João Rubinato é o nome daquele conhecido como Adoniran Barbosa. Filho de imigrantes italianos que foi frequentador do bairro paulista-italiano do Bixiga. Apelidado de Rei da estufa por gostar tanto de pastéis, Adoniran é o principal nome do samba paulista ao lado de Paulo Vanzolini.
Um diletante que realmente viveu a vida no pagode e alegria, Adoniran trabalhou no cinema, na rádio, em espetáculos. Suas músicas foram primeiramente gravadas pelos Demônios da Garoa com quem emplacou diversos sucessos criando estrionicamente diversos personagens cômicos. Teve muitossimos sucessos que foram gravados por dezenas de outros músicos como Eliz Regina, Maysa, Silvinha Telles, Aracy de Almeida, Rolando Boldrin, Gonzaguinha, Gal Costa, Trio Marayá, MPB-4, Clara Nunes, Clementina de Jesus, Adoniran Barbosa, Carlinhos Vergueiro. Para muitas outras histórias de Adoniram, confira esta recheada bio-musico-grafia do Blog do Nassif.
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Eu nasci em Valinhos em 19… quer ver como é o negócio, eu nasci em 12 (1912), né. Mas pra mim trabalhar depois arranjaram um batistério, sabe o que é batistério. Pois é antigamente se chamava batistério, hoje é atestado de nascimento. Como eu tinha nascido em 10(1910) ter dois anos mais para poder trabalhar, compreende filho? Que na fábrica não aceitava com 10 anos só com 12 e me arrumaram um de (1910) pra eu pegar o basquete logo cedo, aí que é o busílis entendeu?
Em Valinhos eu não trabalhei, eu só nasci lá, depois vim pra Jundaí, de Jundiaí fui pro grupo escolar Coronel Siqueira Moraes. O meu número era 245, elefante, nunca deu este número no bicho… até hoje eu jogo não dá nunca. Dalí do grupo fui trabalhar no hotel, entregar marmita. Eu entregava marmita e viu, querido amigo, no caminho eu tinha fome sabe. No caminho eu abria a marmita e contava os bolinhos. Se a família tinha duas pessoas e tinham 6 bolinhos eu afanava dois no caminho, compreende , eu comia dois. Se a família tinha quatro pessoas e vinham 10 pasteizinhos, eu comia 2… malandrinho já, sabe? Não era malandro, era espertinho, eu tinha fome… era fome não era malandragem. Em Valinho eu trabalhei em metalúrgica, trabalhei em fábrica de tecidos era tecelão… não era com fiação. Trabalhava das 4 da tarde até as 11 da noite e ganhava 400 réis por hora, era um dinheirão. As vezes eu não queria trabalhar sabe e eu não ia trabalhar, pulava o muro de uma coxeira eu dormia nas baias onde os cavalos comiam capim até as 11. Quando o pessoal que trabalhava lá passava e dizia Alô, aí eu acordava, pulava e ia pra minha casa… malandro eu. Vivia, mas ruim de roupa compreende?
Pintor de Parede em Santo André. Quer ver Santo André ? Gozado a minha vida rapaz, fica quieto. Em Santo André eu fui encanador de água e esgoto, viu? Eu abria a valeta e cobria eu e você junto na picareta. Eu e um garotinho me ajudando. Abria a valeta e cabia eu e você no encanamento. Depois fui mascate, vendia retalho na rua… retalhos de tecidos. Vendia meia… Tanta coisa que eu fui, rapaz! Só fazia samba no caminho andando… eu já queria fazer samba. Eu nasci já querendo fazer samba, não tem começo, se bem que eu não parava em emprego. Balconista, se uma freguesa queria comprar um negócio eu ficava batucando, vivia batucando e me mandavam logo embora (Esta caneta é minha depois tu me dá)
No rádio eu entrei no rádio pois eu quis entrar. Ninguém quis que eu entrasse no rádio e até hoje ninguém quer. Até hoje batem na minha cara a porta. Pra mim foi duro entrar no rádio,filho! Foi duro, eu entrei como calouro na rádio Cruzeiro do Sul; ali eu cantava um samba do Noel Rosa bonito chama-se Filosofia, é Ré menor, né? O Jorge Amaral era locutor, e o Jorge Amaral, gozado…. aí eu fui aprovado com o Paraguassu e tudo como sambista. Aí em São Paulo, na rua 7 de abril fui fazer um teste com ele pelas 11 horas da noite com um outro samba. Ele na técnica, com aquela banca dele de técnico, aí eu terminei de cantar e ele disse: rapaz você é bom para acompanhar defundo… ele falou na minha cara ele falou não tinha dedo viu? Mas eu não desisti não, eu tava mentindo pra ele mesmo…
Eu fiz pro carnaval uma marcha em 1935 “Tô na Boa”, com J. Aimberê fiz uma marcha pro carnaval da prefeitura, Carnaval oficial da prefeitura, eu ganhei o primeiro prêmio e deram 500 cruzeiros, o que é hoje 500 cruzeiros, é 50 centavos né? E deram em cheque no Teato Boa vista na rua Vista e eu tinha 2 amigos naquela noite. Quando eu ganhei o prêmio e recebi o cheque veio 20 amigos rápido tudo atrás de mim: “Adoniran você é o maior,Salve ele… Adoniran troca o cheque…’ e eu troquei o cheque na marra, e põe birra, birra… Eu tinha mandado fazer um paletó, escute esta aqui, pra ir buscar no outro dia né? E eu não fui buscar o paletó, pois o dinheiro não deu, acabou na mesma noite, rapaz… Bebemos tudo, fui a pé pra casa, morava na Rua Vergueiro… Era uma porcaria de marcha mas ganhou o primeiro lugar, na época era espetáculo, mas hoje…
Maldina, o primeiro samba que eu dei pros os Demônios da Garoa… É ganhamos o primeiro prêmio na rádio Assunção… 10 contos…. outra historinha engraçada, gastei os 10 contos numa cantina: eu, minha mulher, eles, as senhoras deles, a família toda em uma cantina, o Egas Muniz, meu amigo que já morreu, também estava comigo e ele disse: segura a gaita do automóvel, não vai a pé pra casa… E eu segurei o dinheiro do carro se não ia a pé para casa, o resto só em pizza e vinho, os 10 contos. Você sabe o que é 10 contos em 1950? Era tutu…. Ele foi pra Record trabalhar lá e nós ficamos amigos em 45 e ficamos até hoje amigos. Brigamos sempre massomos amigos… Conheci oMolles no Correio Paulistano, na Rua Libaro Badaró este foi meu grande amigo, morreu coitado. Este cara não existe outro igual, nunca vai haver outro igual Oswaldo Molles. O cara era 100%. Criou tipos pra mim, ele via em mim uma coisa pra ele, entendeu? Era recíprocro. Então eu dizia uma coisa e ele achava graça… Ele fez pra mim o exército judeu, um exército rabinovish da rua José Pausinho. A senhora no que fala… A senhora compra agora custa 100 mil reis, a senhora dá 100 agora e o resto paga um pouco por mês, não tem importância. Judeu assim fazia. O professor de inglês de Charles Moore, tradução… este já não lembro faz tempo isto, Esmagate o vénito… aí venho o Charutinho que foi o famoso das malocas e criou muitas coisas engraçadas, também do Oswaldo Molles, não pensa que é só criação minha. Charutinho dizia: Depois que acabar nóis vorta, chora na rampa negão, aqui Gerarda, chora na rampa negrão, vem aqui o que que há….
Voltando pra Jundiaí, na fábrica eu era varredor, sabe o que é varredor ? Eu varria o salão, então quando eu não varria direito o corredor, “Joanim barredor vem aqui”, em vez de varre dizia barre. Em vez de varreu dizia, ele não barreu aqui, barre aqui rapaz. Joanim barredor era o máximo, era o fim da picada, era o máximo e pra mim tava tudo bom…
Ernesto Caporino, ele existiu… Ele convidou a gente pra um samba. E eu fui lá com os meus maloqueiros, com fome, e não tinha comida, não tinha nada. Marcaram meio dia, cheguei a uma. Uma panela do arroz só com a casca do arroz por baixo… E eu raspei a panela por que tava com fome e o feijão não tinha mais nada, e eu raspei o caldeirão de feijão.
Otávio Mendes… Conheci Otávio, Raul Duarte, Mario Sena, meu amigo, Brota Junior, Mario Sena de andar junto dia e noite, cantor de tango, era um boêmio bom, bebia umas pinguinhas leve comigo de noite, sabe? Garçom eu conheço todos eles, pois a primeira coisa que eu faço no restaurante, no bar é conquistar o garçom. Eu digo: Quanto? E ele fala cinco. Eu digo (faz som com conotação negativa). Tá bom três. Quantos pasteis? Oito! Não, três… Tá bom três. Tu comeu ovo, ovo com ovo, quantos? Só comi dois, tá bom… Aguenta aí é dois… Já fico amigo deles, não tem problema.
Não é dorme, o certo é drome. E também não é degrau é dregau, agora se quiser falar degrau pode, mas o certo é dregau… Este samba eu fiz quando na São João tavam demolindo aqueles prédios velhos, aquelas mariposas fedorentas caiam, você lembra, na calçada de noite, de madrugada. E elas vinha na luz da Light, batiam na luz, as mariposas amarelas feias e eu fiz as mariposas quando chega o frio (canta As Mariposas)…
Você vai me fazer chorar e eu não posso chorar, os dois morreram em 39 (fala dos pais) e eu sou muito frágil, sabe. Eu não moro perto de maloca, moro encostado de maloca, vizinho de maloca, tem um monte de maloquinha bonita, eu moro aqui na cidade Vila São Paulo, sou corintiano, e lá também tem maloquinha. Na minha rua não tem luz, na minha rua não tem água. É poço se quiser e fossa se quiser, fala pro seu Ferretti que dar um jeito. Eu tenho que pagar cedinho pros assaltantes senão eles pegam nosso violão, nosso pandeiro.
Prova de carinho é minha e do Marcos Cesar, foi na Tupi, peguei segundo lugar, ganhei uma notinha boa lá. Festival do Flávio Cavalcante que era o apresentante, o apresentador, o animador. Foi na Bienal então.. Á este samba agradou pacas na Bienal (Festival de Música Carnavalesca) foi o mais aplaudido, então o Ramirez falou assim para mim: Adoniran, fala pra arranjar o segundo lugar, pois o primeiro já é teu. Todo mundo bis que te bis. E eu disse já ganhei o primeiro lugar. Mas depois o Chico Buarque ganhou com Passarinho… Aí eu cantei no salão do Paramont. Ninguém saia do teatro… Tudo na porta vendo o pessoal cantar o samba. Por que eu desci com o pessoal pela praça do Correio, aí ficamos até umas 2 da madrugada na rua. Aí cheguei em casa e minha mulher tava chorando, coitada por que ela viu pela televisão e eu falei, O que que cê tem? Eu perdi… não tem nada filha, a gente vai pra outro festival e eu ganho outro… Ela disse não é isso que eu estou chorando, eu tou chorando é por que nossa cachorrinha fugiu e até agora não apareceu. E eu pensava que era por minha causa. Tá bom então, otims e eu achei que era por causa do meu samba e não era, era por causa da cachorrinha, da minha loirinha que tinha fugido.
Transcrição do Programa MPB Especial (Ensaio) de 1972.
” Quem quiser encontrar Adoniran Barboa, procure a filha do dono do bar que fica em frente à TV Record, na Avenida Miruna. Ela provavelmente, apontará alguém sentado, de chapéu de aba estreita, torto e inclinado como um barco a fazer água, no velho estilo dos malandros de todos os tempos e todos os lugares (…) Adoniran depois de 1 hora da tarde, quando termina seu expediente no pequeno bar do aeroporto, sai por aí, para assinar o ponto de velhas amizades. E se alguém recusa o uísque que ele oferece: “Não faz mal não E é tão bom”. E lá vai gingando, empurrado pelo motor de sua enorme alegria de viver, como um velho barco acostumado a ancorar nos portos da camaradagem. Na personalidade introvertida de São Paulo, na casmurrice de seu temperamento, como na frieza de seus relacionamento, os dois compositores encontraram a composição para suas músicas- como em Praça Clóvis de Paulo (Vanzolini), e em Saudosa maloca de Adoniran. Em Arnesto, de Adoniran, e Ronda de Paulo, os compositores, com a autoridade de amigos fiéis, denunciam a cidade que separa os homens. Ou que os aproxima, como a Paulo Vanzolini e Adoniran Barbosa, velhos companheiros de música e boêmia, neste fascículo e fora dele.”
Marcus Pereira para o fascículo-LP Nova História da Música popular brasileira
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Adoniran Barbosa canta Vila Esperança, que ficou em segundo lugar no Festival de Música Carnavalesca no auditório da TV Tupi, ao lado do grupo Demônios da Garoa.
Um encontro histórico Adoniran Barbosa, Billy Blanco, Cartola e Nelson Cavaquinho
São Paulo vive em Adoniran e ele está vivo lá, no cheiro, nas formas, no samba.
Moro em Jaçana, se eu perder este trem…
Samba é pra ser batucado em qualquer lugar e coisa. Adoniran batucou a vida e continua a chaqualhando
De tanto levar frechada do teu olhar… Elis Regina e Adoniran fizeram algumas rodas de samba pelo Bixiga e São Paulo… Manda a frecha..
Uma capacidade de atuar no mundo, Adoniran teve vários personagens. Na foto seu personagem no cinema Arrocinha de Mazzaropi
Adoniran BAR-bosa- Samba, Boêmia, cervejinhas, canas e alegria
Clementina de Jesus e Adoniran Barbosa, Matilde e Carlinhos Vergueiro
Dá corda pro Adoniran pra tu ver só…. Malandro é malandro
Adoniran foi compositor campeão com a Escola de Samba Santo André
Adorinan trabalhou com tudo, até no rádio.
Adoniran Barbosa no Bar Jogral. Na foto ainda aparece Luis Carlos Paraná (de óculos abaixo). Foto retirada do livro sobre o Jogral de Marcus Pereira
Tiro ao álvaro
Pra Animar a festa…
Adoniran Barbosa. Tantas histórias e causos destes mais de 100 anos que enche bibliotecas de vozes…
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