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Secretário do Tesouro deve permanecer no próximo governo da presidente com poder ainda maior: será a ponte entre o Palácio do Planalto e o Ministério da Fazenda
Ana Clara Costa
Arno Augustin, secretário do Tesouro (Rodrigo Pozzebom/ABr/VEJA)
É sabido que Dilma Rousseff é severa com seus subordinados. Os que melhor se adaptam ao seu estilo de gestão são aqueles que ou se curvam às suas ideias, ou compartilham delas. O secretário do Tesouro Nacional Arno Augustin faz ambas as coisas. Como na célebre animação Meu Malvado Favorito, toda vez que Dilma trama algo na economia, pode contar com Arno: ele é o seu 'minion' perfeito.
Arno guarda as chaves do Tesouro Nacional desde 2007. No governo e, sobretudo, fora dele, as preces são para que sua temporada na administração federal termine este ano. Contudo, o caminho será inverso. O secretário deverá ganhar mais poder. Dilma o quer mais perto e, por isso, deve “promovê-lo” a assessor especial, com direito a sala no Palácio do Planalto. Uma promoção e tanto para um homem que é malquisto não só por parte dos técnicos de sua própria secretaria, como também por políticos, empresários e pela alta cúpula do PT.
Levam a sua assinatura as medidas de “contabilidade criativa” que dilaceraram a credibilidade das contas públicas e que podem conduzir o país a um rebaixamento de nota pelas agências de classificação de risco em 2015. Também é atribuída a ele a parternidade de ações intervencionistas como a Medida Provisória 579, que provocou desequilíbrios no setor elétrico, e a redução da taxa de retorno para investidores interessados em dar lances nas concessões de infraestrutura feitas ao longo do governo Dilma.
Novo pitbull — No novo governo, Arno Augustin deverá servir de ponte entre o Palácio do Planalto e o Ministério da Fazenda. A depender de quem ocupe essa pasta, pode ser uma tarefa muito, muito árdua. Cresceu ao longo da semana a expectativa de que Dilma convide o ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, para comandar a Fazenda. Depois de se reunir com Lula, na segunda-feira, a presidente está propensa a ceder e convidar Meirelles. Assessores próximos de Dilma reconhecem que ela não morre de amores pelo banqueiro, mas ficou balançada com a pressão vinda de seu antecessor. O argumento mais forte usado por Lula, afirmam, é de que uma guinada na economia será essencial para pavimentar a volta do ex-presidente na disputa eleitoral de 2018. E, para Lula, tal guinada só poderá acontecer se houver uma reconciliação com o mercado que Meirelles seria capaz de conduzir. Não que tenha mudado suas convicções ou reconhecido erros. Mas ela tampouco quer arcar com a culpa de ser a responsável pela saída do PT do poder.
Se Meirelles aceitar assumir a pasta, condicionará sua volta a Brasília à escolha de sua própria equipe econômica e a interferência mínima do Palácio do Planalto. Nesse contexto, a presença de Arno Augustin será crucial. “Ele será o pitbull de Dilma na área econômica. Como ele é de sua inteira confiança, Dilma vai delegar ao Arno todo o desgaste com a Fazenda”, afirma um assessor que acompanha as discussões sobre a troca ministerial. No PT, o secretário é visto com antipatia. Sua interferência na relação da Presidência com o setor privado, ainda que ele tenha apenas seguido ordens, é vista como um problema que poderia ter sido evitado. Diz um petista que se reuniu com Lula na quarta-feira, em São Paulo, que o desprezo do cacique petista por Augustin é tal que “não quer nem ouvir falar dele”.
Soldado fiel — De fala mansa-esganiçada, vida simples e discrição pouco usual entre os caciques de Brasília, Augustin nada tem de truculento. Quem o conhece ressalta características como a boa educação e, em muitos casos, a docilidade — que só dá lugar à rispidez quando suas ordens são contrariadas. Seu domínio técnico e dedicação ao trabalho no Tesouro também são características constantemente mencionadas. Diz um senador petista que, ao participar como convidado das reuniões da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, sempre que questionado sobre números e conceitos, Augustin sabe tudo na ponta da língua e se mostra sempre solícito em ajudar.
Sua dedicação ao PT, partido ao qual é filiado desde 1987, somada à sua experiência na Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul, fez com que fosse alçado ao posto de Secretário do Tesouro ainda durante o governo Lula — posto que continuou ocupando na gestão seguinte, num grau de poder que jamais havia sido oferecido a um secretário. Dilma foi responsável por trazê-lo a Brasília, nos idos de 2003, por ver nele um soldado fiel. Com Augustin, a presidente compartilha uma linha de pensamento econômico com forte viés à esquerda, que vê no emprego, e não na estabilidade macroeconômica, a chave para o desenvolvimento do país.
A subserviência do secretário à presidente, a quem não costuma responder com negativas, coloca em xeque sua própria credibilidade como técnico. Augustin lança mão da ortodoxia econômica para vetar a liberação de empréstimos a estados, mas pode ser o mais heterodoxo dos economistas ao criar medidas contábeis que mascaram as derrapadas fiscais do governo federal. Notórias foram as vezes em que, durante o governo Lula, o secretário criou disputas entre o Tesouro e governadores devido à sua “mão fechada”.
Numa ocasião, quando ainda era secretário no Rio Grande do Sul, brigou por uma linha de crédito de 1 bilhão de dólares junto ao Banco Mundial que, ao ingressar no Tesouro, decidiu negar. O ato suscitou revolta de parlamentares gaúchos. O senador Pedro Simon (PMDB-RS) fez vigília no Senado, num discurso de mais de seis horas, para tentar chamar a atenção do Executivo. O estado era então governado pela tucana Yeda Crusius. Outro governador tucano, o paranaense Beto Richa, chegou a pedir à Justiça estadual uma mandado de prisão contra o secretário justamente por ele ter negado aval a um empréstimo de 600 milhões de reais ao estado. À época, Augustin alegou que liberar o limite significaria o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Curiosamente, hoje, devido à contabilidade criativa de Augustin e aos efeitos nocivos da política econômica de Dilma Rousseff, o país deverá encerrar o ano com déficit fiscal. Ou seja, até o momento, a diferença entre a arrecadação e os gastos do governo está negativa em 15 bilhões de reais, o pior resultado da história. A previsão do governo era de um superávit de 99 bilhões de reais para este ano. Diante da impossibilidade de se chegar a tal número, o Executivo tentará aprovar uma nova meta fiscal antes do apagar das luzes de 2014 — proposta que a oposição já sinalizou que combaterá. Se não conseguir aprovar a nova meta no Congresso, o governo terminará o ano descumprindo a LRF que o secretário dizia respeitar, o que poderá acarretar sanção penal contra a administração federal.
Pobre menino rico — Nascido numa abastada família da cidade de Carazinho (RS), Augustin encantou-se, ainda jovem, pelo pensamento trotskista. Por ser ainda criança durante os anos de chumbo da ditadura, nada teve a ver com a resistência, muito menos luta armada. Mas desenvolveu uma peculiar sensibilidade aos temas sociais e sempre se mostrou desprendido da riqueza que seu pai, de quem herdou o nome, acumulava com o passar do tempo. Dono de terras, comerciante de máquinas agrícolas e empresário do setor automotivo, Arno pai tentou trazer os filhos para o comando dos negócios.
Avesso à política e a qualquer ideologia que não fosse o trabalho duro, o patriarca escalou o filho mais velho, Claudio, para tocar a empresa. Um contemporâneo dos irmãos Augustin contou ao site de VEJA que, em poucos meses, o primogênito organizou uma greve de funcionários na empresa paterna e foi demitido. Claudio, um dos fundadores do PT no Rio Grande do Sul, foi uma das grandes influências políticas na vida do irmão, Arno Filho. Ambos deixaram Carazinho ainda jovens para estudar em Porto Alegre — e nunca mais abandonaram o engajamento político. Enquanto Arno se dedicou à administração pública de seu estado, daí sua devoção a Dilma Rousseff, que também iniciou carreira em solo gaúcho, Claudio se tornou líder sindical e hoje preside o Sindicado dos Funcionários Públicos do Rio Grande do Sul. O único a seguir o caminho do pai foi o empresário Carlos Ernesto Augustin, que hoje comanda um conglomerado de agronegócio, em especial de soja e algodão, com sede em Rondonópolis, no Mato Grosso.
Com reportagem de Naiara Infante Bertão e Talita Fernandes
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