Congresso
Para Júilio Delgado, Vargas "insere-se no contexto de uma imensa rede criminosa especializada na lavagem de dinheiro e na evasão de divisas"
Marcela Mattos, de Brasília
O deputado André Vargas depõe no Conselho de Ética da Câmara, em Brasília (Joel Rodrigues/Folhapress)
Depois de mais de três meses de investigação, o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), relator do processo contra André Vargas no Conselho de Ética da Câmara, pediu nos primeiros minutos desta quarta-feira a cassação do ex-petista pelo seu envolvimento com o doleiro Alberto Youssef, pivô do esquema desbaratado pela operação Lava-Jato, da Polícia Federal. Para Delgado, Vargas “insere-se no contexto de uma imensa rede criminosa especializada na lavagem de dinheiro e na evasão de divisas como o agente responsável por abrir as portas da administração pública”.
Em parecer de cinquenta e quatro páginas, Delgado afirma que Vargas quebrou o decoro ao agir intermediando contratos entre a empresa de Youssef e órgãos do governo federal – e ainda pelo recebimento de vantagem indevida, ao viajar em aeronave fornecida pelo doleiro, “integrando a censurabilidade do comportamento o senso geral de moralidade e de indispensável correção do parlamentar, tanto na sua atuação política quanto nas suas relações privadas”. “Em conclusão, dos episódios narrados e do exame cuidadoso do conjunto probatório, vê-se que os fatos apontam a responsabilidade do deputado André Vargas no abuso das prerrogativas constitucionais asseguradas aos membros do Congresso Nacional”, afirma.
Após a leitura do parecer, três deputados pediram vista, o que impediu a votação do texto pelos integrantes do Conselho de Ética. Com o Congresso em recesso por causa das eleições, o relator afirma que vai tentar marcar uma sessão antes de setembro, quando está prevista uma nova rodada de esforço concentrado, mas admite ser “difícil” o comparecimento dos parlamentares. O relatório ainda tem de ser votado pelo colegiado para seguir para análise do plenário da Câmara dos Deputados.
Ex-vice-presidente da Câmara, Vargas estava no auge de sua carreira política quando começou a cair em desgraça após a revelação de que ele e sua família utilizaram um jatinho pago por Youssef para passar as férias em João Pessoa (PB). A situação agravou-se após reportagem de VEJA revelar novos detalhes de sua ligação com o doleiro: Youssef mantinha contato constante com o congressista. Mais: segundo as investigações da PF, os dois trabalhavam para enriquecer juntos fraudando contratos com o governo federal. A ajuda foi materializada em um contrato inicial de 30 milhões de reais firmado com o Ministério da Saúde.
No relatório, Delgado afirma que a PF coletou 270 mensagens entre setembro de 2013 e março deste ano e ressalta o estreito relacionamento entre Vargas e Youssef. “O nível de intimidade e de frequência com que eles se falavam deixam claro que o episódio envolvendo a cessão da aeronave ou da ‘suíte mais cara’ do Hotel Blue Tree não são fatos isolados, mas consequências de um relacionamento estreito e íntimo, que transbordava os limites da amizade pessoal para chegar à efetiva participação nos negócios ilícitos de Youssef.”
Na tentativa de evitar a abertura do processo, Vargas quebrou o silêncio nesta tarde e compareceu, pela primeira vez, ao Conselho de Ética. Em sessão tumultuada, ele pediu o afastamento de Delgado, solicitou que mais testemunhas fossem ouvidas e reclamou pelo direito de ser ouvido, embora ele tenha sido convidado por cinco vezes a prestar audiência – Vargas, estrategicamente, fugiu das notificações do colegiado. Ao ser cedido o espaço para prestar depoimento, o ex-petista abandonou a sessão e prometeu recorrer à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A confusão criada por Vargas se arrastou por três horas e impediu que o relator fizesse a leitura do relatório. Em uma nova tentativa do relator, a reunião foi retomada depois da sessão frustrada de votação na Câmara e terminou apenas no início da madrugada desta quarta.
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