Na semana passada, veio a público um parecer de Rodrigo Janot em que o procurador-geral da República, numa atitude insólita, se negava a proceder a uma investigação por determinação do Tribunal Superior Eleitoral. Explica-se: Gilmar Mendes, vice-presidente do TSE, pediu que o Ministério Público Federal abrisse investigação para apurar se a gráfica VTPB – que recebeu R$ 23 milhões da campanha de Dilma Rousseff – não havia cometido uma série de crimes.
Janot não se contentou em dizer que não via motivos para investigação. Além de alegar que ela estaria fora do prazo, resolveu dar uma aula sobre as funções do TSE. Mandou brasa:
“É em homenagem à sua excelência [Gilmar Mendes], portanto, que aduzimos outro fundamento para o arquivamento: a inconveniência de serem, Justiça Eleitoral e Ministério Público Eleitoral, protagonistas – exagerados – do espetáculo da democracia, para os quais a Constituição Federal trouxe, como atores principais, os candidatos e os eleitores”.
“É em homenagem à sua excelência [Gilmar Mendes], portanto, que aduzimos outro fundamento para o arquivamento: a inconveniência de serem, Justiça Eleitoral e Ministério Público Eleitoral, protagonistas – exagerados – do espetáculo da democracia, para os quais a Constituição Federal trouxe, como atores principais, os candidatos e os eleitores”.
Mendes reagiu de pronto e afirmou que não cabia a Janot se comportar como advogado do PT. Mas é claro que não ficou só nisso. Nesta terça, em novo despacho, o ministro esclarece:“Não se trata aqui de reabertura do julgamento da prestação de contas. As contas apresentadas foram julgadas ‘aprovadas com ressalvas’ pela maioria deste Tribunal. Cuida-se, isto sim, de investigar indícios de irregularidades que, se comprovados, teriam o condão de atestar a ocorrência de fatos criminosos. No presente caso, não há como negar haver elementos indicativos suficientes para, ao menos, a abertura de investigação. A empresa (…) aparenta não ter capacidade operacional para entregar os bens e serviços contratados, pois, segundo consta da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2014, não possuía nenhum funcionário registrado. Se comprovada a condição de gráfica fantasma, crimes como os de falsidade ideológica, de lavagem de dinheiro, de estelionato e crimes contra a ordem tributária podem ter sido cometidos por parte de envolvidos na campanha e pela prestadora de serviço.”
Mendes vai além e lembra ao procurador-geral: “Esquece-se o Ministério Público de que é um dos legitimados pelo art. 35 da Lei dos Partidos Políticos a pedir apuração de atos do partido que violem disposição legal em matéria financeira”.
O ministro do TSE estranha o comportamento de Janot, que pediu informações sobre a tal gráfica ao ministro da Comunicação Social, Edinho Silva, que era tesoureiro da campanha de Dilma, e aos próprios representantes da empresa. E se deu por satisfeito. Escreve Mendes em seu despacho:
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A que se refere o ministro? Segundo o que vazou da delação premiada de Ricardo Pessoa, dono da UTC, a VTPB era, nas palavras do ministro, “a ponta da lavanderia de recursos desviados da Petrobras”.
E prossegue o ministro:
“Repito: não oficiei ao PGR visando à reabertura do processo de prestação de contas da campanha eleitoral da Presidente da República. Apenas cumpri o meu dever funcional de remeter ao Ministério Público documentos relacionados à existência de crimes, na forma do art. 40 do Código de Processo Penal, e do próprio acórdão desta Corte que aprovou com ressalvas as contas de campanha da Presidente da República, o qual consignou expressamente que ilícitos apurados após aquele julgamento não deixariam de ser devidamente investigados.”
“Repito: não oficiei ao PGR visando à reabertura do processo de prestação de contas da campanha eleitoral da Presidente da República. Apenas cumpri o meu dever funcional de remeter ao Ministério Público documentos relacionados à existência de crimes, na forma do art. 40 do Código de Processo Penal, e do próprio acórdão desta Corte que aprovou com ressalvas as contas de campanha da Presidente da República, o qual consignou expressamente que ilícitos apurados após aquele julgamento não deixariam de ser devidamente investigados.”
E Mendes encerra determinando que Janot cumpra a sua função: “Assim, reitere-se (…) ao Procurador Geral da República para que, ante estes esclarecimentos, prossiga a análise dos fatos noticiados”. Entendam: não cabe a Janot recusar a determinação.
Os demais membros do tribunal endossaram a decisão de Mendes. Dias Toffoli, presidente do TSE, afirmou que, de fato, a Justiça Eleitoral tem de pensar na pacificação social, como quer Janot, mas do seguinte modo: “O exercício dessa pacificação é em razão da sua ação e não da sua não ação. É exatamente por agir e para coibir e garantir a liberdade de voto do eleitor que a Justiça Eleitoral existe na parte jurisdicional e para administrar a organização das eleições no âmbito da gestão e da administração”.
Toffoli lembrou que a decisão de mandar investigar a gráfica não era de Mendes, mas da Corte: “Na medida em que o acórdão desta Corte determinou que as contas foram aprovadas com ressalvas, mas diante de determinados elementos que necessitariam aprofundamento nos fóruns adequados, não o eleitoral, esta determinação não é isolada do ministro Gilmar Mendes. Isso é uma determinação da Corte, daquele julgamento”.
Também se pronunciou o corregedor-geral eleitoral do tribunal, ministro João Otávio de Noronha: “Estou apenas a defender a legitimidade de atuação jurisdicional de toda a Justiça Eleitoral”.
Vá, Janot, cumprir a sua função e a determinação de um tribunal superior. Não é questão de querer. É de dever. O PT já tem um monte de advogados.
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