Em reunião na sede do PDT, em Brasília, Dilma trocou afagos com o ex-ministro Ciro Gomes e se emocionou ao lembrar da militância no partido no Rio Grande do Sul
Em um ato de reaproximação com o PDT, partido de sua base aliada, a presidente da República, Dilma Rousseff, comparou nesta sexta-feira o processo constitucional de impeachment a que pode ser submetida no Congresso Nacional às pressões pela renúncia do ex-presidente Getúlio Vargas, que terminou por se suicidar em 1954, em meio a uma crise política. Dilma participou de uma reunião na sede do PDT em Brasília (DF), na qual fez críticas ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e afirmou que o país terá de volta estabilidade política para retomar o crescimento. O partido decidiu unificar posição contra o impeachment da presidente e favorável ao afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB).
"O impeachment que tentaram impor ao Getúlio é um prenúncio do que está acontecendo hoje no Brasil", afirmou Dilma. "Um governo pode e deve ser julgado e criticado, mas um governo não poder ser objeto de golpe por razões que eles chamam de políticas, nem relativas à moral, nem ao uso indevido de dinheiro público, nem a qualquer outra interrupção da atividade de governamental. Não há nenhuma base para o impeachment, mas eles não ligam para isso. Não gostam de ser chamados de golpistas, mas são."
A presidente criticou um relatório do FMI que cita, segundo ela, como entraves para o crescimento econômico do país a crise política e a profundidade das investigações sobre o escândalo do petrolão na Operação Lava Jato. A presidente afirmou que o FMI elenca três fatores para explicar a crise econômica mundial: a diminuição do crescimento da China, a instabilidade com conflitos no Oriente Médio e a continuidade da situação crítica no Brasil, com a duração da instabilidade política e o prazo mais longo das investigações sobre a Petrobras.
"Fiquei recentemente estarrecida com a frase que li no relatório na última previsão do Fundo Monetário Internacional. Eles dizem que esses seriam os dois fatores responsáveis por eles terem que rever a posição do FMI em relação ao crescimento da economia no Brasil. Tenho certeza que nós vamos estabilizar politicamente o país, vamos assegurar a tranquilidade para voltar a crescer. É esse o agradecimento que venho fazer a vocês."
A presidente disse que o país retomará o crescimento, mesmo diante da alta do dólar e da queda no preço do petróleo, e do baixa crescimento da China. "Nós vamos voltar a gerar emprego e renda e a desenvolver esse país. Vamos voltar a investir mesmo diante dessa crise internacional que se vê agora de forma mais clara. O Brasil vai voltar a crescer porque nós temos as bases bem assentadas, fundamentos sólidos."
Dilma comparou o impeachment ao processo de perda de confiança do parlamentarismo e disse que no Brasil é preciso mais do que não gostar do governo para decretar o afastamento do presidente. "No presidencialismo é necessário que tenha culpa formada. Eu não tenho, na minha vida, ao longo do tempo que passei no PDT ou no PT, nenhuma acusação de uso indevido de dinheiro público, não tenho dinheiro no exterior. Tenho uma vida absolutamente ilibada e honro os meus companheiros do PDT, que sempre combateram o mau uso do dinheiro público e a corrupção e sempre defendemos a democracia", disse Dilma. "Esse jogo vai ser jogado agora, até março, até junho. É aqui e agora que nós vamos decidir o caminho do Brasil nos próximos anos. Conto com cada um de vocês e agradeço o apoio. Aceito e preciso de sugestões e críticas, que são no sentido de melhorar e fazer o Brasil andar para frente."
A presidente buscou reforçar laços com o PDT e se emocionou ao lembrar da militância no partido, ainda no Rio Grande do Sul, e do tempo em que ficou presa em São Paulo na ditadura militar. Dilma disse que o PDT, que já teve o ex-ministro do Trabalho, Carlos Lupi, demitido em meio a um escândalo de corrupção, sempre prezou pelo bom uso do dinheiro público.
"Um homem que teve muita importância na minha vida de política foi Leonel Brizola. A vida me permitiu duas coisas em relação aos heróis trabalhistas", disse com a voz embargada. "Primeiro trazer o corpo do Jango de volta. A segunda foi colocar Leonel Brizola entre os heróis da pátria. Na ditadura, herói é aquele que morre sob tortura, sob perseguição no exílio. Para ter heróis, o povo tem que ter um imenso sofrimento. Mas quero dizer que na democracia, feliz do povo que tem heróis. Tenho certeza que o Brizola defenderia a soberania desse país e a democracia, a legalidade. Se tinha uma pessoa que tinha um faro imenso de tentativa de golpe, esse era o Brizola."
Ao se dirigir a Carlos Lupi, presidente nacional do PDT, Dilma cobrou a promessa de amor que ele fez ao deixar o ministério em 2011. "Você já declarou que me ama várias vezes, espero que você mantenha a sua palavra", disse Dilma.
"Está claro para a sociedade que somos o primeiro partido mais uma vez a botar a cara, a mostrar o que pensa, ao dizer que não estamos aqui por cargos nem por interesses. Estamos por causa. Não tem opinião publicada, pesquisa, nem mão de fora que comande a autonomia desse partido. Quando a gente decide fechar questão contra o impeachment, não é só pela boa companheira de história que é a presidente Dilma, é pelo povo brasileiro. Falta autoridade moral e política ao senhor Eduardo Cunha a pedir impeachment de quem quer que seja. O máximo que ele poderia fazer é o auto-impeachment, impeachment de si, pelos processos a que reponde, pelos indiciamentos e crimes cometidos", disse Lupi.
Dilma trocou afagos com Ciro Gomes, ex-ministro e ex-governador do Ceará, lançado pelo PDT como pré-candidato a presidente em 2018. Ao fim do encontro, Dilma e Ciro conversaram reservadamente por alguns minutos, antes de Dilma entrar no carro e seguir com a comitiva presidencial. "O Ciro é uma pessoa que eu considero de forma especial. Ele pode fazer o que quiser que não brigo com ele, porque a gente não briga com uma pessoa que demonstrou uma imensa lealdade, capacidade de luta e dignidade", disse Dilma.
Giro Gomes fez críticas à política econômica do governo Dilma, mas afirmou que defende a presidente assim como defendeu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) quando o PT decidiu pedir o impeachment do tucano, na década de 1990. Ele defendeu que Dilma mantenha diálogo com a oposição.
"Remédio para governo que não gosta, para governo ruim, não é interromper a democracia, porque nessa hora quem ganha normalmente é quem perdeu a eleição para o povo. A nossa primeira tarefa é proteger a democracia, e a segunda é cobrar que a presidente se reconcilie com os valores que trouxeram quase 30 milhões de brasileiros da miséria para uma vida digna. Tenho queixas graves em relação aos rumos do governo. Não gosto do governo da Dilma, mas compreendo as causas pelas quais o governo tem tido dificuldades. Nenhuma delas consulta a escalada golpista que grupos derrotados estão perseguindo", afirmou Ciro. "Há um constrangimento internacional grave [queda do preço de commodities e do barril de petróleo] que tirou o pé de sustentação do modelo brasileiro, que de forma imprudente, nos permitiu alimentar a ilusão de que indefinidamente pagaríamos um modelo de consumo industrial, manufaturado de alta linhagem, com valor de commodities. Isso acabou. O maior problema da presidente Dilma foi, de boa-fé, imaginar que isso poderia se conciliar com a plutocracia, com o rentismo no Brasil, entregando a eles a gestão da economia. Foi o mais grosseiro equívoco que ela cometeu, mas felizmente já foi corrigido."
Ciro trava uma guerra particular de acusações com o vice-presidente Michel Temer (PMDB), a quem chama de "capitão do golpe". Temer anunciou que vai processar o ex-ministro na Justiça. "Só um idiota acredita em qualquer boa-fé do senhor Michel Temer. Ele foi derrotado", disse Ciro.
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