Rio de Janeiro
Como o governador do Rio se tornou o alvo principal dos manifestantes, um mês depois de iniciados os protestos e com passeatas esvaziadas no resto do país
João Marcello Erthal e Cecília Ritto
Governador Sérgio Cabral é o mais atacado nos protestos do Rio de Janeiro (Marcelo Fonseca/Folhapress)
Diante do crescimento dos protestos, o governador acusou uma “antecipação de campanha” nociva ao Rio de Janeiro. O primeiro a levantar bandeiras para 2014, no entanto, foi o próprio PMDB, com o prefeito reeleito Eduardo Paes anunciando Pezão como pré-candidato já no discurso de comemoração ao resultado das urnas em 2012
Passado um mês do início dos protestos pela redução das passagens de ônibus, o Rio de Janeiro mantém, no eixo entre o Leblon e o Palácio Guanabara, um foco permanente de manifestações. Os endereços de residência e trabalho do governador Sérgio Cabral são os pontos de encontro de grupos que pedem desde o cancelamento da Copa do Mundo de 2014 até a suspensão das concessões de linhas de ônibus na cidade – dois assuntos fora da alçada de decisão do Executivo do estado. O desfiladeiro da popularidade do peemedebista reeleito em primeiro turno em 2010, com a maior vantagem já obtida em uma eleição para o governo (66%), começou a ser cavado ainda em 2011, quando um acidente de helicóptero expôs a proximidade com o empreiteiro Fernando Cavendish, dono da Delta e detentor de contratos milionários com o governo. Menos de um ano depois, o mesmo empresário apareceu em fotos de uma viagem a Paris ao lado do governador e seu primeiro escalão, no episódio que ficou conhecido como o escândalo dos guardanapos. Desde então, a visibilidade dos grandes eventos no Rio, palco da final da Copa das Confederações, e as críticas à atuação da Polícia Militar aumentaram o abismo entre o Guanabara e a rua – separados atualmente por duas fileiras de alambrados.
“O mandato do governador do Rio se fragilizou com a exposição de questões éticas e morais. E a pauta das ruas passa justamente por essas duas questões. Cabral encarnou isso e tornou-se o principal alvo dos manifestantes”, explica o sociólogo Paulo Baía, da UFRJ, que estuda há seis anos demandas por reconhecimento, direito e respeito que parte de ações nas ruas.
Baía aponta a ausência do governador como uma falha na estratégia adotada por Cabral para lidar com os protestos. “Nos outros estados, governadores e prefeitos foram rápidos em tomar algum tipo de medida para oferecer algum tipo de resposta. A Câmara, o Senado e a Presidência foram pelo mesmo caminho. Cabral não, e acabou perdendo base no setor que mais o apoiava, a classe média mais abastada”, analisa. Cabral optou por ficar fora de um momento decisivo da reação aos protestos. Apesar de escalado para anunciar, ao lado do prefeito Eduardo Paes, a redução nas tarifas de transporte interestadual, preferiu não aparecer, deixando para o afilhado político o anúncio. Rompeu, assim, o combinado entre os governantes do Rio e de São Paulo, onde o prefeito petista Fernando Haddad comunicou o recuo no reajuste ao lado do governador Geraldo Alckmin.
Cabral não foi o único com dificuldade de entender o grito das ruas. Mas algumas declarações infelizes indicam um descompasso com o tom dos protestos. Quando vieram à tona as viagens diárias do governador no helicóptero do estado, usado também para levar família, empregados e o cachorro Juquinha para os fins de semana em Mangaratiba, ele se defendeu alegando não ser o único. “Não sou o primeiro a fazer isso no Brasil. Outros fazem também, e faço de acordo com o cargo que eu ocupo. Não é nenhuma estripulia”, afirmou.
Naquele momento, como agora, os manifestantes interpelaram os governantes não só pelo que consideram ilegal, mas pelos abusos que parecem ‘acobertados’ pela legalidade. “No primeiro mandato, as notícias sobre Cabral eram positivas. E ele tem mérito: trouxe de volta a autoestima do estado. No segundo mandato, no entanto, lutas políticas fizeram vazar questões antiéticas, com a exposição de uma simbiose entre as esferas pública e privada”, diz Baía.
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