Relator da reforma política na Câmara dos Deputados, Vicente Cândido (PT-SP) defende que o Congresso enfrente o desgaste de discutir anistia aos alvos da Operação Lava Jato como forma de "distensionar o país".
"Temos de ter pensamento estratégico. O que é melhor para a sociedade nesse momento? Até aprovar uma anistia, seja criminal, financeira, tudo isso é possível, não é novidade no mundo", afirma.
Cândido ressalta, porém, que não pretende levar o tema para a comissão. Ele apresenta seu relatório no início do próximo mês.
Em entrevista à Folha, adiantou os principais pontos. Lista fechada para eleição de deputados (voto em um conjunto de nomes pré-definidos pelas siglas, não em candidatos isolados), sem vaga privilegiada a congressistas, e um fundo eleitoral público, ainda sem valor definido.
Anistia
Cândido diz que, se levasse o tema da anistia para a comissão, a discussão só seria essa. Mas afirma que o Parlamento é o palco "mais legítimo" para decidir o assunto.
"Dentro de um contexto, de um novo pensamento, devia enfrentar, não sei se vai ter coragem. Um debate aberto, público, até para distensionar o país. O que temos de ter aqui é pensamento estratégico de nação. O que é melhor pra sociedade neste momento? Até aprovar uma anistia, seja criminal, financeira, tudo isso é possível, não é novidade no mundo."
O petista diz que a aprovação da nova lei de leniência, cuja comissão ele presidiu, seria um primeiro passo.
"Mudaria muito os paradigmas. Por exemplo, delação só com o réu solto, pena pesada para vazamento de informações, não repercussão penal dos acordos de leniência. Isso é um freio na Lava Jato? Não, mas você começa a colocar as coisas no seu devido lugar."
O Congresso avalia aprovar mudanças para dificultar condenações que tiveram base em delações. "Vale a palavra de um delator que, pressionado, intimidado, constrangido, fala um monte de coisa e você já vai lá condenando? Pressão da mídia, senso comum, clamor social, fica fácil condenar. Com desgaste ou sem desgaste, tem de enfrentar o debate."
Eixo da reforma
Seu relatório tratará a lista fechada como sistema eleitoral em 2018 e 2022. A partir de 2026, haveria o sistema distrital misto, em que as cadeiras da Câmara são preenchidas pela lista fechada (50%) e por candidatos isolados eleitos por região (50%).
Irá propor a criação de um fundo eleitoral público, em resposta à proibição de financiamento de empresa. Ele não fala em valores, mas deputados dizem que o fundo deverá ter cerca de R$ 2,5 bilhões.
"Não tem outro caminho. Já conversei com uns 15 países por meio das embaixadas, não tem muito o que inventar, 80% dos países democráticos aplicam a lista fechada."
Sobre as críticas de que a lista dificulta a renovação, Cândido afirma que não irá colocar em seu relatório a preferência a congressistas na lista. E que irá propor mudanças para tentar democratizar os partidos. Pretende reservar pelo menos 20% das candidaturas para mulheres.
Vice
Quer acabar com a figura dos vices. "Por que manter um indivíduo na expectativa, assessor, segurança, carro, gasolina? E o vice tem tendência para conspirar. Isso é indefensável. O país deve ter em torno de uns 15 mil cargos em torno dos vices". Se passar, o primeiro da linha sucessória seria o chefe do Legislativo por três meses, com eleição direta em 90 dias.
Tribunais
Cândido defende mandato de dez anos a integrantes das cortes, entre elas o Supremo Tribunal Federal. "A indicação política é momento ideológico de um governo. Não justifica que nós, que temos quatro anos de mandato, indiquemos alguém para ficar 40 anos, eternamente."
Eleições
Colocará no relatório a junção de eleição de vereador, deputado e senador em um ano e a de prefeito, governador e presidente em outro. Sugerirá o mandato de cinco anos, sem reeleição, para o Executivo, a partir de 2018.
Voto obrigatório
Cândido apoia a realização de plebiscito em 2018 para a população decidir se mantém a obrigatoriedade do voto. "Se o Congresso não autorizar, gostaria de escolher um outro tema", diz, listando a legalização do aborto e descriminalização das drogas.
Pesquisas eleitorais
O relatório trará a proibição da divulgação de pesquisas nos três dias que antecedem as eleições. "O STF já deu pau nisso lá atrás, mas é um outro Supremo agora. Aqui vale mais a rigidez para evitar as fraudes, picaretagem."