sábado 03 2013

Amar é nunca saber do dia seguinte

O homem só tem duas obrigações na vida, quer dizer, três:
1)Amar e zelar pela mãe;
2) ir para a guerra se for preciso e,
3) principalmente, tornar um momento único o amor pelas mulheres que o encante, porque esta hora é mais religiosa, a mais bonita.
Donde dou, qual um Tim Maia do amor, motivo, para justificar, solamente, o terceiro tópico desta crônica, a devoção pela nega, não nego, sigo, obsessivo sujeito, prático, por supuesto, sincero até o amarelado-brega-final do crepúsculo.
Bora nessa.
Episódio de hoje:
No que concerne ao olho masculino nas visões matutinas.
Vixe. Acordar diante de uma mulher, até mesmo quando você não a ama ainda, é a acontecência. Talvez não exista nada mais bonito. Talvez nem o ato do encorajado homem entrar para dentro do dia com sua calça pega-marreco tão curta para o tamanho da passada existencial e inevitável.
Quando ela acorda, ela, só ela, aquelas marquinhas no corpo feitas pela noite, atrito de peixes que passeiam nos subterrâneos dos lençóis de modo a marcá-lá  como se ela vivesse as 20 mil léguas submarinas do viejo Verne.
Nada como uma mulher quando acorda.
Ela acorda, eu morro, petite mort, como no gozo dos franceses. Vá entender gozar como morte. Pior é que eu entendo.
Nada mais bonito do que uma mulher quando dorme e nada mais extraordinário quando uma mulher quando acorda.
Os primeiros sinais… Uma mãozinha que arrisca o anestesiado esticamento… Uns incompreensíveis dizeres ainda do sonho, como se blasfemasse contra tudo e contra todos uns restos de filmes de Buñuel, o cara do obscuro objeto do desejo.
Donde repito: os sonhos das belas mulheres são restos de filmes não usados pelos melhores cineastas mortos.
Ela acorda, cabelos feitos algas doidas, o seu incômodo mais bonito; algum tédio diante da reabertura do mundo chato, ela se espreguiça, ossinhos que estalam sob a réstia do sol do mundo sério que atravessa a cortina, os barulhos do mundo, os mascates, o tiro no coco de Getúlio que ouvimos a cada manhã no Catete.
Agora ouço o barulho do mijinho dela, música ao longe aqui do quarto. Paudurescência da aurora; ensaio um gozo-memória, nostalgia precoce, como se a danada tivesse ido embora num teletransporte de fio terra; ela volta ainda mais manhosa, quase um gato a reinventar botes câmera lenta num sashimi da véspera.
Ella Fitzerald, uma das peixas do seu aquário, está mais viva do que nunca.
O pau toca a sua bundinha sem a pressa da foda, quase como fossem feitos um para o outro e tivessem todo o tempo do mundo. As almas já se entendem, os corpos quase, ela pensa “qualé a desse cara?”.
Tudo uma coisa assim Manuel Bandeira, de quem roubo esse dizer todo da madruga.
Arriamos, o cansaço matando lindamente os interesses imediatos. O estranhamento da manhã talvez não vos interesse.  Amar é nunca saber do dia seguinte.
http://xicosa.blogfolha.uol.com.br/2013/07/29/amar-e-nunca-saber-do-dia-seguinte/

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