Representante de uma das empresas que mais receberam verba é sócio de Jorge Murad, marido da governadora, em outro negócio
Estadão Conteúdo
O gasto do governo Roseana Sarney (PMDB) com as duas principais fornecedoras de mão de obra para os presídios do Maranhão chegou a R$ 74 milhões em 2013, um aumento de 136% em relação a 2011. Uma das empresas que mais receberam verba, a Atlântica Segurança Técnica, tem como representante oficial Luiz Carlos Cantanhede Fernandes, sócio de Jorge Murad, marido da governadora, em outra empresa, a Pousada dos Lençóis Empreendimentos Turísticos.
Em 2002, antes da eleição presidencial, a Polícia Federal apreendeu R$ 1,34 milhão em dinheiro vivo na sede da empresa Lunus, de Murad e Roseana. À época, em entrevista à revista Veja, Fernandes disse que parte desse dinheiro (R$ 650 mil) veio de empréstimo da sua empresa Atlântica. A Lunus ficava no mesmo endereço da Lençóis Empreendimentos.
A terceirização nos presídios é apontada pelo sindicato dos agentes penitenciários e pela oposição como uma das causas da barbárie no sistema carcerário do Maranhão.
Responsável por fornecer os guardas que fazem a segurança armada dos presídios, a Atlântica recebeu, em 2013, R$ 7,6 milhões da Secretaria de Justiça e Administração Penitenciária (Sejap).
Um ano antes, o valor era exatamente a metade: R$ 3,8 milhões. Ano passado, a Atlântica também tinha contratos com outros quatro órgãos estaduais e recebeu no total R$ 12,9 milhões do governo maranhense.
Já a VTI Tecnologia da Informação, responsável pelos sistemas de câmeras de segurança e pelos monitores que trabalham desarmados nos presídios, recebeu, em 2013, R$ 66,3 milhões da Sejap, montante 35% superior ao pago pela pasta no ano anterior. No site da Receita Federal consta que a atividade econômica principal da empresa é "consultoria em tecnologia da informação".
Locação de mão de obra temporária aparece como uma das quatro atividades secundárias. Em 2013, a VTI tinha contratos com outros três órgãos do Maranhão e recebeu no total R$ 75,8 milhões do Estado.
Desde 2009, primeiro ano da atual administração de Roseana, o gasto total do governo maranhense com essas duas empresas passou de R$ 10,1 milhões para R$ 88,7 milhões no ano passado - crescimento de 778%.
Presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Maranhão (Sindspem), Antonio Portela disse que a terceirização de pessoal começou com a decisão do governo Jackson Lago (2007-2009) de transformar as carceragens da Polícia Civil em unidades do sistema prisional.
"Como essas carceragens funcionavam em delegacias no interior do Estado, muitos agentes penitenciários que atuavam no Complexo de Pedrinhas, na capital, foram deslocados para essas regiões", afirmou Portela.
"Enquanto isso, a quantidade de presos foi aumentando. E, em vez de construir novos presídios e fazer concurso para agentes, o governo Roseana preferiu fazer uma 'privatização branca', contratando essas empresas terceirizadas."
Segundo o sindicato, o Maranhão tem 382 agentes penitenciários para uma população carcerária de quase 6 mil presos.
Portela afirmou que a Atlântica fornece guardas armados responsáveis pela segurança dos presídios. Já a VTI é responsável pelos monitores que andam desarmados e desempenham funções como condução de presos para banho de sol, visitas, encontros com advogados e revista em visitantes.
Treinamento. Uma das principais críticas é a falta de treinamento da mão de obra terceirizada que trabalha nos presídios. "Os terceirizados não têm treinamento adequado para lidar com presos. Além disso, são mal remunerados, o que favorece a corrupção. Daí a quantidade de armas, celulares e drogas encontrada no interior das cadeias. Um monitor da VTI recebe cerca de R$ 900 mensais, e um guarda da Atlântica, pouco mais de R$ 1 mil. Já um agente concursado ganha, em média, R$ 3,5 mil", disse o presidente do Sindspem.
O deputado estadual Rubens Júnior (PC do B), líder da oposição na Assembleia Legislativa do Maranhão, disse que quando a Casa retornar do recesso vai solicitar a suspensão dos contratos com a Atlântica e a VTI.
"A desativação das carceragens da Polícia Civil foi uma decisão acertada, já que a função dela é investigar crimes, e não custodiar presos. No entanto, presídio não é lugar para terceirizado. O Estado não tem como controlar a capacitação desses funcionários nem de acompanhar seu rendimento."
Outro lado. Em nota, o governo do Maranhão afirmou que a terceirização da mão de obra no Complexo de Pedrinhas "não tem nenhuma relação com os acontecimentos no presídio".
A gestão Roseana Sarney disse ainda que "os funcionários contratados de empresas especializadas são parceiros no trabalho dentro dos presídios" e que, "além de receberem capacitação na empresa, também são qualificados em cursos oferecidos pela Secretaria de Estado de Justiça e Administração Penitenciária (Sejap)".
Questionado sobre o motivo do crescimento do valor pago às empresas Atlântica e VTI, o governo respondeu que "o problema do sistema carcerário é nacional e tem sido combatido com uma série de ações pelos governos dos Estados e a União. A manutenção da estrutura requer investimentos efetivos em infraestrutura, mão de obra e qualificação".
Segundo o comunicado, o orçamento da Sejap para este ano é de R$ 149 milhões, o que representaria aumento de cerca de 75% frente a 2012.
A administração estadual do Maranhão negou que agentes penitenciários de Pedrinhas tenham sido transferidos para unidades no interior do Estado. Informou ainda que realizou concurso público para 41 agentes penitenciários em maio de 2013. Disse também que serão investidos R$ 131 milhões em recursos do próprio Estado para construção de novos presídios e reaparelhamento de todas as unidades, o que vai aumentar em 15% a quantidade de vagas no sistema.
Procuradas ontem pelo Estado por telefone, a Atlântica Segurança Técnica e a VTI Tecnologia da Informação não se manifestaram até o final da noite de ontem.
A reportagem foi informada que Luiz Carlos Cantanhede Fernandes, da Atlântica, estaria em viagem. Nenhum diretor da VTI foi localizado na matriz da empresa, em Fortaleza.
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