Câncer
Além de infectar e atacar as células de câncer, o novo vírus inibiu o crescimento de vasos sanguíneos que alimentassem o tumor
O câncer de mama triplo negativo, combatido pelo novo tratamento, é agressivo e costuma atingir mulheres jovens(Thinkstock)
O vírus Vaccinia já tem seu lugar garantido na história da medicina. Bastante semelhante ao vírus da varíola, ele causa uma forma mais branda e não letal da doença. Por causa dessa similaridade, ele foi usado para confeccionar vacinas contra a doença - as vacinas contra a varíola, aliás, foram as primeiras a serem confeccionadas na história da medicina e é justamente por causa do vírus que o método de proteção ganhou este nome. Graças às vacinas, a varíola tornou-se a primeira doença a ser erradicada pela ciência. Agora, pesquisadores do Centro de Câncer do Memorial Sloan-Kettering, nos Estados Unidos, estão tentando modificar o vírus Vaccinia para que ele mate as células do câncer de mama triplo negativo (TNBC na sigla em inglês), uma forma bastante agressiva do tumor.
De acordo com os cientistas, o TNBC é responsável por entre 10% e 20% dos casos de câncer de mama. Em comparação aos outros tumores de mama, ele tem maiores chances de aparecer em mulheres jovens, menores de 35 anos. Seu tratamento é difícil, uma vez que ele não possui três receptores que são alvos de novos e promissores tratamentos: o receptor do estrógeno, da progesterona e do HER2. Por isso, é conhecido como triplo negativo.
Apesar de as mulheres diagnosticadas com a doença normalmente responderem à quimioterapia, esses tumores tendem a ser mais agressivos e ter mais chances de regressar. "Nós ainda não entendemos por que esse tipo de câncer é tão agressivo e tende a reaparecer depois do tratamento", diz Sepideh Gholami, cirurgiã do Centro Médico da Universidade Stanford nos Estados Unidos, e autora do estudo. Por causa da gravidade e da falta de receptores específicos, os pesquisadores tem focado seus estudos em vírus oncolíticos, que infectam e exploram as vulnerabilidades únicas dessas células de câncer. Agora, com o vírus Vaccinia, os primeiros resultados começaram a aparecer.
Tratamento - O fator de crescimento endotelial vascular (VEGF, na sigla em inglês) é uma proteína que estimula o crescimento e diferenciação de células sanguíneas. Em células normais, ele ajuda a oxigenar os tecidos onde a circulação está inadequada. Nos cânceres, no entanto, ele estimula o fornecimento de sangue, e por consequência, a metástase. Nos tumores TNBC, esse fator de crescimento está muito mais presente do que nos outros casos de câncer de mama, podendo explicar sua agressividade.
Para atacar esse mecanismo específico, os pesquisadores criaram um novo tipo de vírus Vaccinia, chamado GLV-1h164, que carrega uma proteína que ataca especificamente o VEGF. "A razão por termos usado o vírus Vaccinia é que ele é um membro da família da varíola, e, como sabemos, a vacina da varíola foi administrada a milhões de pessoas para erradicar a doença. Nós pensamos que seria mais seguro e promissor usar esse vírus em nossas pesquisas", diz Gholami.
Em um primeiro experimento, os pesquisadores infectaram células TNBC cultivadas em laboratório com o novo tipo de vírus. Com isso, conseguiram matar mais de 90% dessas células depois de quatro dias. Em seguida, eles geraram tumores TNBC em ratos, e trataram os animais com o mesmo vírus. Após três semanas, a regressão do câncer era clara. "Pelo menos 60% dos cânceres regrediram completamente. E os outros 40% ficaram com áreas muito pequenas de tumor, cercadas por tecido necrosado, um sinal de que o tumor estava respondendo à terapia", afirma Gholami.
Além de infectar e atacar as células de câncer, o novo vírus inibiu o crescimento de vasos sanguíneos que alimentassem o tumor. O resultado foi apresentado nesta segunda-feira no Congresso Clínico Anual do Colégio Americano de Cirurgiões, realizado nos Estados Unidos, e deve ajudar os pesquisadores a desenvolverem uma nova terapia alvo contra o câncer TNBC. O próximo passo dos pesquisadores é fazer um estudo maior com o novo tratamento, e testar sua segurança em humanos. Quem sabe assim, o vírus Vaccinia ajude a enfrentar mais uma doença avassaladora e mortal.
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