sábado 25 2014

'Lei Anticorrupção marca nova fase na luta contra desvios'

 Por Iuri Pitta, estadao.com.br

Para consultor do Banco Mundial, porém, efeitos da legislação, que entra em vigor na quarta, serão percebidos em 1 ou 2 anos




Consultor do Banco Mundial para casos de corrupção e lavagem de dinheiro, o professor e advogado argentino Agustín Flah compartilha do otimismo das autoridades brasileiras, que esperam um salto de qualidade no combate a malfeitos contra a administração pública a partir da chamada Lei Anticorrupção. A nova norma entra em vigor na quarta-feira e prevê multas e restrições administrativas às empresas que corromperem agentes públicos. Flah explica por que a lei pode marcar uma nova fase na luta contra a corrupção no Brasil, mas recomenda paciência: os resultados levarão de um a dois anos para aparecerem.
O sr. diz que essa lei marca uma nova fase na luta contra à corrupção no Brasil. Por quê?
AGUSTÍN FLAH - Por várias razões. É uma lei bem elaborada, que não se fez às pressas. Ela segue as convenções internacionais, que vêm desde os anos 1970, com a FCPA (Lei contra Práticas Corruptas no Exterior, na sigla em inglês), de 1977, que basicamente pune o suborno de um funcionário público por uma empresa americana no estrangeiro. Depois veio a UK Bribery Act (Lei Britânica contra a Propina), com um conteúdo mais amplo, mas que segue essa linha. E agora a lei brasileira cria responsabilidade para as pessoas jurídicas que praticam corrupção. Além disso, é um salto de qualidade. Criar uma lei como essa é um reconhecimento de que a corrupção é um problema e que se está tentando enfrentá-lo.
A lei brasileira trata de punições administrativas contra as empresas, enquanto leis de países como Estados Unidos e Reino Unido tratam de forma criminal. Isso faz diferença?
AGUSTÍN FLAH - Cada país define se trata do assunto como uma questão criminal ou não. Isso não significa que a punição civil ou administrativa não será tão dura quanto a criminal. O sistema brasileiro é análogo ao de organismos multilaterais, como Banco Mundial ou BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Se uma empresa comete uma fraude ou corrupção, ela é multada e impedida de realizar negócios. Há também a previsão de um cadastro (de empresas punidas), a exemplo do que faz o Banco Mundial. O Departamento de Justiça americano divulga as empresas condenadas. O dano à reputação de uma empresa é uma punição dura. Elas não gostam, estão preocupadas com sua imagem, mas é um fator a mais para não cometer corrupção. É preciso cuidado, respeitar as garantias da lei, o direito de defesa, mas a transparência é o caminho que o mundo está tomando.
Algumas das sanções têm sido consideradas duras pelas empresas, como a multa de 20% sobre o faturamento bruto anual. A lei brasileira é tão dura assim?
AGUSTÍN FLAH - Creio que não, me parece que vai em linha com as convenções internacionais. O Brasil é signatário do Gafi (Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo), que também prevê multas relacionadas ao valor da transação. A lei prevê um leque muito amplo para fixar as sanções, vai de 1% a 20% do faturamento das empresas. A companhia vai ter direito de defesa, e caberá à autoridade estabelecer uma punição adequada. Sem falar que a empresa pode tentar um acordo de leniência.
Como os acordos de leniência ajudam a combater a corrupção?
AGUSTÍN FLAH - Faz uns 20 anos que esses acordos têm sido cada vez mais usados. Nos Estados Unidos, mais de 88% de casos transnacionais de pagamento de propinas foram resolvidos por acordo, e uma pequena parte foi a juízo. Isso acelera a resolução dos casos e reduz a carga sobre o Judiciário. Outro ponto é ser um caminho para reabilitar a empresa, que é obrigada a cooperar e adotar medidas como programa de compliance (controle interno). Os pontos que costumam ser criticados são a falta de supervisão dos acordos pelo Judiciário e o fato de que, na maioria das vezes, a empresa reconhece um delito menor. Cabe ao poder público verificar caso a caso e, se a empresa não cooperar como deveria, ser punida.
Com essa nova lei, o Brasil pode dar um salto significativo, por exemplo, em rankings que medem a corrupção nos países?
AGUSTÍN FLAH - A lei é um sinal muito positivo. Agora, é preciso esperar um ou dois anos para medir seus efeitos, ver como empresas e poder público vão agir. À medida que surgirem casos sob a vigência dessa nova lei, vamos poder avaliar os avanços.

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