domingo 23 2014

Ministério da Pesca é suspeito de fraudar licenças

Governo Dilma

PF e Ministério Público investigam denúncia de distribuição de carteiras no período eleitoral para pessoas que não praticam a atividade pesqueira

Senador Eduardo Lopes
O atual ministro da Pesca, Eduardo Lopes, do PRB (Lia de Paula/Agência Senado/VEJA)
Um mês antes do início da campanha eleitoral, o Ministério da Pesca alterou norma interna e permitiu que carteiras de pescador, antes confeccionadas pela Casa da Moeda, fossem emitidas em papel comum. A medida permitiu que, desde junho, as próprias superintendências da pasta nos Estados, a maioria controlada pelo PRB, confeccionassem os documentos, que dão direito a salário durante os cinco meses do defeso e outros benefícios. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
As carteiras impressas em papel moeda tinham uma marca d'água para evitar fraudes – uma proteção que as confeccionadas em papel comum não dispõem. O PRB, ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, comanda a pasta desde março de 2012, quando o senador Marcelo Crivella (RJ) foi nomeado ministro. Ele deixou o cargo para disputar o governo do Rio de Janeiro. O ministério é chefiado hoje pelo pastor Eduardo Lopes, também do PRB e suplente de Crivella. A sigla trabalha para manter a pasta no próximo mandato de Dilma Rousseff. Das 27 superintendências, 17 estão sob a chefia de filiados e dirigentes do partido.
No Acre, a Polícia Federal e o Ministério Público investigam denúncia de que houve um derrame de carteiras no período eleitoral para pessoas que não praticam a atividade pesqueira. A distribuição teria beneficiado Juliana Rodrigues de Oliveira e Alan Rick, respectivamente eleitos deputados estadual e federal pelo PRB. Até março, doutora Juliana, como é conhecida, foi superintendente estadual do ministério. Ela já havia, sem sucesso, disputado uma eleição, antes de ocupar o cargo.
A Polícia Federal já tomou depoimento de eleitores que receberam as carteiras cinco dias antes das eleições – parte deles assentados da reforma agrária. Eles disseram ter vendido o voto em troca do benefício. A investigação está sob sigilo. O registro do pescador é como um "cheque pré-datado". O seguro-defeso, que garante salário no período em que a pesca é proibida, só pode ser recebido um ano após a emissão da carteira. Há exigências como comprovação por meio de relatório da atividade pesqueira. O documento dá direito a linhas de crédito bancário e aposentadoria especial.
Dados do ministério mostram que, no Acre e no Maranhão, o número de carteiras emitidas no período eleitoral supera o dos demais meses. De agosto a outubro, foram confeccionadas 30.177 carteiras no Maranhão, mais que as 22.581 dos sete meses anteriores do ano.
A Polícia Federal tem 14 inquéritos abertos no Estado para apurar irregularidades no pagamento do seguro-defeso ou na distribuição de carteiras. O Ministério Público informou que tramita um recurso no Tribunal Regional Eleitoral relacionado à distribuição das carteiras, também sob sigilo. O número de pescadores artesanais registrados no País hoje é de 1.005.888. Dados do Ministério do Trabalho mostram que, de abril a setembro, o número de requerentes do seguro da pesca chegou a 281 mil – foram 198.000 no mesmo período de 2013. A pasta não informou quais Estados tiveram maior crescimento.

A lei que promete ser o pesadelo para empresas corruptas

Lava Jato

Congresso aprovou em julho de 2013 lei para fechar o cerco a empresas que integram esquemas de corrupção. Mas até hoje Dilma não editou decreto para regulamentar medida

Laryssa Borges, de Brasília
Executivos presos na sétima fase da Operação Lava Jato são liberados pela Polícia Federal, na noite desta terça-feira (18/11), na sede da Polícia Federal em Curitiba
Executivos presos na sétima fase da Operação Lava Jato são liberados pela Polícia Federal, na noite desta terça-feira (18/11), na sede da Polícia Federal em Curitiba - Junior Pinheiro/Folhapress
"Quando se pensou a lei, a ideia era que a empresa sempre fosse responsabilizada. Se a lei pudesse ser aplicada no caso da operação Lava Jato, as empreiteiras não seriam poupadas" Luiz Navarro, ex-secretário-executivo da CGU
Em dezembro de 2003, entrou em vigor no país o decreto de criação do Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção, um colegiado destinado a pensar medidas de aperfeiçoamento da administração pública e estratégias de enfrentamento de irregularidades. A época era próspera para o engenheiro Paulo Roberto Costa, que mantinha uma sólida carreira na Petrobras e estava prestes a ocupar a poderosa diretoria de Abastecimento da estatal – posto do qual ele operou o mais vultuoso esquema de desvio de recursos públicos de que se tem notícia no Brasil.
Dez anos depois, o Congresso Nacional aprovou a chamada Lei Anticorrupção, endurecendo – enfim – o cerco a empresas que abastecem propinodutos e abrindo espaço para que elas sejam penalizadas, inclusive, com a dissolução obrigatória se tiver se beneficiado de malfeitos. A manifestação tardia do Congresso sobre a importância de estancar esquemas de corrupção ficou mais evidente nos últimos meses, período no qual o país tem sido surpreendido diariamente com a ousadia de empresários e lobistas que, com a bênção de políticos, articularam o megaesquema de lavagem de dinheiro que movimentou pelo menos 10 bilhões de reais. Não é exagero afirmar que a existência há mais tempo de uma lei dura poderia ter inibido o assalto aos cofres da Petrobras com a participação das maiores empreiteiras do país.

“A lei trouxe um impacto inibidor da corrupção, uma vez que agora é possível alcançar diretamente o agente corruptor, ou seja a empresa, e em seu patrimônio”, diz o ministro da Controladoria Geral da União, Jorge Hage. Para ele, ao punir as companhias corruptoras pela via administrativa, o poder público ainda se livra de ter de aguardar a morosidade do Judiciário para reaver os valores desviados. “Com a lei não será necessário aguardar o moroso processo judicial que existe hoje no país, em que o excesso de recursos protelatórios faz com que um processo na Justiça dure quinze ou vinte anos”, afirma.
“Não tenho dúvida de que a Lei Anticorrupção estabeleceu um novo grau de responsabilização das empresas e uma nova relação com o poder público. Com a lei fica mais fácil responsabilizar as empresas porque passamos a ter a responsabilidade objetiva, que é aquela sem a necessidade de se provar a intenção ou de se comprovar o conhecimento do fato. Basta termos a confirmação de que o fato ocorreu e que a empresa tinha interesse ou se beneficiaria com aquele fato”, completa o advogado Luiz Navarro, ex-secretário-executivo da CGU e um dos idealizadores da nova legislação. “Quando se pensou a lei, a ideia era que a empresa sempre fosse responsabilizada. Se a lei pudesse ser aplicada no caso da operação Lava Jato, as empreiteiras não seriam poupadas”, afirma.
A Lei Anticorrupção, em vigor desde 29 de janeiro deste ano, mas ainda à espera de regulamentação pela presidente Dilma Rousseff, não pode ser utilizada para punir os desmandos de empresários e empreiteiras envolvidos no atoleiro de corrupção na Petrobras, mas parte de suas inovações, como a possibilidade de acordos de leniência com corruptores, deve ser colocada em prática pela CGU para mapear detalhes da trama criminosa, exigir ressarcimento dos cofres públicos e fixar multas milionárias às companhias malfeitoras. “No caso da Lava Jato, as empresas podem chegar a um acordo, denunciar quem praticou os atos e quem recebeu dinheiro da corrupção, restituir os cofres públicos, pagar altas multas como pena e então não ser impedidas de participar de novas licitações”, explica Navarro.
Responsável por mediar as prováveis negociações, o ministro Jorge Hage já recebeu pedido de uma das empresas citadas na Lava Jato para firmar um acordo de leniência e da holandesa SBM Offshore, que admitiu ter pago propina a funcionários da Petrobras. No governo, a estimativa é que as demais empresas citadas na operação da Polícia Federal recorram ao mesmo caminho para conseguir manter a condução de obras e evitar o risco de serem declaradas inidôneas. Nos Estados Unidos, um dos países que serviu de inspiração para a elaboração da lei anticorrupção, 95% dos casos de irregularidades envolvendo empresas acabam em acordo, segundo estatísticas apresentadas pelo governo brasileiro.
Apesar de poder ser utilizada parcialmente contra as empresas citadas na Lava Jato – na prática, como estímulo a acordos de leniência –, a aplicação completa da lei, inspirada em modelos da Alemanha, Reino Unido, França, Estados Unidos, Chile, Colômbia e México, esbarra há quase um ano na paralisia do Palácio do Planalto, que não regulamentou trechos importantes da nova legislação. Sem um decreto presidencial, a Lei Anticorrupção permanece sem parâmetros para dosimetria de multas a empresas corruptoras ou para atenuantes a companhias que tiverem aderido a políticas de governança e integridade. Depois de ter prometido, no início do ano, a regulamentação rápida da lei, o ministro Jorge Hage voltou a dizer nesta semana esperar que a pendência seja resolvida “brevemente”. Diante de um escândalo de outra galáxia, como bem classificou o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, é difícil entender a resistência de Dilma.

Nós Estamos Aqui: O Pálido Ponto Azul (Legendado)





Pálido Ponto Azul, de Carl Sagan





Oh Happy Day









I Say a little pray for you - Cena de O Casamento de Meu Melhor Amigo - ...





E-mails provam que Lula e Dilma poderiam ter interrompido o propinoduto

Em VEJA desta semana

O doleiro Alberto Youssef disse à Justiça que Lula e Dilma sabiam do esquema de corrupção na Petrobras. Agora, mensagens encontradas pela PF em computadores do Planalto mostram que eles poderiam ter interrompido o propinoduto, mas, por ação ou omissão, impediram a investigação sobre os desvios

Robson Bonin e Hugo Marques
Paulo Roberto Costa e Dilma Rousseff
(Dida Sampaio/Estadão Conteúdo e Cristiano Mariz/VEJA)
Antes de se revelar o pivô do petrolão, o maior escândalo de corrupção da história contemporânea brasileira, o engenheiro Paulo Roberto Costa era conhecido por uma característica marcante. Ele era controlador e centralizador compulsivo. À frente da diretoria de Abastecimento e Refino da Petrobras, nenhum negócio prosperava sem seu aval e supervisão direta. Como diz o ditado popular, ele parecia ser o dono dos bois, tamanha a dedicação. De certa forma, era o dono — ou, mais exatamente, um dos donos —, pois já se comprometeu a devolver aos cofres públicos 23 milhões de dólares dos não se sabe quantos milhões que enfiou no próprio bolso como o operador da rede de crimes que está sendo desvendada pela Operação Lava-Jato. Foi com a atenção aguçada de quem cuida dos próprios interesses e dos seus sócios que, em 29 de setembro de 2009, Paulo Roberto Costa decidiu agir para impedir que secassem as principais fontes de dinheiro do esquema que ele comandava na Petrobras. Costa sentou-se diante de seu computador no 19º andar da sede da Petrobras, no Rio de Janeiro, abriu o programa de e-mail e pôs-se a compor uma mensagem que começava assim:
“Senhora ministra Dilma Vana Rousseff...”.
O que se segue não teria nenhum significado mais profundo caso fosse rotina um diretor da Petrobras se reportar à ministra-chefe da Casa Civil sobre assuntos da empresa. Não é rotina. Foi uma atitude inusitada. Uma ousadia. Paulo Roberto Costa tomou a liberdade de passar por cima de toda a hierarquia da Petrobras para advertir o Palácio do Planalto que, por ter encontrado irregularidades pelo terceiro ano consecutivo, o Tribunal de Contas da União (TCU) havia recomendado ao Congresso a imediata paralisação de três grandes obras da estatal — a construção e a modernização das refinarias Abreu e Lima, em Pernambuco, e Getúlio Vargas, no Paraná, e do terminal do Porto de Barra do Riacho, no Espírito Santo. Assim, como quem não quer nada, mas querendo, Paulo Roberto Costa, na mensagem à senhora ministra Dilma Vana Rousseff, lembra que no ano de 2007 houve solução política para contornar as decisões do TCU e da Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional.
Também não haveria por que levantar suspeitas se o ousado diretor da Petrobras que mandou mensagem para a então ministra Dilma Rousseff fosse um daqueles barnabés convictos, um “caxias”, como se dizia antes nas escolas e no Exército de alguém disposto a arriscar a própria pele em benefício da pátria. Em absoluto, não foi o caso. Paulo Roberto Costa, conforme ele mesmo confessou à Justiça, foi colocado na Petrobras em 2004, portanto cinco anos antes de mandar a mensagem para Dilma, com o objetivo de montar um esquema de desvio de dinheiro para políticos dos partidos de sustentação do governo do PT. Ele estava ansioso e preo­cupado com a possibilidade de o dinheiro sujo parar de jorrar. É crível imaginar que em 29 de setembro de 2009 Paulo Roberto Costa, em uma transformação kafkiana às avessas, acordou um servidor impecável disposto a impedir a paralisação de obras cruciais para o progresso da nação brasileira? É verdade que às vezes a vida imita a arte, mas também não estamos diante de um caso de conversão de um corrupto em um homem honesto da noite para o dia.

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