Eleições 2014
Fator surpresa nas eleições à Presidência da República, Aécio Neves enfrentou a mais suja campanha do PT depois de aparecer na liderança nas pesquisas
Laryssa Borges e Silvio Navarro
Sexta-feira, dia 10 de outubro, por volta das 10 horas, Aécio Neves serviu-se de um café e sentou-se à mesa em uma sala no comitê de campanha no bairro do Leblon, no Rio de Janeiro, para uma entrevista a VEJA. Antes do primeiro gole, espiou a capa dos principais jornais do país empilhados ao lado, que estampavam, pela primeira vez, pesquisas indicando que ele liderava a disputa para o Palácio do Planalto contra a presidente Dilma Rousseff. A reportagem perguntou: como o senhor se sente, à frente nas pesquisas, depois de ter chegado a ser considerado carta fora do baralho? Aécio deu um sorriso discreto e, depois de uma breve pausa, respondeu: "As pesquisas não vão me tirar do chão. Sei que vamos ter dificuldades lá na frente". De fato, ele teve. Nos 16 dias que se sucederam até a eleição deste domingo, Aécio conheceu a fúria e os métodos sujos do PT, que já havia massacrado Marina Silva no primeiro turno, e àquela altura experimentava um cenário inédito tendo um adversário tucano na dianteira nas pesquisas. Alvejado diariamente pela artilharia do PT, Aécio perdeu a liderança nas pesquisas na reta final e queixou-se: "Não podemos ter medo do PT. E se o preço for esse, eu enfrento".
Treze anos antes da disputa mais importante de sua carreira política, Aécio sentou-se, acanhado, na cadeira presidencial. Era 26 de junho de 2001 e ele, presidente da Câmara dos Deputados, assumiu interinamente o posto mais alto da República por três dias na ausência do então presidente, Fernando Henrique Cardoso, e do vice, Marco Maciel. Diz ter se sentido só e sufocado pelo forte aparato de segurança reservado aos chefes de Estado. Mas, desde que encerrou o segundo mandato como governador de Minas Gerais, em 2010, decidiu que voltaria ao local, desta vez de forma definitiva e eleito presidente.
Aos 54 anos, 33 deles na vida pública, Aécio Neves se considera um bom negociador. Apontado como um dos mais hábeis políticos de sua geração, reconstruiu pontes dentro do seu partido, atraiu novos aliados no segundo turno e chegou à disputa presidencial com chances reais de colocar fim aos doze anos de administração petista. Desde o dia 14 de junho, quando seu nome foi confirmado como candidato oficial do PSDB na disputa pelo Palácio do Planalto, foi diplomático para aplacar potenciais opositores dentro do partido e acabar com a conhecida desunião tucana. Nos mais de três meses de campanha, teve também de lidar com um cambaleante desempenho em Minas Gerais, seu reduto político, administrar oscilações de arrecadação e ver pedidos de demissão de parte da equipe.
O primeiro baque veio logo no início da campanha, em dia 19 de julho. Enquanto caminhava por uma feira agropecuária na cidade cearense do Crato, recebeu um telefonema que informava que o jornal Folha de S. Paulo publicaria no dia seguinte a denúncia de que ele construíra com dinheiro público um aeroporto na cidade de Cláudio (MG) dentro da fazenda de um tio. Preocupado, paralisou o ato político, afastou-se dos apoiadores e pediu que vasculhassem documentos para comprovar a lisura da obra. Sangrou por dez dias seguidos antes de admitir ter usado ocasionalmente a pista de pouso. Naquele momento, além do inesperado desgaste político, penava para administrar uma situação familiar delicada – o filho Bernardo, nascido prematuro pouco mais de um mês antes – inspirava cuidados especiais em uma UTI neonatal no Rio de Janeiro.
Menos de dois meses depois – e já parcialmente recuperado da trágica morte do amigo e então adversário nas eleições Eduardo Campos – o candidato do PSDB viveu seus piores dias na campanha. Em 1º de setembro, foi escanteado durante o debate do SBT pelas então favoritas Dilma Rousseff e Marina Silva. Teve desempenho tímido na exposição de propostas e acabou interagindo com os candidatos nanicos. Desde então, abriu mão de usar o teleprompter na TV, vetou bilhetinhos repassados por marqueteiros nos intervalos dos debates e atuou pessoalmente para reverter o desânimo que abateu os tucanos. Ele amargava apenas 14% das intenções de voto.
Sem diminuir o ritmo da agenda de campanha, o tucano e sua equipe intensificaram atos políticos em colégios eleitorais estratégicos. Entre um compromisso e outro, recordava o que apelidou de “a noite do chorinho”. Nas raras vezes em que dormia em casa, o choro dos recém-nascidos Julia e Bernardo o levava a passar noites em claro. Desde o nascimento dos filhos gêmeos, latas de energético foram promovidas a itens de primeira necessidade.
Na estratégia de campanha, a equipe de conselheiros do tucano também teve de reajustar seguidas vezes os rumos do discurso a ser apresentado ao eleitor. Depois de apontar a ex-senadora Marina Silva como uma ex-petista e afirmar que necessariamente se tornaria oposição em um eventual governo dela, Aécio foi aconselhado a construir pontes com a adversária. Amenizou imediatamente o tom das críticas à concorrente e instruiu interlocutores a buscar o apoio daquela que seria a terceira colocada no primeiro turno das eleições.
Confirmado no segundo turno, pôs sobre a mesa novas metas de campanha: abrir 3 milhões de votos de vantagem em Minas Gerais frente à petista Dilma Rousseff. Aliado de primeira hora, o senador eleito Antonio Anastasia (PSDB) telefonou pessoalmente para mais de 300 prefeitos para pedir apoio. Derrotado na corrida pelo Palácio Tiradentes, o ex-ministro Pimenta da Veiga conversou com outras 200 lideranças. Precisavam acabar com o discurso petista que aproveitou a derrota do tucano em Minas no primeiro turno para explorar a tese de que “quem conhece não vota em Aécio”. No front de negociações com Marina, traçou como objetivo captar pelo menos 60% dos 20 milhões de votos conquistados pela ex-senadora.
No último mês, com o acirramento dos ataques do PT, Aécio Neves determinou a elaboração de um pacote de propagandas críticas aos 12 anos de governo petista e partiu para uma campanha de enfrentamento que teve seu ponto alto no debate promovido pelo SBT, no dia 16. Preparou-se para minar críticas do PT ao economista Armínio Fraga e, de posse de pesquisas qualitativas que confirmavam que o eleitorado assimilara que há corrupção na Petrobras, martelou o escândalo do petrolão em cada discurso. Mas novos levantamentos apontaram que o eleitor rejeitava os ataques mais duros. Pelo menos 32 peças publicitárias já gravadas pelo PSDB foram descartadas.
Nos últimos dias antes de enfrentar as urnas, um novo baque. Aécio revelou que estava “magoado” de ter sido atacado tão duramente pelo ex-presidente Lula, político com quem mantinha uma relação amistosa. Antigo parceiro do petista no time de futebol organizado por parlamentares ainda nos anos de 1980, Aécio se recusava a responder ao ex-presidente – até porque levar Lula e sua popularidade para o debate direto era tudo o que o PT queria. Na última semana, irritado, quebrou o silêncio quando o ex-presidente o chamou de "playboy" e disse que ele era agressivo com mulheres. “Lamento que um ex-presidente da República se permita cumprir um papel tão inexpressivo como o que ele vem cumprindo. Ele apequena sua biografia com ataques torpes e absurdos”, disse. Foi à TV e usou mais de um programa eleitoral para rebater o terrorismo eleitoral propalado pelo PT nos rincões e reagiu aos ataques pessoais desferidos por Lula. Despediu-se com a frase que seus apoiadores adotaram: "Vou libertar o Brasil do PT".
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