. Segundo essa ideia, os lobos deveriam ter sido atraídos para perto das vilas humanas pela abundância de comida vinda das colheitas, onde começariam sua convivência com os seres humanos.
Os novos dados, ao contrário, sugerem que teriam sido os caçadores-coletores os responsáveis por transformar os lobos em cães. Os cientistas sugerem que os animais selvagens teriam sido atraídos pelas carcaças que os caçadores humanos deixavam para trás. Com o tempo, eles começariam a ajudar nessas mesmas caçadas e a proteger o grupo de outros predadores, dando início ao processo de domesticação.
Companheiros de viagem — A partir daí, os cães teriam sido adotados definitivamente pelas tribos humanas, percorrendo com elas suas rotas migratórias e sendo levados a diferentes regiões pelas rotas comerciais. Os cães teriam acompanhado os humanos até em sua viagem para a América. Segundo o estudo, três fósseis de cachorros que viveram no continente antes da chegada de Colombo — de 1 000 e 8 500 anos atrás — também apresentavam parentesco com os fósseis europeus mais antigos.
Com o passar dos milênios, essa amizade se estreitou ainda mais, o que levou à criação das inúmeras raças de cães que existem ao redor do mundo. Diversas delas são tradicionalmente ligadas a algumas regiões do planeta, mas todas descendem de lobos europeus.
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