sábado 28 2013

Beauvoir, Feminismo e a Mulher Desiludida



Publicado em 1968, “A Mulher Desiludida” causou alvoroço. Com uma tiragem esgotada em 8 dias, criou ainda mais polêmicas sobre sua autora, Simone de Beauvoir. Beauvoir foi criticada por condenar o casamento, mas se justificou dizendo que condenava apenas a esposa do livro, e dizia que a maior mensagem da obra era a de que a mulher precisa trabalhar. Mas não é só isso: o livro também traz conceitos existencialistas, como a preocupação com os idosos, além de outros conceitos feministas, como a necessidade da independência da mulher; e faz críticas ao casamento sim.
Para entender estas críticas, vamos pensar em como era o casamento naquela época. Para começar, casamento deveria ser “para sempre”. Divórcio e separação eram coisas “feias”. E quando acabava a união, era a mulher sempre levava a culpa, “por não saber segurar o marido”. Os homens podiam trair à vontade, e a mulher era obrigada a suportar. Muitas vezes, os casamentos acabam sendo relações só de aparência mesmo. A sexualidade era reprimida antes do casamento, e se houvesse um momento de fraqueza sequer, e se esse momento gerasse um fruto, o casamento era obrigatório. Mãe solteira era “feio”, mulher imoral. Então, quantos casamentos não foram por causa de uma gravidez indesejada? Neste caso, o motivo da união não era o amor ou planejamento familiar, mas um “corretivo” a um “erro”.
Aliás, o sexo não era reprimido apenas antes do casamento. A mulher simplesmente não tinha direito ao prazer. Sexo era apenas uma obrigação conjugal, para satisfazer o homem. Mas em 1949 – quase 10 anos antes – surge um livro, também de autoria de Simone de Beauvoir, chamado “O Segundo Sexo”, em que ela fala sobre o corpo da mulher e a sexualidade feminina. É claro que foi um escândalo. O livro foi publicado em várias línguas, e se espalhou pela Europa e EUA, contribuindo para a famosa revolução sexual - e por que não dizer cultural – que surgiria anos mais tarde na nossa civilização ocidental. Como se pode ver, Simone de Beauvoir, além de companheira de Jean Paul Sartre no existencialismo, também teve uma contribuição inestimável ao feminismo. Não é à toa que “O Segundo Sexo” se tornou um clássico feminista.
Bem, voltando a “Mulher Desiludida”, o livro apresenta as estórias diferentes de duas mulheres. A primeira é mais independente e engajada na política, e acaba de se aposentar. A estória desta mulher mostra a falta que faz o trabalho para ela e as angústias do envelhecimento. Ela começa a pensar sobre seu casamento, e sobre a fase adulta de seu filho, que demonstra interesses diferentes dos seus; e passa a ter outros valores, e a demonstrar atitudes diferentes da educação dada por ela – é o conflito de gerações. Esta mulher faz amizade também com uma órfã, que fica enclausurada e desocupada dentro de um orfanato. Aí está uma crítica sobre a condição social dos órfãos e também das mulheres, com educação limitada.
Já a mulher da segunda estória, é completamente dependente. Nunca trabalhou ou teve alguma boa ocupação. Casou-se cedo, ao ficar grávida do namorado. Deste casamento, teve duas filhas. O marido, em determinada fase do relacionamento, passa a ter um caso com uma amante, e ela descobre. Mas nada faz. Entra em depressão e não consegue tocar a vida. O casamento, cada vez mais, vai de mal a pior. O marido leva muito tempo para abandoná-la; ele não a abandona de imediato, mas a deixa de lado. Cada vez mais ausente em casa, ele a manipula de acordo com seus interesses. E ela se ilude, tentando dizer a si mesma que ele a ama. Ela ainda tem esperanças de reconquistá-lo, apesar de descobrir que o caso já é longo, e que foi a última a saber. Apesar das esperanças, ele fica cada vez mais distante.
Ambas as estórias mostram, como característica comum, o quanto é ruim que uma mulher não tenha um emprego ou uma ocupação. Nossos tempos mudaram. Ainda bem. Divórcio é permitido, o casamento informal é comum (o famoso “morar junto”, antes considerado pecaminoso), a mulher tem seu espaço no mercado de trabalho, e tem direito ao prazer. O sexo é mais liberado. Mas o machismo ainda existe, disfarçado sob outras formas, mas ainda está claramente lá. E esse será o assunto do próximo texto.

Vídeo com trecho de entrevista de Simone de Beauvoir (em francês):

http://carolbaldner.blogspot.com.br/2007/08/beauvoir-feminismo-e-mulher-desiludida.html

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